Introdução

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Tic-tac-tic-tac

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Tic-tac-tic-tac. O barulho do relógio ecoava pela casa vazia, fazendo Kate perceber o quanto era solitária. Encheu a banheira com tanta água que podia se ouvir os pingos vazarem da borda. A mulher se despia, tirando peça por peça sem pressa alguma. Olhava-se no espelho comprido onde mostrava todo o seu corpo desnudo, uma pele tão branca quanto leite, olhos castanhos carregados de dor e de uma boa dose de remédios que ela havia tomado antes de entrar ali.

Encheu uma taça de vinho como se estivesse prestes a comemorar alguma coisa, mas ela estava.

" chegou o momento, o tão esperado momento. "

Dizia segurando a taça e entrando na banheira cheia. Sentou-se com um sorriso no rosto fazendo a água vazar mais ainda e molhar todo o chão do banheiro. Bebeu de uma só vez o líquido vermelho que transbordava da taça e respirou fundo ciente do que estava prestes a fazer.

" Tenha coragem Kate, tenha coragem... "

Repetia tantas e tantas vezes querendo por fim a tudo o que temia.

" tenho 22 anos, não posso continuar assim, coragem Kate, coragem... "

Tornava a repetir.

Em um minuto de coragem, afundou na banheira e fechou os olhos esperando a morte vi a seu encontro. Tanto que ela havia esperado por aquele momento, enfim, havia chegado.
Pensou em todos os anos sofridos que havia passado e em todas as marcas em seu corpo, todo o abuso que sofreu do pai e toda discórdia que sofria da mãe. Lembrou-se das vezes que seu pai a segurava com tanta força pelos braços deixando a marca ali para lembra-la, lembrou das vezes que tentava se aproximar da mãe e levava um tapa no rosto como resposta. Lembrou-se também de seu irmão James, arrancado de casa pelo próprio pai. A única fortaleza que ela tinha quando criança.

Muitas vezes trancada em seu quarto perguntou-se como havia conseguido chegar até os 22, como havia sido forte por todo esse tempo. Ela queria tentar, quis procurar o irmão, quis ser mais forte, mais mulher, mais corajosa, mas certas dores não tinha cura e ela sabia disso.

Com a respiração já falha, e a palidez aumentando em sua face, ela sentia o ar indo embora, a falta de ar ardia seu peito debaixo de toda aquela água, mas ela sabia que não resistiria mais uma vez, era agora ou nunca.

Tic-tac-tic-tac. O relógio ainda soava impaciente.

" Falta pouco, muito pouco... "

Ela pensava com os últimos suspiros que lhe sobravam. Viu em sua mente novamente o rosto do irmão mais velho. Estava ficando escuro, muito escuro.

— Kate! — gritava uma voz ao longe. — Você é louca! — dizia a voz mais uma vez.

Kate percebeu que não era fruto de sua imaginação quando sentiu braços em torno de si a puxando rápido de dentro da banheira. Levantando com dificuldade enquanto uma mão acariciava seu rosto. O peito ardia, o coração doía, mais uma vez foi falha, faltava pouco, tão pouco. Seu corpo ainda não raciocinava, seu corpo tremia.

— O quê você estava fazendo? — Kate ouviu a voz dizer, uma voz feminina, distante. Viu a mulher pegar um celular e discar um número. — Alô, tragam uma ambulância por favor. Rua Bay Shore, número 23 Rápido, por favor! Foi uma tentativa de suicídio.

Kate não gostava daquela palavra, ela estava ali, ela ouvia o que a mulher dizia, mas não conseguia falar, não conseguia ver.

— Por que fez isso? Hem? Por quê? — a voz da mulher gritava em seu rosto.

Kate respirou fundo, tentou respirar. Estava a pouco tempo de baixo da'água mas sentia sua boca seca.

— Eu... — tentava responder com a voz falha. — Eu... Estou... Desesperada.

E a última coisa que ouviu foi o maldito relógio e o seu tic-tac-tic-tac.


DesesperadaOnde histórias criam vida. Descubra agora