Julieta

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Saio bem cedo com Theo.

-Há algum problema? -Pergunto.

-Não, prima. Está tudo bem. -Ele diz, mas contrai a mandíbula e sei que ele não está. Mas não pergunto. Apenas me mantenho calada até chegarmos.

Ele estaciona o carro. Seus amigos, meus antigos amigos, também envelheceram:

-Julieta. Bom vê-la.

-Bom ver vocês, também. –Falo.

-Ah, Theo, confirmaram a reserva! –Diz meu amigo.

-Ótimo. –Vejo então, Theo sorrir, mas há algo diferente no sorriso.

-Que reserva? –Questiono a Theo. –Não iremos almoçar em casa?

-Você, sim. –Ele sorri para mim. –Eu tenho alguns assuntos a resolver e marquei um almoço para isso.

-Está bem. –Falo. –Bom, vamos! Quero conhecer a fábrica. Nem lembro como ela era, e com todos esses anos de progresso acho que a modernização afetou a vinícola.

-Sim, claro. Venha, prima. –Theo diz. –Amigo, selecione uma garrafa do último lote, iremos experimentar em meu escritório.

-Claro. –Responde seu amigo.

Sorrio.

Meu primo me leva para dentro. Tenho de vestir uma roupa mais higienizada para entrar no coração da fábrica.

-É magnífico. –Diz Theo. –Nos últimos anos, quando assumi, procurei novas técnicas para a fabricação, algo menos manual e mais tecnológico, mas que não deixasse de ser o melhor vinho da região e, me atrevo dizer, do mundo.

-Ao seu comando, sei que é o melhor! –Lhe ofereço meu sorriso lisonjeiro.

-Fico grato pelo elogio, mas senti falta de um toque feminino. Vovô e vovó raramente se metem nos assuntos, pela idade, creio eu. Rosa estava ocupada demais e você distante.

-Sinto muito. Mas já estou de volta, e agora Rosa ajudará. –Digo.

-Sim, claro. Às mulheres a frente, não é?

-No auxílio. –O corrijo. –Bom, em breve serei eu a fazer esses almoços de negócios. –Digo animada. –Mal posso esperar.

-Nem eu. –Ele murmura e sorri para mim.

Continuamos a ver a fábrica. Ela é gigante. Antigamente o processo para amassar as uvas eram manuais, depois usamos outras máquinas ainda meio rusticas e progredimos com o tempo. Desde que fui embora tudo mudou. Theo substituiu todas as máquinas por novas e mais práticas para realizarem o trabalho mais pesado. Ela ainda precisava dos técnicos todos os dias para funcionarem e supervisionarem. Os químicos faziam testes nos produtos então essa é a grande importância dos nossos empregados.

Depois do tour desabo na cadeira do escritório.

-Não lembrava que ela era tão grande. –Digo.

-Tivemos de aumentar muito a vinícola para suprir nossas necessidades. –Ele pega a garrafa de vinho e serve em duas taças, entrega uma a mim. –Saúde.

-Saúde. –Brindo.

Bebo o vinho. O líquido percorre minha boca deixando um odor doce e inebriante. Desce pela garganta tão liso e parece que foi seda de tão bom!

-Nossa! –Digo. –É maravilhoso! Não me lembrava de quão bom era.

-E esse é nosso último lote. Acho que os mais antigos já estão bem maduros.

-Mas esse continua ótimo!

Bebo vagarosamente, deliciando cada gole, enquanto ele desce a bebida em um gole apenas.

-Prima, sabe que quero seu bem. É isso que me faz bem. –Ele começa. –Poderia ser honesta comigo?

-Claro, Theo. Serei o mais honesta possível. –Disse, franzindo o cenho.

-Você falou com um Montecchio?

Quase engasgo, mas manter a calma é a melhor maneira de não ser pega. Theo ainda conserva cegamente os pensamentos e as rivalidades conflitantes contra os Montecchios.

-Está falando de...

-Romeu! –Ele completa. –Sim. Falo dele. Vi que ele dançou com você na festa do vovô.

-Ah, aquilo? Foi apenas uma dança! Nada demais. –Falo.

Ele ainda me olha seriamente e duvido que ele tenha acreditado no que eu disse. Duvido muito.

-Os Montecchios nos odeiam.

-Como os odiamos? –Questiono. –Não. Eu não os odeio. Estamos em trégua. É época de paz, pelo amor de Deus!

-Julieta, você é inocente e ainda não entende.

-Pois eu entendo bem, Theo. Eu não sou uma criança boba que não sabe fazer suas escolhas. Sou uma mulher madura e com os pensamentos formados. Não odeio eles. Eles não são meus inimigos!

-São seus amigos? –Ele diz rispidamente.

-Não. –Engulo a saliva. –São pessoas como eu e você. Com os mesmos poderes e potencial.

-Não compare-nos com eles.

-Chega! –Digo e me levanto. –Leve-me para casa.

Ele fica surpreso com minha reação e assente.

Ele permanece calado a viagem inteira, e eu quebro o silencio quando saio do carro:

-Não fique chateado. Não há motivos para ódio. –Sorrio. –Amo você!

-Também amo você, Julieta.

Theo me deixa em casa e vai para sua reunião de negócios. Não sei, mas essa reunião não está me agradando.

-Não cometa os mesmos erros dos nossos antepassados. –Peço baixinho.

Os novos Romeu e JulietaOnde histórias criam vida. Descubra agora