Prólogo

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MAYA

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MAYA

O que não era amor

O amor não é um sentimento. Talvez, o pulsar desacerbado de um coração apaixonado, a reação afetiva imediata de uma mãe ou um pai ao ver seu filho pela primeira vez, ou mesmo um ato genuíno de doação remeta a ideia de que sim, amar é meramente sentir. Mas, se o amor estivesse relacionado inteiramente às sensações, ele não seria raso demais? Ou volátil? Melhor dizendo... finito?

A definição exata de algo tão inexplicável só pode vir de um alguém: seu criador. E a palavra de Deus, o autor do amor, diz que se tentassem oferecer todas as riquezas de sua casa para adquiri-lo, seria de todo desprezado. Não se pode comprá-lo, forçá-lo, forjá-lo, quebrá-lo ou matá-lo. Uma das maiores verdades sobre o amor que eu provei e conheci é que ele é uma escolha.

E para aprender isso eu tive que passar por um dos piores dias da minha vida.

— Você está linda, meu bem — minha mãe elogiou-me e eu sorri. Na verdade, fora uma simpatia contrista em virtude dos poucos minutos que restavam para o início da festa de noivado. Eu nunca soubera fingir moderação quando não havia quietude em mim. Deus precisava aquietar o meu interior. — Mas, conheço esse semblante e sei que esse coração está preocupado. Pare com isso, pão de mel. Vai dar tudo certo!

— Como foi quando papai te pediu em casamento, mami? Quero dizer, você ficou nervosa? — Esbocei uma risada premeditada e minha progenitora acompanhou-me, sustendo minhas mãos. Nos assentamos em um sofá minúsculo situado no quarto que eu dividia com minhas irmãs.

— Foi lindo, Maya! Não tive receio algum, pois o amava e tinha certeza que estávamos debaixo da vontade de Deus. Ele e meus pais, seus avós, sabiam de tudo. Cúmplices, prepararam uma festa surpresa e o pedido foi feito diante de todos — ela deu uma pausa e desviou os olhos dos meus, como se seus pensamentos tivessem voando alto, longe dali. — Jamais poderei esquecê-lo.

Senti vontade de chorar ao escutar todas aquelas palavras; recordar de meu pai era, por vezes, doloroso. Ele havia partido quando eu era apenas uma menina, mas suas lembranças estavam vivíssimas dentro de mim e mesmo nos momentos que não viveríamos mais juntos, eu ainda persistia em recordá-lo. Obviamente, de modo algum seria fácil lembrar-me dele sem sentir um aperto irremediável no peito.

— Não vamos chorar, filha. Alegre-se, é o seu noivado! — mamãe levantou-se e puxou-me pelos braços para que eu também ficasse de pé. — Deus está sempre no controle, meu bem. Não esqueça disso.

E, de fato, eu não esqueceria, por mais que as adversidades estivessem perto de chegar.

— Maya! — Melissa, minha mais velha irmã, abriu a porta e veio correndo até onde estávamos. — Todos os convidados já chegaram, você tem que descer agora.

— E o pastor?

— Eu disse "todos os convidados", pão de mel! É claro que o pastor já está lá embaixo — ela ofegava. Logo, olhou-me da cabeça aos pés e me lançou um sorriso travesso — Caleb vai babar quando te vir...

Fiquei vermelha, ao passo que a mami gargalhou.

— Vamos, você precisa descer — Minha outra irmã, Mary, enfiou a cabeça entre a entrada e a porta do quarto para me visualizar.

— Tudo bem — falei mais para mim do que para elas. — Deus está no controle.

A nossa casa tinha um tamanho mediano; era modesta quanto aos móveis e aparelhos domésticos. A escada pela qual desci me levou diretamente ao encontro dos convidados. Os sorrisos doces que me esperavam lá embaixo foram meus maiores incentivos para manter-me plena. Todos que estavam ali, eu tinha certeza, eram presentes de Deus em minha vida.

— Irmã Maya, que esta união conceda muitos bons frutos para o Reino! — O pastor João desejou-me, ao me receber com um abraço apertado.

— Amém — Meneei a cabeça positivamente. Aquilo era o que eu esperava mais-que-tudo! Ser uma esposa virtuosa, uma boa mãe e uma mulher que honraria a Cristo enquanto vivesse.

— Você está tão fofa, tia Maya! — Algumas crianças da igreja, para as quais eu ministrava aulas bíblicas no sábado, disseram isso e me deram abraços e beijos; correspondi-as também com o mesmo amor. Elas eram cheias de graça. Qual a criança que não é assim, afinal?

Então avistei Caleb, meu futuro marido, que conversava com alguns amigos da igreja. Aproximei-me e cumprimentei a todos, colocando-me ao seu lado.

— Oi! — proferi assim que seus amigos nos deixaram a sós. Ele me ofertou um sorriso fraco, o qual me fez perceber que algo não ia bem. Por um momento, pensei não estar tão bonita quanto minha irmã apontara anteriormente. Logo, engoli em seco, isenta de compreensão. Caleb nunca fora tão frio comigo! — Algum problema?

— Sim — Ao receber sua resposta direta, meu coração gelou. Reparei, naquele instante, que seus cabelos estavam bagunçados, coisa que raramente ocorria. Caleb sempre fora deveras vaidoso. Sem me fitar, ele batia repetidamente um dos pés no chão demonstrando, assim, sua inquietação. O pior de tudo, e o que mais me amedrontava, era que meu namorado parecia infeliz.

— Amor, eu... — Tentei entendê-lo, mas, sem antes me deixar falar, Caleb segurou minha mão e conduziu-me discretamente até a cozinha, onde havia algumas irmãs da igreja separando a louça para o jantar.

— Vocês podem nos dar licença, por favor? — Ele pediu às senhoras.

Logo ficamos a sós. Eu estava tão ansiosa que meu estômago começou a embrulhar, causando leves náuseas.

— O que houve? — Indaguei, apertando sua mão para lhe oferecer segurança.

Procurei seus olhos, mas meu namorado não me encarou por um segundo sequer. Então, como uma granada, disparou as palavras que marcaram aquela parte da minha vida para sempre:

— Não quero casar com você.

Ele largou minha mão. Prendi a respiração e senti minhas pernas perderem as forças. Minha mente paralisou.

— Na verdade, nós não vamos nem noivar. Eu... nunca te amei, Maya. Durante esse tempo todo... eu jamais te amei! Não sei como as coisas chegaram tão longe, mas não podemos fazer isso.

Procurei o ar preso em meus pulmões, mas parecia que não havia nada ali. Preciso respirar, preciso respirar. O que... como... e nós... eu...

Não consegui ao menos abrir a boca para questioná-lo. Ele nem me deu tempo. Ele não olhou nos meus olhos. Ele só se foi.

Então, desolada, chorei. Sentei no gélido piso da cozinha e permiti-me derramar todas as lágrimas possíveis, sendo depois acalentada pelo colo e amor de todos que estavam ali para festejar um dia feliz que se converteu no contrário.

Aquela fora a dor mais covarde que eu já havia sentido em toda minha vida. Eu não sabia como, nem quando, mas estava ciente de que Deus iria curá-la. Poderia levar anos, ou dias, mas Ele estava no controle em todo o momento.

Deus estava olhando para mim lá de cima. Aquela era minha única certeza.



Até que te ameiOnde histórias criam vida. Descubra agora