Capítulo Vinte e Seis - Passeio com Barney pela vizinhança

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( Sábado, 12 de setembro )

KATE BLANK:

- O que acha de sair pra jantar comigo? - Ouço a voz de Rennê, em um áudio. Pra falar a verdade, há alguns minutos atrás, quando acordei de fato, já não me sentia bem. Já acordei sabendo que algo não estava certo. Sentia dor de cabeça, e era nítida a preocupação que meus olhos realçavam.

Digito que não estou muito bem hoje, e que prefiro ficar sozinha. Sozinha não seria bem a palavra, já que tenho Barney.

- Barney, Barney, Barney... - Cochicho próxima à sua orelha, imitando o modo como, em meu livro, o garoto chama seu Golden Retriever. Só que seu nome, não é nem de longe fácil de pronunciar, parece mais um trava línguas, quando repetido várias vezes.

Barney está com seis meses, e já perdi as contas de quantos sermões tive de levar por causa dele, e quantos deles eu o repassei para o próprio filhote. Barney não vivia apenas dentro do meu quarto, estava lhe ensinando que, toda vez que ele quisesse ir ir ao gramado, era necessário arranhar, por um curto prazo, a porta que acessava o banheiro.

Eu o supervisionava sempre. Apesar de meus pais terem saído para uma viagem até a África, há alguns dias, continuo com esse hábito. Não sei o quão rudes e ignorantes eles poderiam ser. 

De alguma forma, percebo no olhar triste de Barney, que mesmo sendo tão pequeno, sente falta dele. Da mesma forma que eu também sinto. Mas, Ethan foi descuidadoso. Permitiu que uma garota qualquer se atirasse em seus braços, e por mais que eu esteja mais chateada do que com raiva, não quero que ele entenda que possa fazer isso o tempo todo e que para mim ficará sempre tudo bem.

- Vou passear um pouco com Barney. - Grito para que Zilda e titia Morgan, me escutem da cozinha. Sim, ao que tudo indica, as duas se tornaram amigas apesar de algumas diferenças. Titia não só ensinou à Zilda a receita dos Rolinhos de Primavera, como também lhe deu dicas de temperos de outros lugares, com cheiros extraordinários.

E agora sei que eu tomei a decisão certa em aceitar a proposta de Morgan. Vejo minha tia, como um exemplo de vida. Não de vida amorosa, mas sim de vida profissional e social.

- Tome cuidado querida! - Pede Zilda, cautelosa como sempre.

Abro a porta da frente, e assim que cruzamos o portão, coloco uma pequena cordinha ao redor do pescoço de Barney.

- Kate, melhor não sair. Há um carro estranho que fica rondando a rua, e não me parece boa coisa. - Diz Yuri.

- Pode deixar Yuri, qualquer coisa eu grito! - Faço um coque mal feito no meu cabelo e o prendo com a minha presilha ponte-aguda. Caminho por debaixo de algumas árvores, e vejo Barney despertar alguns sentidos, e correr atrás de insetos como borboletas. Rio da cena. Deixo-o guiar a coleira por alguns segundos, e ele cheira descontroladamente o chão, como se ali houvesse alguma pista de alguém.

E então ele me guia até... A casa de Ethan. Claro! Como pude não perceber. Barney reconhece o cheiro de dele. Reconhece a casa, pois já viera aqui antes. O que me surpreende é o fato dele ser tão pequeno, e já procurar por alguém que sumiu por alguns dias.

E então, perco alguns segundos o observando e surge na minha direção dois rapazes encapuzados. Sempre fui alertada à correr quando desconhecidos fossem na minha direção por motivo algum. Olho para os lados, não tenho para onde ir. Iriam me alcançar com muita facilidade. Gritar não adiantaria mais em alguns míseros minutos, e alguma coisa me dizia que eles corriam rápido.

Barney solta um gemido. E consigo ver em seus olhos que preciso fazer alguma coisa para salvar à mim e à ele. Em geral cães são espertos, capazes de detectar qualquer coisa antes dos humanos. E meu primeiro e único pensamento foi tirar sua coleira e acaricia-lo às presas. Tomo sua cabeça em minhas mãos e ordeno:

- Traga ajuda! - E vejo suas ainda pequenas patinhas correrem rápido, logo se afastando cada vez mais de mim. Me pergunto se ele me entendeu. Se os cães entendem seus donos. Mas então, não restava mais tempo. Os dois rapazes me puxaram à força.

- Ela é bonita. - Diz um deles, avaliando meu rosto. Seu olhar é sereno, mas ao mesmo tempo me causa arrepios.

- Temos que ir logo. - Diz o outro. Não consigo ver nada à não ser seus olhos. Eles têm pressa e aparentam estarem ainda mais preocupados que eu. Eles me colocam no banco de trás do carro.

- Não vai perguntar nada princesa? - Fala de uma forma enjoativa o primeiro rapaz que tem o olhar "sereno". Faço uma cara feia.

- E deveria?! - Devolvo-lhe uma resposta.

- Sabia que tinha as palavras na ponta da língua, mas queria ver você usá-las. - Diz o outro, com um sorriso debochado. - Lembre-se: se você gritar, as coisas poderão ser bem diferentes.

Me concentro em ficar quieta e esperar o caminho todo em silêncio. Minhas mãos tinham sido devidamente amarradas ao banco, impedindo-me de fazer qualquer coisa para fugir. Lembro-me que peguei o meu celular e que está no bolso de trás do meu jeans.

- Posso fazer apenas uma pergunta?!

- Só uma. - Fecho os olhos com força, estamos em um pedágio, reconheço pelo cheiro de pneu queimado no asfalto.

- Isso tudo tem haver com o meu pai?? - Sinto uma dor ainda maior ao perguntar, eu esperava me sentir menos frustrada, mas não é o que acontece.

- Parece que a mocinha ali, sabe da família que têm. - Concluiu o garoto melancólico.

Eu balanço a cabeça, talvez eu sempre soubera, só não quis admitir. "Eles só querem o dinheiro" penso, tentando afastar qualquer outro pensamento ainda pior.

- Mas fica calma, o lugar onde iremos levar você é bem bom, comparado à outros cativeiros. - Reviro os olhos, e sinto meu rosto esquentar de raiva, ao mesmo tempo em que me esforço para não chorar.

A viagem não é longa, e aprecio o trajeto pela janela.

- Ei! A garota! - Grita o que está dirigindo - o mais rude e frio. - Veja se ela não está com o celular! - Ordena, esperto.

Penso rápido. Preciso dizer algo que afaste seus pensamentos, de uma vez por todas!

- Ãhm, - Tento enrolar. E então simplesmente falo um tom mais alto: - E QUEM COM CONSCIÊNCIA LEVA O CELULAR QUANDO SAI PARA PASSEAR COM O CACHORRO PELA VIZINHANÇA? 

- Ela tem razão, meio idiota isso! - Ajuda o melancólico. Reviro os olhos e tento parecer bem à vontade, quando na verdade sabia que se eles descobrissem sobre o celular, poderiam me matar antes mesmo de pedir qualquer tipo de regaste.

O caminho não é tão longo quanto eu esperava. Com certeza não estamos mais em São Paulo capital, mas não devemos estar muito longe disso. Penso nas aulas chatas da escola, penso em geografia. Tento imaginar um mapa ao redor da região metropolitana.

"Tudo bem" repito para mim mesma, várias vezes. Tem um posto chamado Graux e um restaurante de beira-estrada, junto ao posto. Nota mental das cores desse lugar.

E durante o que restava desse trajeto, tive meus olhos vendados...

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Estou de volta com mais um capítulo! 😛

Beijos, Fra...

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