Capítulo 20: O sopro de esperança

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Como ela fora tão idiota a ponto de achar que Cam nutria algo mais do que amizade por ela? Se sentia uma completa idiota. Estava bem claro que quando ele entrasse em contato com seu passado ele iria querer voltar para ele. Ela cobriu a boca para abafar o choro, nem sabia por que estava chorando, devia estar feliz por ele reencontrar seu caminho.

Os caminhantes tem um voto de castidade... Ela lembrou do que ele disse naquele dia no rio. Parecia que havia sido há muito tempo. Yulla enxugou os olhos lacrimejantes com as costas das mãos. Já havia amanhecido há muito tempo, o sol já estava bem alto. Ela estava encostada em uma árvore antiga e forte, sua cabeça doía de tanto que pensara e chorara na noite passada.

Ela perdera o que ela achara que ainda tinha. Não tinha mais nada pra fazer ali, não queria ser um fardo para Cam. E não seria.

Yulla se levantou decidida.

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Cam passava a mão na nuca sem parar enquanto se aproximava de onde os outros estavam dormindo, tinha que descansar um pouco. Logo eles teriam que seguir viagem, não podiam ficar ali para sempre.

Não viu sinal algum de Yulla por lá e ele sabia que ela estava certa de não ir pra lá. Ela precisava de um tempo sozinha.

Cam adormeceu em segundos.

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Quando acordou o sol já estava se pondo e os vagalumes começavam a tomar conta de tudo naquele espaço. Ele acordou meio grogue. Suas costas doíam da posição mal dormida. Todos os outros estavam reunidos ao redor de uma fogueira, comendo algo, ele se aproximou e se sentou com eles. Girou o corpo a procura da garota e não a encontrou. Ele olhou para um dos grandões.

– Onde Yulla está?

– Yulla precisa de um tempo sozinha. – foi a resposta que ele recebeu.

– Eu quero saber onde Yulla está. – Cam falou já com um pressentimento ruim no peito.

– Yulla precisa de um tempo sozinha. – o peludo repetiu convicto e decidido.

Cam se levantou e os outros o observaram sem compreender como Cam entendia o monstrão.

– Me fale aonde Yulla está! – ele falou autoritário.

– Yulla precisa de um tempo sozinha... com a deusa.

Aquilo foi o suficiente para Cam pirar. Ele deu ordens para que os outros ficassem por lá caso Yulla voltasse, montou em seu cavalo, e cavalgou entre as árvores como um furacão.

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A crise de choro havia retornado no peito de Yulla. Nunca pensara que fosse tão fraca. Seu corpo estava cansado, não havia tomado o néctar o dia todo e seu corpo já estava reagindo com dores insuportáveis e fraqueza, duas ou três vezes ela tombou de joelhos com força no chão, mas sempre erguia o corpo e seguia em frente.

Sabia que já não estava assim tão distante do Coração da deusa. Talvez mais um ou dois dias de caminhada. Estava sentindo tanto frio, sabia que estava com febre, seu corpo tremia convulsivamente, já não conseguia mais enxergar o que estava a um palmo a sua frente, seus olhos estavam muito embaçados.

Tombou mais uma vez, no entanto, diferente das outras vezes, ela não conseguiu se levantar.  Estava deitada de bruços. Sentiu um liquido quente escorrendo pelo seu nariz, sentiu um gosto metálico se formar em sua boca. Seu coração diminuiu o batimento, sua respiração estava quase nula. Pediu que sua morte fosse rápida.

A mão que tremia parou de tremer.

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Cam teve que seguir seu caminho a pé depois de um tempo. Seu cavalo se recusou a passar de um certo lugar e ele resolveu que não perderia seu tempo tentando fazer ele seguir em frente.

Corria como se a sua própria vida estivesse em risco, a cada passo que dava seu coração se contorcia dentro do peito.

Ela está bem, ela está bem, ela está bem... Repetia na cabeça incansavelmente quase como um mantra, mesmo sabendo que não estava nada bem. A culpa só podia ser dele naquele momento.

Por aqui, por aqui... Ouviu a voz tão familiar o chamar. Ele estancou. Por aqui Camel, por aqui... Era uma voz bastante tentadora, ele tinha que admitir. Sua mente dizia para não seguir a voz devido as lembranças do ataque do lobo, porém seu coração gritou para que ele acompanhasse ela.

Dessa vez o coração venceu. E graças a deusa que ele venceu.

Cam já estava quase desistindo de seguir a voz quando viu um montinho branco com cabelos castanhos no chão.

– Yulla... – ele arfou.

Ela estava pálida, os lábios estavam roxos, tinham sangue escorrido do seu nariz e boca, ao redor dos olhos estavam escurecidos. Ela não podia estar morta.

Ele se ajoelhou e tocou no rosto dela. Estava fria como um defunto. Ele ergueu seu corpo de encontro ao seu para aquece-la a abraçando com força. Não podia estar morta.

Tentou conferir a respiração dela: não havia nada. Não podia estar morta.

Ele conferiu o pulso dela: não havia batimento algum. Não podia estar morta.

– Yulla! – ele gritou a plenos pulmões balançando o corpo dela. – Yulla, acorde! Acorde! Por favor. Droga! – ele tentou fazer respiração boca a boca naqueles lábios frios e com gosto de sangue. Ele pegou no rosto dela várias e várias vezes, não percebia, mas já estava chorando. – Yulla! Você não pode morrer! Você não vai morrer! Eu não permito que morra! Yulla! Você foi a única coisa que me fez se sentir vivo durante estes últimos meses. Não pode ir agora... agora não...

O rosto de Yulla continuava com a mesma palidez. Agora com veias aparecendo em sua pele.

Estava tudo perdido afinal?

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