Capítulo 10

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Lia Marques

Já fazia mais de um mês que Andrea havia saído do café. Eu sentia falta dela, não tinha amizade com mais ninguém, tirando dona Antônia, minha vizinha, que era sempre tão bondosa comigo e com Júlia. Durante esse período, eu liguei uma vez para saber se Andrea estava bem e ela me ligou também, para saber se eu já tinha desistido de atender mesas e falou maravilhas de seu novo trabalho. Andrea era mesmo uma doida!

Júlia, naquela semana, não estava bem. Havia contraído uma forte gripe e estava com a garganta inflamada. Pedi a dona Antônia, que ficasse com Júlia alguns dias, para que eu pudesse trabalhar, mas acabou piorando e tive que procurar uma emergência médica, pois ela recusava-se a comer. Eu estava muito preocupada e tive que faltar dois dias seguidos ao trabalho. É claro que liguei avisando a situação e que assim que Júlia melhorasse um pouco, eu retornaria. O Sr. Biagio, não ficou muito satisfeito, mas acho que tolerou, pois sabia que eu não era de faltar e fazia o possível, para cumprir com todas as minhas responsabilidades.

O médico que atendeu Júlia, foi muito atencioso e cuidadoso com a saúde de minha filha. Por pouco, não foi preciso interna-la, pois não estava se alimentando. No dia que a levei, foi preciso que ficasse no soro, pois estava fraquinha. O pediatra, só a liberou pois receitou uma série de medicações, incluindo vitaminas e complemento alimentar, que garanti que ela tomaria. Só não contava com o custo que teria com o tratamento. Eu não tinha mais nenhuma reserva de dinheiro. Trabalhava o mês todo e o salário, mal dava para as despesas e alimentação. Não tive outra alternativa: usei parte do dinheiro do aluguel, que já estava para vencer, e comprei os remédios de Júlia. Não queria que ficasse internada, seria muito pior! Eu teria que conversar com o proprietário do imóvel ou pedir um adiantamento ao Sr. Biagio.

- Está preocupada, mia figlia? - Dona Antônia, perguntou. – Júlia já está melhorando! Amanhã, vá trabalhar que cuido dela. É melhor não mandá-la para escola ainda!

- Eu agradeço, dona Antônia. Tenho que voltar, pois o Sr. Biagio deve estar furioso com a minha ausência. Mas estou preocupada com o aluguel. Tive que mexer no dinheiro, por causa dos remédios da Julinha.

- Oh, poverina! Se pudesse, te daria o dinheiro dos remédios da menina! Sabe como gosto dela!

- Sei sim, dona Antônia! E a senhora já ajuda demais ficando com ela para eu poder trabalhar. Não tenho como agradecê-la!

- Sabe que adoro ficar com ela. Sempre que precisar, pode contar comigo!

Voltei ao trabalho e como já imaginava, o Sr. Biagio, estava com cara de poucos amigos. Expliquei a ele a situação de Júlia, levei o atestado médico, mas mesmo assim, parecia aborrecido. Será que pensava que funcionário não tinha o direito de adoecer? Que não tinha família? Pensei. Mas ele engoliu minhas desculpas e não descontou meus dias de falta, o que já foi um grande alívio. Resolvi deixar para pedir um adiantamento, depois quando estivesse menos contrariado. Retomei meu trabalho, torcendo para que Júlia ficasse bem com dona Antônia e não tivesse nenhuma recaída, pois não tinha mais dinheiro para remédios e não poderia mais me ausentar do trabalho.

Continuei minha vida na mesma rotina: trabalho e casa. Trabalhar no Il nostro café era cansativo e nas últimas semanas, estava sendo difícil. Muitas pessoas novas apareciam por lá, mas tinham também, os clientes de todo dia e havia um grupo de quatro homens que iam todos os dias, normalmente no mesmo horário, que estavam se tornando indelicados, com as gracinhas que faziam questão de insinuar, todas as vezes que ia atendê-los. Eu tentava disfarçar, fingia que não tinha entendido as provocações, ou pedia para outra colega atendê-los, no entanto, começaram a se tornar cada dia mais insistentes.

Não era para ser assimOnde histórias criam vida. Descubra agora