Capítulo 27

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Em um momento de desespero, chuto entre suas pernas o fazendo gritar de dor, me soltando e escorregando em seguida. Tudo aconteceu muito rápido e não consegui acompanhar. Mas quando abro os olhos, o vejo pendurado no penhasco. Segurando-se com as duas mãos para não cair. Fico imóvel. 

- Charlie. – era Henrique. – Se afasta, vem comigo. – ele me chamava enquanto eu continuava lá de joelhos. Meus olhos choravam sem ao menos perceber. 

- Não... não posso. – dizia baixo. Me aproximei do penhasco e estiquei a mão para o Ethan. – Segura minha mão, por favor. – suplicava para que ele o fizesse. 

Em um impulso ele segura minha mão tentando subir. Mas ao invés disso, o peso do seu corpo faz com que eu seja arrastado para frente. 

- NÃO! – grita Henrique. 

Fecho os olhos, sinto meu corpo sendo arrastado. Mas minha mão continua firme segurando a do Ethan. Meu corpo adormece ao poucos, a adrenalina daquele momento me faz perder a noção do que estava acontecendo. E ainda com os olhos fechados, sinto o mundo se distanciar, como se eu já não pertencesse mais a ele. 

Mas antes de desistir e ceder, sinto algo me puxando para trás e trazendo meu irmão junto comigo. Já não estávamos mais sobre o penhasco, apenas nós três deitados naquele chão sujo e sem vida. Abro meus olhos devagar e vejo o Ethan caído, olhando fixo para baixo. O Henrique estava sentado me segurando pela cintura, sua feição era indescritível. Não sabia se era medo, alívio ou tensão. Ficamos calados por alguns instantes, ouvindo só a respiração um do outro. Até que ele se levanta. 

- Agora você não escapa. - disse ele se dirigindo ao Ethan e o levantando pelo pescoço num impulso só. 

Para minha surpresa, eles não esboçou reação alguma com o ato que Henrique tomou. Apenas saíam lágrimas de seus olhos, que já estavam vermelhos. Ao ver essa cena, Henrique também fica sem reação. 

- Solta ele... por favor. - supliquei. 

- Não farei isso. Ele tem de pagar pelos seus atos. - dizia com raiva em sua voz. 

- Eu te suplico Henrique, solta ele. - pedi com a voz trêmula. Segurei em seu braço. - Por mim.
Ele parou e me analisou por alguns instantes. Olhou para Ethan com uma cara de desprezo de decidiu solta-lo, o fazendo cair no chão. 

- Obrigado. - sussurro baixo. 

Henrique se afasta e se vira passando a mão no rosto. Ele parecia confuso e ao mesmo tempo preocupado. Ia falar com ele, mas ouço Ehtan me chamar. 

- Charlie... - disse baixo e me olhando ainda com os olhos em lágrimas. Ele estende a mão. - Me escuta. 

- Oi. - disse de forma fria o encarando. 

Me abaixo para ficar de sua altura. E em um impulso ele me puxa e me abraça. Ele então começou a chorar de forma desenfreada, como se tivesse perdido alguém importante. Seus braços me entrelaçavam de uma forma que chegava a me apertar. 

- Des... desculpa Charlie. - começou a falar ainda chorando. - Perdão... perdão por tudo... - e mais choros. - perdão por tudo em todos esses anos. - ele chorava enquanto suplicava meu perdão. 

Eu estava confuso, assustado, com medo, com receio. Era um misto de sentimentos que não conseguia distinguir ao certo o que estava sentindo ouvindo aquelas palavras. Minha cabeça ficou um caos, nada fazia mais sentido. Sinto lágrimas involuntárias descendo no meu rosto e então bem devagar levanto os braços e o abraço. Nesse momento senti um sentimento de paz, de tranquilidade que começava a surgir no meu coração. Não sabia o motivo ao certo, talvez o fato de ter percebido a ligação com o meu irmão naquele momento que lembrava muito a ligação que tinha com a minha mãe. 

Henrique apenas observava aquela cena. E meu irmão continuava a me abraçar. Ele me pedia perdão, dizia coisas que não faziam como sentido como "eu não queria", "eu lutei muito", "era mais forte do que eu". Não entendia muito bem o que ele queria dizer. Mas sentia sinceridade naquelas palavras e também muita angustia. Após ele se acalmar me afasto dele e o olho. 

- Charlie, você é o bem mais precioso que eu tenho... - disse ele dando pausas e enfraquecendo a voz. - Todo esse tempo eu estive sob algum tipo de controle, como se houvesse algum feitiço... pode parecer loucura minha. Mas espero que acredite... - dizia ainda confuso tentando de explicar. 

Tudo fazia sentindo. Já havia pensado nessa possibilidade com a Úrsula. Não consigo nem imaginar o quão horrível deve ter sido pra ele não controlar suas atitudes todo esse tempo. 

- Não se preocupe, eu acredito. - forcei um sorriso e olhei para o Henrique que estava ainda muito desconfiado com aquilo tudo. 

Lembrei então de sua mãe, que estava presa e precisava levá-lo até ela. E tudo ficaria mais claro. Me levantei e ajudei o Ethan a se levantar. 

- Eu sei onde sua mãe está. E precisamos tirar ela de lá. - disse me dirigindo ao Henrique.
- Como assim? Onde ela está? - falou rápido. - Vamos agora. 

- Eu ajudo vocês. - falou Ethan. 

Apesar de Henrique ainda está com um pé atrás quanto ao meu irmão, ele não questionou nada sobre. Saímos de lá e fomos em busca da casa. Não demora muito e chegamos lá. 

- Ela está presa lá dentro. Pelo menos estava. - falei baixo. 

Ao entrarmos na casa, ela ainda estava presa e conversava com alguém. Era sua irmã Ághata. 

- Tem alguém com ela. - disse Henrique. 

- Não, aposto que é no espelho. - falei. 

Aquilo tudo me fez crescer muito, me fez ficar mais forte e ter menos medo do que me esperava. Era perceptível que eu deixara um pouco de lado aquela posição indefesa e estava buscando coragem no meu coração pra enfrentar tudo aquilo que estava acontecendo. Eu tinha medo, muito medo, mas eu não podia me deixar vencer por isso. 

Quando demos conta que ela havia parado de conversar, entramos e Henrique logo correu para tirar ela de dentro das grades. Eles se abraçaram, e choravam juntos. E eu apenas sorria de felicidade vendo aquilo tudo. Era notório o quão aliviada ela estava. Ela então vem até mim e me abraça, sussurra em meu ouvido um obrigado. E abraça meu irmão. Ouço ela pedir desculpas a ele pelo mal que a Úrsula o fez. 

Saímos de lá e fomos para nosso castelo. Ela estava preocupada com a segurança do Arthur e Valentina. E eu confesso que também estava. 

Ao chegarmos no castelo. Descemos todos e fomos em direção a biblioteca. Úrsula não queria parar, ela estava disposta a enfrentar a irmã frente a frente. Mas achamos mais seguro se ela ficasse e o Henrique fosse em busca dos irmãos. Era melhor enfrenta-la sem que ela pudesse fazer mal a eles. 

Henrique saiu da sala, e foi em busca do seu cavalo para buscar seus irmãos. Antes de sair, fui até ele que estava ajeitando a cela. 

- Prometa que não fará nada agora, sozinho. - disse me aproximando. 

- Não se preocupe, Charlie. - ele sorriu de leve. 

- Prometa. - insisti. 

- Tudo bem. Eu prometo. - falou ele. 

Após prometer eu o abraço forte. E ele retribui me abraçando e beijando o topo de minha cabeça. 

- Eu vou voltar, e vou trazer meus irmãos. E vamos achar juntos uma forma de fazer justiça com a minha tia. - disse deixando o abraço em seguida. 

- Tudo bem. Vou ficar esperando. - falei sorrindo de leve. 

Eu me aproximei dele e repousei meus lábios sobre os dele. E mesmo que por alguns poucos segundos, senti como se a primavera estivesse aparecendo e substituindo o inverno frio.
Ele sorriu e montou no cavalo. E partiu. 

Anos atrás 

- O feitiço contra o Ethan foi lançado. Eles agora terão dois filhos que não se darão bem. - dizia Ágatha. - O ciúme que o Ethan sente hoje por Charlie se transformará em um ódio inigualável. E só poderá ser quebrado com um ato ou sacrifício de amor verdadeiro feito pelo Charlie. Mas como eles irão ser inimigos, isso será impossível. - dizia ela aos risos em frente ao espelho. 

- Espelho, espelho meu... existe bruxa mais má do que eu?

Os Dois Lados do Espelho (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora