II. Problema

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Maio

A noite trouxera a luz resplandecente da lua no céu, lutando por notoriedade com o silêncio decorrente das ruas vazias. As cortinas de pano que cobriam as janelas desgastadas pelo tempo balançavam com o vento forte que contra elas chocava. Como consequência, um carrinho de brinquedo caiu no chão do quarto desprovido de luz elétrica, despertando de forma nada sutil o homem de cabelos escuros.

Sentado na cama, Nathan focou os olhos esbugalhados nas venezianas abertas antes de desviá-los para a fonte do ruído, seu brinquedo de infância. Fechou os olhos, ligeiramente aliviado ao lembrar-se de que estava na casa dos pais. Colocou os pés descalços no piso frio, seguindo então até o carrinho pequeno que havia caído de cima da cômoda. Agachou-se com um suspiro, juntando-o e colocando-o onde estava previamente. Com a pacata luz da lua que entrava em sua janela, pôde observar com nostalgia os demais brinquedos que costumava usar em sua infância dispostos em fileira na cômoda branca.

Assim que um arrepio subiu à sua nuca devido à corrente de ar que pela janela entrara, Nathan piscou os olhos antes de virar nesta direção, forçando os pés cansados a caminharem até lá. Com o intuito de fechar a janela, afastou a cortina e dirigiu as mãos geladas até esta. Um movimento, porém, chamou sua atenção antes que o fizesse. Estreitou os olhos, pensando se estaria a imaginar coisas ao focá-los no que havia se movido em seu jardim.

De seu antigo quarto, localizado na parte direita da casa de seus pais, podia ver perfeitamente – o quão perfeita a visão pode ser desprovida da luz do sol – a figura locomover-se na lateral da casa. Estava parcialmente escondido entre as folhagens que sua mãe costuma cuidar, poucos centímetros longe da cerca de arame que os separava da residência do vizinho. Nathan estava suficientemente distante do objeto de sua atenção devido à altura do segundo andar da casa, no entanto, isto não o impedia de encarar com espanto a pessoa que invadira o terreno de seus pais.

Inclinou-se inconscientemente, uma das mãos afastava a cortina e a outra apoiava-se no parapeito da janela, a curiosidade e o assombro apenas aumentando ao passo que notava a estranheza da situação. Poucos segundos depois, o ser em questão locomoveu-se de forma peculiar em direção aos fundos de sua casa, de onde Nathan não tinha perspectiva de sua janela.

Estaria o sujeito agachado ou ele era mesmo pequeno?

Sem esperar um segundo, Nathan deslocou-se em direção à porta de seu quarto, abrindo-a com brusquidão. Os pés descalços não faziam ruído algum em comparação à sua respiração, que acelerava junto das teorias em sua mente. Desceu as escadas com rapidez, os olhos já acostumados com o breu do local. Passou pela cozinha com o intuito de chegar à porta que dava aos fundos da casa. Praticamente grudou o rosto no vidro ao dar uma olhada, nada podendo enxergar, antes de abrir, por fim, a porta.

O silêncio era mais ameno no exterior, os sons de grilo e da movimentação de folhas, devido ao vento, inundando o local. Deu alguns passos em frente, descendo os cinco degraus antes de seus pés pisarem na grama, os olhos escuros disparando até onde sua visão podia alcançar. Estreitou-os quando avistou uma sombra atrás das pequenas árvores que cresciam perto do muro. Não demorou muito para distinguir a forma do corpo que escondia-se de forma agachada.

Estancou no lugar ao ver os olhos da criatura brilharem com a luz da lua, embora não pudesse ver a cor neles estampada. Incapaz de movimentar-se um centímetro, desprovido de coragem, limitou-se a observar os movimentos alheios. Ou melhor, a falta deles. A mente de Nathan voava, imaginando se tratava-se de um ladrão, um fugitivo ou um sanguinário. Até mesmo a parte mais remota de si revirou-se ao cogitar a hipótese da estranha criatura não ser humana, devido à maneira incomum de se locomover. Reprovou a si mesmo por sequer ponderar à respeito.

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