XIV. Upahaar

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Dezembro

— Tudo bem se você não quiser responder, querido. — Gloria tratou de assegurar, com um sorriso amigável no rosto. — São apenas questionamentos formais da Dra. Lisa.

Apesar de haver entrado em um estado de inércia, a investigação do "caso Lucca" não houvera cessado, ainda mais quando se tratava do garoto em si. A verdade é que estavam no caminho certo, desvendando camada por camada do mistério envolto no garoto, apenas não sabiam qual seria o próximo passo a se tomar. Chegaram à conclusão de que, apesar de ter um caminho falho, o garoto era a melhor pista que eles tinham para desvendar o mistério acerca de sua origem. Com a autorização da Dra. Clark, os questionamentos para Lucca por meio de Gloria haviam aumentado nas últimas semanas, mesmo que os mesmos fossem incômodos para o garoto.

Lucca se tornara, com o tempo, apenas a ponta do iceberg. A equipe de Investigações Criminais Específicas estava muito grata pela existência do garoto, que desencadeou em um caso que, sem ele, poderia haver passado sem nunca ser descoberto. Estava muito claro para o Departamento de Doubleville que, o que quer que estivesse debaixo do tapete de Amoran, era muito mais grave e expansivo do que fora imaginado.

Podia ser que restasse, por ora, apenas as memórias talvez apagadas de um garoto traumatizado. Mas eles fariam desta única pista existente, a única pista necessária para concluir o caso, custasse o que custasse.

— Não — murmurou ele, desviando os olhos da televisão para a assistente social com o rosto indecifrável. — Não são.

Gloria franziu o cenho, dando-se conta que não seria tão fácil enganar Lucca. Ele, afinal, havia conhecido os agentes Hemming e Collins, e sabia que eram os mais empenhados nos interrogatórios. Ao menos, mais empenhados que a Dra. Lisa Clark.

A sala estava tomada pela luz do sol em pleno meio dia, que entrava pelas janelas abertas da mesma, bem como o aroma de comida e o som do desenho animado que saía da televisão. Lucca estava sentado por cima das pernas na poltrona que costumava ser de Nigel, os olhos voltados para o Bob Esponja mais uma vez. Gloria, com uma perna por cima da outra e um bloco nas mãos, limitava-se a observar o garoto.

— Tem razão — disse ela, com um sorriso. — As perguntas vêm de toda a equipe que você já conhece. Mas Lisa não permitiria que fossem passadas a você se não fosse de extrema importância, Lucca.

Lucca franziu os lábios, já não prestando atenção no desenho animado que assistira nas últimas semanas. Gostava do bom humor de Bob, porque o fazia recordar-se de Nathaniel. Ao mesmo tempo, sentia-se como o Lula Molusco por não ter a capacidade de absorver a energia boa da esponja, bem como de interagir normalmente com a mesma.

Suspirou em seguida, voltando os olhos para Gloria, que seguia a observar-lhe com carinho.

— Eu pegou... — começou ele, mas parou instantaneamente ao perceber a própria falha. Tomou um segundo com seriedade antes de se corrigir. — Eu pegava comida para eu e para amigos.

— Para mim — corrigiu Gloria, sorrindo mais uma vez. — Seus amigos, Sassenach e os outros?

Lucca assentiu com a cabeça, baixando os olhos para a calça de moletom que usava. Levou a mão próxima ao joelho e beliscou o tecido algumas vezes, o que já houvera virado mania. Não gostava de pensar em Shahatoot e Loba, porque não gostava de lembrar de suas mortes. Desde sua mãe, não gostava de pensar em morte de forma alguma.

— Nas lixeiras do laboratório? — tentou Gloria mais uma vez, o cenho franzido.

Lucca assentiu, os olhos desfocados. Abriu a boca para falar, mas fechou-a novamente. Deu de ombros, como se não fosse nada importante, assim que percebeu o olhar questionador da assistente.

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