Capítulo 6

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No outro dia acordei cedo, Jake ainda dormia, mas papai já estava descendo para tomar café da manhã. O acompanhei até o cômodo em lá em baixo, e peguei um pouco de café. Fiquei conversando com meu pai enquanto ele bebia café e limpava seus binóculos caros. Ele parecia bem animado. Até que Jake acordou e nos encontrou tomando café. Logo depois Kev apareceu com três pratos que continham uma carne duvidosa e torradas fritas (eu nem sabia que era possível fritar torradas), mas elas eram realmente boas. Terminamos o café e fomos com papai até a praia para ver as aves.

O dia estava do jeito que eu gosto, nublado e frio. O sol se escondia atrás de massas gigantescas de nuvens apenas para ressurgir momentos mais tarde e colorir as colinas com raios de luz espetaculares, e eu me sentia energizada e esperançosa.

Observei os olhos de meu pai se arregalarem quando ele viu as aves. — Fascinante! — Murmurou ele, arranhando um pedaço de cocô petrificado com a ponta de sua caneta. — Vou precisar de algum tempo aqui, tudo bem?

Eu já vira aquela expressão em seu rosto antes e sabia exatamente o que "algum tempo" significava: horas.

— Então nós vamos achar a casa sem voê — disse eu.

— Não, sozinho não. Você prometeu.

— Vou procurar alguém que possa me levar.

— Quem?

— Kev deve conhecer alguém.-- Meu pai olhou para o mar, onde um grande farol erguia-se sobre um monte de rochas empilhadas não muito longe da costa.

— Você sabe qual seria a resposta se sua mãe estivesse aqui — disse ele. Meus pais tinham teorias diferentes sobre a quantidade de proteção paterna necessária para mim. Mamãe era mais severa, sempre no controle, mas meu pai era mais relaxado. Ele achava importante que eu cometesse meus próprios erros de vez em quando. Além disso, se nos deixasse ir, estaria livre para brincar com as aves o dia inteiro.

— Está bem — disse ele. — Mas não se esqueça de deixar no pub o número do telefone de quem quer que vá com você.

— Pai, ninguém aqui tem telefone. Ele deu um suspiro. — Está bem, desde que seja de confiança.

Quando chegamos ao pub Kev tinha saído para resolver alguma coisa, e chamar um de seus fregueses bêbados para nos acompanhar era uma péssima ideia, fomos até o estabelecimento seguinte fazer minha pergunta a alguém que, pelo menos, tivesse um emprego remunerado. Na porta, estava escrito PEIXEIRO, que era um gigante barbado com um avental sujo de sangue que dava medo em qualquer um. O gigante parou de decapitar peixes e nos olhou, com o cutelo na mão.

— Mas pra quê? — rosnou o peixeiro quando Jake disse onde queríamos ir. — Lá não tem nada além de pântanos e um tempo maluco. Ele explicou sobre nosso avô e o orfanato. Ele virou-se para observar um garoto mais ou menos da idade do jake que estava arrumando peixes numa gaveta do freezer, depois debruçou sobre o balcão para lançar um olhar desconfiado para nossos sapatos.

— Acho que Dylan não está muito ocupado e pode levá-los até lá — disse ele. — Mas vocês vão precisar de sapatos apropriados. Não é legal ir de tênis, eles vão ser sugados em um segundo pela lama.

— Sério? — disse eu. — Tem certeza?

— Dylan, pegue dois pares botas de borracha para esses dois aqui!

O garoto resmungou e fez uma cena para fechar lentamente o freezer e limpar as mãos antes de se arrastar até uma parede de prateleiras cheias de produtos. — Por acaso temos boas botas assim em oferta — disse o peixeiro. — Compre uma e leve a outra grátis! — Ele soltou uma gargalhada e bateu com o cutelo num salmão. A cabeça do peixe voou do balcão sujo de sangue para aterrissar perfeitamente num pequeno balde de guilhotina. Pesquei do bolso o dinheiro para emergências que meu pai tinha me dado, pensando que uma pequena extorsão era um preço baixo a pagar para encontrar o homem que eu cruzara o Atlântico para conhecer. Saímos da loja atrás de Dylan calçando um par de botas de borracha tão grandes que meus tênis cabiam dentro delas, e tão pesadas que era difícil acompanhar o ritmo de meu guia mal-humorado.

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