Capitulo 8

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Nós nos viramos para voltar, humilhados. Em vez de andar abaixada, abandonei o que restava da minha dignidade e fui engatinhando, na direção da luz que vinha da entrada do túnel. Nós saímos do túnel apertado do cairn e fomos para o exterior só para sermos cegados pela luz. Protegi os olhos e vi por uma fresta entre os dedos um mundo que eu mal reconheci: a mesma trilha, tudo era o mesmo de antes, mas pela primeira vez desde a nossa chegada estava tudo iluminado pela luz amarela e estimulante do sol, o céu azul glacê, sem qualquer vestígio, em lugar nenhum, da neblina esquisita que passara a definir aquela parte da ilha. Também estava quente, mais para os dias de auge do verão do que para os de seu princípio, com sua brisa fresca. -- Como o tempo muda rápido por aqui! – disse, mas jake estava tão chateado que nem ligou.

Caminhamos com dificuldade até a trilha, tentando ignorar a sensação da lama da charneca se esfregando contra a pele dentro de minhas meias, e tomei o rumo da cidade. Estranhamente, a trilha em si não tinha nenhuma lama, como se houvesse secado em apenas alguns minutos, e também não havia o zumbido permanente dos geradores a diesel. Será que a cidade tinha ficado sem combustível nas poucas horas em que nós saimos?

Mais uma coisa: por que todos eles estavam nos olhando? Todo mundo com quem eu cruzava me encarava de olhos arregalados, parando o que quer que estivesse fazendo para me ver passar. Devo parecer tão louca quanto estou me sentindo, coberta de lama da cintura para baixo e de gesso da cintura para cima, por isso baixei a cabeça e andei o mais rápido que pude na direção do pub, onde ao menos eu podia me esconder até a chegada do meu pai para o almoço.

Dentro do Buraco havia o mesmo grupo de homens embriagados debruçados sobre copos grandes cheios de espuma, as mesmas mesas surradas e a decoração cafona que eu tinha começado a considerar minha casa-longe-de casa. Mas, quando nos íamos até às escadas, ouvi uma voz desconhecida gritar:

— Aonde vocês pensam que vão?

Eu me virei, já com um pé no primeiro degrau, para ver o balconista nos olhar de cima a baixo. Só que não era Kev. Era um sujeito mal-encarado e de cara redonda que eu não reconheci. Ele vestia um avental de balconista e tinha uma "monocelha" peluda e um bigode que pareciam taturanas e deixavam seu rosto listrado. Respondi — Para o meu quarto. — Isso falado de um jeito que mais parecia uma pergunta que a afirmação de um fato.

— É mesmo? — disse ele, pousando o copo que estava enchendo. — Isso aqui, por acaso, parece um hotel para você?

Madeiras rangeram quando os fregueses viraram de seus bancos para me olhar. Examinei rapidamente o rosto deles. Nenhum era familiar. Era como se o mundo inteiro tivesse enlouquecido. Disse ao barman que obviamente havia algum engano.

— Meu pai, eu e minha irmã estamos nos quartos do andar de cima — falou Jake. — Olhe, tenho a chave — e a pegou do bolso como prova.

— Deixa eu ver isso — disse ele, inclinando-se sobre o balcão para apanhá-la da mão. Ergueu-a contra a luz fraca, olhando como se fosse uma joia. — Essa chave não é nossa — resmungou, mas guardou-a no próprio bolso. — Agora me diga o que realmente querem lá em cima. E, desta vez, não minta!

Nunca havia sido chamado de mentiroso por um adulto que não fosse meu parente antes.

— Já disse para você. Alugamos esses quartos! Pergunte para Kev se não acredita em mim! –disse Jake envergonhado.

— Não conheço nenhum Kev e não gosto de historinhas — disse ele friamente. — Não há quartos para alugar por aqui e o único que vive lá em cima sou eu!

Olhei ao redor esperando que alguém abrisse um sorriso e me deixasse entrar na brincadeira. Mas o rosto dos homens parecia de pedra.

— Eles são americanos — observou um homem que ostentava uma barba prodigiosa. Talvez do exército.

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