Capítulo 28 (final)

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Chegamos de volta à cidade pouco antes do amanhecer. A chuva tinha finalmente diminuído e o início de um dia de céu azul anunciava-se no horizonte. A trilha principal parecia um braço com as veias arrancadas, com valas compridas onde a enxurrada lavara o cascalho.

Atravessamos o bar vazio e subimos até nossos quartos. As persianas estavam abaixadas e a porta de nosso pai, fechada, o que era um alívio, porque eu ainda não tinha ideia de como contar o que precisava contar para ele em voz alta. Em vez disso, sentei-me com bloco e caneta e lhe escrevi uma carta.

Tentei explicar tudo. Escrevi sobre as crianças peculiares e os etéreos, e como todas as histórias do vovô Portman eram verdadeiras verdadeiras. Contei a ele o que tinha acontecido com a srta. Peregrine e a srta. Avocet e tentei fazê-lo entender por que nós tínhamos de ir. Implorei que não se preocupasse. Expliquei que Jake ia junto e que eu ia cuidar dele. Também contei que era peculiar, e que vovô sabia.

Então parei, reli o que tinha escrito, amassei o papel e o joguei no lixo. Ele nunca acreditaria. Ia achar que eu tinha enlouquecido de vez como o vovô, ou

que eu tinha fugido e sequestrado Jake, ou pulado de algum penhasco. De qualquer jeito, eu estava a prestes a acabar com a vida dele.

— Jacob, Luana?

Eu me virei na cadeira. Meu pai estava apoiado no batente da porta de seu quarto, com olhos baços, os cabelos despenteados após o sono, vestido com jeans e uma camisa suja de lama.

— Oi, pai. — eu disse.

— Vou fazer a você uma pergunta simples e direta, e gostaria de uma resposta simples e direta. Onde vocês estiveram a noite passada?

Eu podia ver que ele estava se esforçando para manter a compostura.

— Com meus amigos — Jake respondeu.

Foi como se eu tivesse puxado o pino de uma granada.

— SEUS AMIGOS SÃO IMAGINÁRIOS! — gritou ele. Veio em nossa direção, o rosto se encolerizado. — Queria que sua mãe e eu nunca tivéssemos nos deixado convencer por aquele terapeuta maluco a trazer vocês aqui, porque isso tem sido um completo desastre! Você mentiu para mim pela última vez! Agora vá para o seu quarto e comece a fazer as malas. Vamos embora na primeira barca!

— Pai? — eu intervi.

— E quando chegarmos você só vai sair de casa quando acharmos um

psiquiatra que não seja um imbecil completo! E Luana, eu esperava que fosse responsável e não alimentasse essas ilusões do seu irmão!

— Pai!

Por um instante pensei que talvez tivesse de fugir dele correndo. Visualizei meu pai me segurando no chão e gritando por ajuda, e, em seguida, me enfiando na barca preso numa camisa de força.

— Nós não vamos com você.

Ele apertou os olhos e inclinou a cabeça, como se não tivesse ouvido direito. Eu ia começar a repetir quando alguém bateu à porta.

— Vá embora! — gritou meu pai.

Ouvimos outra batida, dessa vez mais insistente. Ele correu até lá e a abriu, e ali, no alto das escadas, estava Emma, com uma pequena bola de chama azul dançando acima da mão, Enoch e Olive.

— Olá — disse Olive. — Viemos aqui falar com Jacob e Luana.

Ele ficou atônito, olhando fixamente para os três.

— O que é isso...

Eles passaram por ele e entraram.

— O que vocês estão fazendo aqui? — chiei com eles.

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