Capítulo 16

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Na tentativa de evitar um novo sermão, eu me levantei cedo, mandei uma mensagem pro Jake me encontrar lá em baixo, e saí antes que meu pai acordasse.Antes de sair fui ver o girassol que Enoch me deu, mas ele não estava na mesa de cabeceira onde eu tinha deixado. Uma busca cuidadosa pelo chão revelou uma grossa camada de poeira. Estava começando a me perguntar se alguém tinha o roubado, quando me dei conta de que aquela poeira era o girassol, e que em algum momento durante a noite ele tinha se estragado muito, de decompondo e virando poeira.

Intrigada e com o estômago roncando, joguei fora a poeira e fui ver se Jake já estava lá embaixo, assim que ele chegou, deixamos para trás a chuva que caía em troca do confiável sol da fenda. Dessa vez, porém, não havia ninguém à nossa espera do outro lado do cairn. Tentei não ficar muito desapontada, mas estava, um pouco.

Quando cheguei à casa, imediatamente comecei a procurar por Enoch, mas a srta. Peregrine nos interceptou antes que passassemos pelo saguão de entrada.

— Uma palavra com vocês, senhor e senhorita Portman — disse ela, e nos conduziu

para a privacidade de sua cozinha, ainda impregnada dos cheiros deliciosos do

café da manhã que eu tinha perdido. Eu me senti como se tivesse sido chamada

ao gabinete do diretor.

A srta. Peregrine se acomodou contra o fogão gigante, um equipamento formidável que podia muito facilmente ter cem anos, quando a fenda no tempo ainda era nova.

— Estão gostando dessa temporada aqui conosco? — ela perguntou.

Respondi que estava, muito. Meu estômago roncou.

— Que bom — retrucou ela, e então seu sorriso desapareceu. — Soube que

passaram uma tarde agradável com alguns de meus tutelados ontem. E que também

tiveram uma conversa bem interessante.

— Foi ótimo — disse Jake. — Eles são todos muito simpáticos. — Tentava manter a leveza daquela conversa, mas sabia que ela estava nos preparando alguma.

— Diga-me, como descreveria a natureza de sua conversa? -- ela perguntou pro meu irmão

— Não sei... conversamos sobre várias coisas. Como as coisas são aqui. Como elas são de onde eu venho.

— De onde você vem.

— Isso.

— E você acha inteligente discutir eventos do futuro com crianças do passado?

— Crianças? É isso mesmo que a senhora pensa deles? — deu pra ver que ele se arrependeu de dizer isso antes mesmo de terminar de pronunciar as palavras.

— É como eles também veem a si mesmos — disse ela com irritação. — Do que mais você poderia chamá-los?

Levando em conta seu humor, essa não era uma sutileza a se discutir.

— Crianças, acho...

— Isso mesmo. Agora, como eu dizia — prosseguiu ela, enfatizando as palavras com pancadas dadas com a lateral da mão no fogão —, você acha inteligente discutir o futuro com crianças do passado?

— Não?

— Ah, mas parece que acha, sim! Sei disso porque ontem à noite, no jantar, Hugh nos presenteou com um relato fantástico sobre as maravilhas das tecnologias de telecomunicações do século XXI. — A voz dela estava impregnada de sarcasmo. — Você sabia que quando envia uma carta no século XXI ela pode ser recebida quase instantaneamente?

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