-11- Amber

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De quem será que foi a ideia de que me faria bem ir as aulas? Não faço a mínima ideia do que se trata a lição e também o que está escrito na lousa. E por que tem tanta gente me olhando, será que já sabem que sai do coma? Não é o tipo de popularidade que quero ter por aqui.

Minha professora tem os cabelos de fumaça cinza, que balançam sob sua cabeça feito um chapéu de espuma, é baixinha, dá no meu ombro, usa longos brincos verdes abacates e unhas pintadas de laranja, uma blusa florida azul e meias, que eu acredito ser uma preta e outra azul escuro. Ela está falando sobre um livro, alguma leitura que a turma tem feito nos últimos dias.

A história sobre um casal que não consegue ficar juntos e depois de diversos empecilhos, que incluíam a protagonista ser mandada para um convento, ambos morrem de tristeza. Amor de Perdição, o nome da obra. Agora que sei o final do livro nem terei o trabalho de lê-lo, quando eu voltasse a conseguir ler.

O Médico disse que essas coisas voltam com o tempo. E eu volto a perguntar, quem teve a brilhante ideia que vir para a escola me ajudaria? Meu primeiro dia e já detesto esse lugar.

O sinal tocou.

E lá estava Renzo na porta à minha espera. Depois do momento constrangedor que a professora me apresentava a toda classe, Renzo foi titulado meu acompanhante de corredor. Ele me leva até minha sala, para a próxima aula. Eu saí do coma não fiquei cega.

Ao menos ele não me faz perguntas, parece que me buscar a cada aula para a próxima já é satisfação demais pra ele. Uma cabeça mais baixo que eu, seus cabelos são cortados bem curtos, mas não valorizam seu rosto, faz parecer que tem mais orelhas. Ele usa algo nos dentes, um desses aparelhos odontológicos de correção. Fica com as mãos no bolso do casaco o tempo todo, até para apontar uma direção, no fim, não é de todo ruim, não consigo ter uma conversa clara com alguém mesmo.

Por mais que as palavras estejam se formando em frases na minha cabeça, é como se minha boca não compreendesse e transmitisse frases picotadas, fora de ordem e embaralhadas. Evito conversar. Me limito a responder o mais breve possível. Tem funcionado por enquanto.

Renzo sorriu quando me viu e começamos a caminhar. Minha próxima aula fica no laboratório, Química. Uma estranha sensação de limpeza excessiva e alunos acomodados aos pares em bancadas. Me sentei em uma que não ficava no fundo, nem muito a frente, bem no meio. Uma necessidade por encontrar equilíbrio. O professor entrou na sala e se sentou, e passou a receber os que chegavam a sala com um leve aceno de cabeça.

– Bom dia galera. Hoje antes de iniciar as atividades da aula, gostaria de dizer que fara parte das nossas aulas uma nova aluna. Amber, queira ficar de pé para que seus novos colegas possam vê-la!

Deslizei do banco e fiquei de pé, tentei sorrir de volta e nesse momento uma orla de zumbidos e sinal de campainha tomou a sala, os alunos puxavam celulares dos bolsos e davam risadas e trocavam olhares entre si.

– Desliguem os celulares, nada de celular na minha aula, ok!!! – censurou o professor.

– Eu sou Tulio, o professor de Química. Seja bem vinda a nossa escola! – eu voltei a sentar e sorri constrangida, podia jurar que os risinhos estavam bem mais direcionados a mim.

O professor era empolgado para explicar formulas e composições, criou até uma musiquinha, mas eu me limitei a desenhar qualquer coisas com formato geométrico ao invés de aprende-la.

Na hora do intervalo Renzo me acompanhou até o refeitório. Sentamos numa mesa qualquer com outro garoto, que pareia estar dormindo e indiferente com a nossa presença.

ClepsidraOnde histórias criam vida. Descubra agora