-26- Amber

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Assim que ouvi o som do chuveiro, me senti mais aliviada. Me deitei na cama e cheirei o travesseiro dele. Eu estava mesmo no quarto dele. Me levantei e comecei a vasculhar o quarto, havia tantas coisas para ver, aquele quarto era formado de tudo o que representava o Will, durante anos. Isso é um quarto cheio de memorias.

Comparando com meu quarto, eu tinha roupas de liquidação, um papel de parede que parecia uma atoalha de mesa, muito desenhos e o vazio. No quarto de Will, havia posters na parede do que parecia ser bandas, filmes e desenhos que eu não reconhecia. Muitos livros que eu não sabia o que dizia a lombada. Suas camisetas no chão tinham frases que eu não podia ler e uma infinidade de revistas em quadrinho. Fui até a janela e vi o que Will vê quando olha para janela do meu quarto, dá para ver minha mesa onde eu desenho, metade da minha cama e parte da porta do quarto.

A jaqueta verde estava caída perto do pé da cama, recolhi e examinei ela por um tempo, o cheiro de Will era tão forte nela...

– Acho que estou cheirado bem agora. – Me virei e Will estava saindo do banheiro, usava uma calça jeans, estava sem camisa, secando o cabelo com a toalha. Ele abaixou a toalha e sorriu e eu me senti paralisada por aquele sorriso. Seu cabelo molhado parecia mais escuro, mas seus olhos brilhavam vivamente. Calda de caramelo.

Eu o estava olhando fixamente e sabia disso, sabia que já devia ter desviado o olhar, e tentar disfarçar agora era desnecessário. Soltei a jaqueta no chão.

– Vou te mostrar... – antes que eu pudesse perguntar sobre o que ele estava falando, Will se virou e então eu vi. Ele foi até a gaveta, puxou uma camiseta, vestiu e se sentou na cama.

– São... – eu não conseguia dizer. O obvio era difícil demais para assimilar.

– Diga Amber! – ele insistiu.

– Asas, são asas! – ele apertou os olhos com os dedos e se jogou para trás na cama. E eu tentei não parecer tão surpreendida e deixa-lo ainda mais constrangido. Me aproximei receosa, sentando do seu lado.

– Como pode ser isso? – perguntei, ele estava respirando apressado como se estivesse se esforçando muito.

– Eu não posso explicar por que isso está acontecendo... – ele mordeu o punho fechado. – Mas dói Amber, dói muito. Tentei cortar e no começo deu certo, mas a dor estava me levando a loucura. Entendi o porquê da morfina e naquele momento se eu tivesse coragem, eu o teria abraçado, mas temi que isso o assustasse e ele me mandasse embora, pra sempre. Ele precisava de uma amiga, alguém com quem contar.

– Você não quer ir ao médico? – perguntei me sentindo uma traidora, afinal eu mesma odiava ir ao médico.

– Não quero ser transformado em uma aberração. Não quero gente achando que sou um...

– Um anjo!? – completei.

– Sim, um anjo. Consegue imaginar? Eu sou o filho do reverendo, quer algo mais clichê que isso? – ele tinha motivos para não querer que ninguém soubesse bem convincentes.

– O que você vai fazer?

– Eu não sei. – ele se sentou na cama e ficamos bem próximos um do outro.

– Você não pode contar isso a ninguém Amber. Prometa pra mim que não vai contar nem pra sua tia! – ele segurou meu rosto quando desviei seu olhar, ficou com a mão no meu queixo me fazendo o olhar nos olhos dele.

– Eu prometo. – seus lábios estavam tão próximo, que eu senti um formigar nos meus, como se fosse a atração entre imãs quando postos muito perto um do outro, seus lábios eram convidativos e ele tinha cheiro de bala de laranja.

Me afastei dele repetindo internamente; Ele quer uma amiga.

A porta do quarto dele abriu e o reverendo Cicero apareceu. Ele ficou visivelmente surpreso comigo ali.

– Oh, Amber, prazer em vê-la. Filho? – Will travou, acho que o estoque de mentiras dele deve ter se esgotado com o pai dele, então assumi.

– Olá Reverendo. Will está me passando a matéria que eu perdi por conta do acidente. – ele pareceu aceitar isso muito bem.

– Ah claro, eu soube. Como você está?

– Estou bem, quase nova em folha. – olhei para Will e ele parecia agradecer com os olhos.

– Espero que não tenha nenhum problema por eu ter vindo. – falei o mais docemente possível. – De maneira nenhuma Amber, você é bem vida aqui! – ele olhou para Will e parecia estar vendo-o de forma diferente agora.

– Vou deixar vocês terminarem... – ele abriu toda a porta e puxou um dos pares de tênis do Will para apoiar e mantê-la aberta. Olhou para o Will e apontou para a porta como se dissesse: "Deixe a porta aberta! "

– E dá uma arrumada no quarto Will! – Will acenou para ele como se estivesse acatando um conselho. Quando ficamos sozinhos Will sorria de um jeito capcioso.

– Você acabou de mentir por mim. Estou em debito de com você a um bom tempo, que tal igualarmos um pouco.

– Como?

– Hmm, você me diz algo sobre você e talvez um dia eu te devolva um favor. – estava apoiando o corpo no braço esquerdo na cama, Will alisou com seu indicador a unha do meu dedo que estava na cama, levemente.

– Passei quase dois anos em coma. – falei tão rápido e fácil que fiquei surpresa comigo mesma.

– Um acidente que me causou isso... – peguei sua mão e levei até minha cabeça, do lado direito, onde era possível sentir a falha que a cicatriz causou.

– Minha casa pegou fogo e eu sofri um traumatismo. – esperei ele administrar a informação. Soltei a mão dele, mas ele continuou com ela no meu cabelo.

– Meus pais morreram e eu não me lembro deles, não me lembro de nada. Não tenho nenhuma lembrança do acidente nem antes dele. – lagrimas quentes, que pareciam queimar meu rosto desceram lentamente. Will afagou meu cabelo e me puxou para mais perto, vi seus lábios se juntarem e senti um calafrio na barriga, ele estava chegando mais perto do meu rosto e eu engoli a bola de gelo que parecia tomar meu corpo.

Fechei os olhos e esperei até o momento que ele iria tocar meus lábios, mas, ele beijou minhas bochechas, quando abri os olhos me sentia decepcionada e surpresa.

– Minha mãe me dizia que cada lagrima beijada equivale a um diamante. – sussurrou ele.

–Vou te fazer um rapaz rico logo. –respondi e rimos juntos.

ClepsidraOnde histórias criam vida. Descubra agora