Voltei ao colégio só para buscar Amber e fazer de conta que fui a aula, do contrário a Sra. Mirian poderia comentar com meu pai que eu não fui ao colégio. E como eu estava na entrada do colégio, quando ela apareceu em seu fusca azul para buscar a sobrinha, fiquei a salvo e livre da função babá, por hoje. Amber iria ficar com a tia na La Dulce hoje.
Estava começando a ficar constrangedor comprar analgésicos. Só temos uma farmácia na cidade, então quando o Sr. Kleber começou a fazer caras e bocas quando eu aparecia para comprar mais analgésicos achei melhor desviar a atenção por um tempo, antes que um comentário dele ao meu pai se torne um conversa reveladora. Passei a procurar analgésicos em outros lugares e um que pareceu indiferente a quantidade que compro é o Bar do Garret, lugar estranho para conseguir analgésico eu pensei, mas o velho dono do bar, não faz perguntas, nem cara feia.
A primeira vez que estive lá, encontrei o velho Garret esfregando o balcão com um pano tão imundo que não sei porque ele se dava o trabalho, talvez fosse algum cacoete adquirido por anos atrás daquele balcão. Já estava careca na parte de cima da cabeça e com os fios quase todos brancos, incluindo os das sobrancelhas. Sem pescoço, corpulento; se movia gracioso como um hipopótamo. Parei próximo do balcão, e olhei para o velho Garret, ele me olhou de volta sem dizer nada e ficamos assim por um tempo, até que um homem alto vestindo camisa xadrez vermelha entrou no bar, acenou para ele dizendo: – Uma "maaarvada" Garret! – O velho Garret me olhou e ergueu as sobrancelhas como se dissesse: Aprendeu? E se virou para servir a bebida do homem que chegou. Quando ele se voltou para mim novamente eu disse: – Um analgéeeeesico Garret! – Falei no mesmo tom que o homem de xadrez e me senti um bobo por isso. O velho Garret pareceu achar engraçado, ele fez um grunhido que pareceu ser sua risada. Paguei a cartela de analgésico e sai.
Hoje chegando ao Bar do Garret há uma enorme roda de trator recostada do lado de fora, um banco de madeira tão gasto que não sei se é azul ou verde, uma grande janela com três faces que se projetam para fora do prumo da construção, com vidros cobertos por uma grossa camada de poeira que impede de se ver o interior do bar, a porta larga aberta para o interior mal iluminado. Ao entrar, meu nariz nem se importou mais com o cheiro de bituca de cigarro e mofo. Acenei para Nando, o cliente mais fiel do bar, é o primeiro a chegar e último a sair. Me sentei ao balcão, o velho Garret acenou com as sobrancelhas quando me viu. Eu nunca fui de fazer hora por lá, mas hoje eu não tinha nada para fazer a não ser tomar meus analgésicos, ignorar a dor e o queimar nas costas.
– Hoje quero uma bebida Garret! – Falei com a mão espalmada sobre o balcão. O velho Garret pareceu surpreso, mais ainda do que quando apareci no bar tão tarde da noite e afoito, que ele até ameaçou sair de trás do balcão antes de eu dizer que estava bem.
Ele me encarou por um momento. – Você já tem 18 anos? – Eu podia ter dito que sim, mas balancei a cabeça em negativo. – Então nada de bebida para você, rapaz! – Ele fungou com o nariz como se estivesse impondo o ponto final. – Uma tubaína então. –Falei e ele balançou a cabeça concordando, colocando uma garrafa de vidro sobre o balcão e abrindo com a outra mão, pegou um saco plástico transparente e despejou dentro, colocou um canudo na abertura e me entregou. Fiquei surpreso com a forma de servir o refrigerante. – Era assim que se servia antigamente, meu pai fazia desse jeito...E evitava que os moleques levassem as garrafas embora. –pretendia um dia perguntar sobre seu pai, todos na cidade o chamavam de louco. Ele alegava haver uma criatura horrível vivendo na Casa Grande é como chamamos a casa que fica a oeste de Lopes entre a ribanceira, acima do bosques de Groveste, a casa do homem mais rico da cidade. Foi nesse momento que Jonas entrou mancando da perna, produzia uma batida dura no assoalho de madeira a cada passo. Parou no balcão e pediu Rum. Sorriu ao me ver, ergueu seu copo como se estivesse brindando comigo a distância.
Eu o conhecia, porque sua esposa frequentava minha casa, ia a igreja, escutava suas lamentações ao meu pai sobre seu marido desregrado. A princípio achei que não iriam me querer por ali por ser o filho do reverendo, mas depois que eu percebi que ninguém iria me delatar e eu tinha onde comprar meus analgésicos, continuei voltando. Eu só precisava continuar a ignorar que eles estavam por ali quando deviam ir à igreja nos domingos.
– Hoje vai chover como a muito tempo não víamos em Lopez, não essa coisa mirrada. Falo de aguaceiro de verdade. – Jonas anunciou para o bar, segurando seu copo com certa arrogância por ter tal conhecimento dos demais. O velho Garret jogou o pano encardido no ombro e grunhiu sua risada. – Não acreditam em mim? – Se indignou Jonas. – Eu sei o que falo, meu joelho dói. – E apontou para o próprio joelho como se por si só já falasse tudo.
Um silencio pairou no bar e Jonas estufou o peito cheio de si.
Até que alguém gritou: "Chove lá fora, aqui dentro só pinga" E todos começaram a rir até bater nas mesas.
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Clepsidra
FantasyAssim como as ampulhetas antigamente e os ponteiros de hoje em dia, Clepsidra marca a era de uma antiga rixa, as previas de uma guerra. O tempo está escorrendo. Will é um adolescente aparentemente comum, que vive com o pai, o Reverendo Cicero nu...