Capítulo 8 - MARKUS

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     Os sons da floresta me mantinham alerta enquanto eu a observava dormir. Syrena estava próxima à fogueira enrolada em um grosso cobertor enquanto dormia profundamente. Era difícil de acreditar que tinha sobrevivido cinco dias sozinha (não completamente pois eu sempre estava à espreita) nunca tendo saído do castelo. Pelo que soube naqueles poucos dias que passei lá, ela não passava de uma florzinha de estufa da rainha, sempre agarrada a barra das suas saias. Até aí estava tudo normal, os empregados encaravam aquilo como um consolo a rainha por ela não conseguir dar herdeiros a Marklon. Porém a verdade foi exposta algumas semanas atrás e agora o verdadeiro motivo de todo aquele zelo e segredo foram exposto. Syrena não era uma protegida, era uma refugiada. Ou aos meus olhos, uma arma.

     Até que o velho Marklon foi esperto. Matou vários coelhos com uma única cajadada. Redimiu minimamente sua honra para com os inocentes massacrados de Cyrin, resolveu por hora seu problema com a infertilidade da rainha e ainda por cima conseguiu uma arma poderosa sem saber. Eu já tinha visto do que aquela garota franzina era capaz, estava no salão de festas quando ela jogou para longe um dos cavaleiros do rei. Vi o fogo da ira e da guerra brilhando naqueles olhos os quais eu ainda não sabia distinguir a cor certa (algo entre azul, verde e âmbar) e não deixava de imaginar o que ela poderia fazer em um campo de guerra de algum treinamento. Mas obviamente o velho Marklon jamais permitiria. Tanto que quando o encontraram preso a própria alcova por algum feitiço daquela bruxinha, sua única preocupação era que trouxessem a garota de volta ao castelo antes que algo de mal lhe acontecesse.

     Admito que me ofereci para busca-la. E fiz isso porque precisava saber qual era o mistério daquela garota. Me intrigava sua valentia em sair do palácio sem conhecer o mundo exterior, de ir a uma cidade desconhecida tentar um acordo de paz a favor do povo que dizimou seus semelhantes quando poderia simplesmente se juntar aos inimigos e reduzir Ilíria a pó. Eu não me importaria nem com um, muito menos com outro. Não existia nada naquela cidade que me prendesse, e o povo de Bloodworth não me incomodava desde que não cruzassem o meu caminho.

     Syrena se remexeu em seu sono e franziu a testa. As sobrancelhas levemente arqueadas se juntaram até que um pequeno "V" se formasse entre elas. Não pude deixar de observar as tatuagens na sua testa. Eram chamativas demais, o que dificultaria passarmos despercebidos pelo caminho até Bloodworth.

     Suspirei e ergui a cabeça. Ainda não acreditava que tinha concordado em leva-la até aquele lugar. Era uma causa perdida. Bloodworth era um povo muito recluso segundo soube, e muito agressivo também. Conversar era uma perda de tempo.

     Pensar que aquela bruxinha estava causando uma guerra chegava a ser hilário, mas essa é a graça no sexo oposto. São tão frias quanto gelo, tão traiçoeiras quanto cobras e podem destruir uma ida ou muitas. Isso eu tinha experiência em afirmar. Nada de bom vinha desses seres, e há quem diz que nem o que levam entre as pernas vale a pena tanta dor de cabeça. Eu sou hipócrita para falar algo pois não consigo ficar muito tempo sem uma dessas criaturas detestáveis na minha cama. Cada um expulsa a tensão do corpo de um jeito, e esse é o que eu escolhi para mim. Ao menos elas me servem para algo que não seja acabar com a minha paciência como aquela que estava dormindo a luz do luar. Não cometeria o mesmo erro duas vezes, tinha a cicatriz para me lembrar de não fazê-lo.

     Frida... O nome ecoou na minha mente e me deixou um gosto amargo na boca. Fazia muito tempo que não pensava naquela meretriz dos infernos mas volta e meia ela voltava para me perturbar. Como um lembrete da minha fraqueza. Tive que sacudir a cabeça algumas vezes para limpar a mente e ficar alerta ás coisas ao meu redor.

     Ainda se passou mais um tempo antes que eu me levantasse, fizesse uma varredoura ao redor do acampamento e partisse para o vilarejo mais próximo atrás de coisas cruciais para a viagem.

     Seriam longos dias dali para frente.

A Bruxa - EM REVISÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora