Eu estive procurando por você

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93 dias antes.

-Caixa postal de novo! – Rafaela disse soltando o celular e deitando na cama de Marina. A loira estava em pé andando de um lado para o outro enquanto trocava mensagens com Eli. Luana não aparecia na escola a alguns dias e, quando ela e Rafaela passaram casualmente na casa dela no caminho para a aula mais cedo, o pai dela tinha dito que ela já saíra de casa. Nenhuma das garotas comentou que a amiga estava indo para algum lugar que não era a escola, apenas se limitaram a sorrir e fingir que estava tudo certo.

-Ok, Eli falou com alguns amigos e aparentemente não teve nenhum incidente em nenhuma festa ou bar com alguém com a descrição da Luana – Marina comentou enquanto lia o celular –Onde você acha que ela pode estar?

-Não faço ideia – Rafa respondeu cansada, eram coisas demais acontecendo nos últimos dias tanto para ela quanto para Marina e agora Luana tinha arrumado mais um problema para elas –Que merda... Eu não tenho cabeça pra continuar com isso agora...

Marina se sentou na beira da cama enquanto a amiga esfregava a têmpora.

-Quer conversar sobre a sua mãe? É uma coisa bem pesada pra aguentar sozinha...

-Não quero, Marina – Rafa respondeu com calma –Você tem seus próprios problemas, eu consigo lidar com isso sozinha... Mas temos que achar Luana, quem sabe o que ela deve estar fazendo...

-Realmente – a loira concordou –O que acha que ela está fazendo enquanto deveria estar na escola?

-Não faço a mínima ideia mas aposto minha vida como coisa boa não é.

***

Luana olhava as fotos que colocara nas paredes há muitos anos, logo que encontrara a casa na árvore. Fotos da sua família, na época em que ainda eram uma família de fato, fotos suas de quando era criança, na escola, com Marina e Rafaela, com outros amigos dos quais já se distanciara havia tempo... Era estranho a sensação de olhar aquelas coisas, parecia que já havia se passado mil anos, que cada ano que passava ela envelhecia mais do que apenas alguns meses.

"E ainda assim continuo lutando com os mesmos problemas", pensou mas logo afastou o pensamento. Não queria voltar a ter aqueles surtos que tivera no último dia e sentia que essa sua crise já estava passando, como tantas outras que já teve.

"Marina e Rafaela devem estar loucas, só espero que não tenham feito nada demais como ir até minha casa e alarmar meu pai. Ele acha que estou indo assistir às aulas e, por mais que eu odeie chegar todos os dias em casa e ter que fingir ter ido pra escola, preciso que ele continue pensando isso. Mas acho que talvez eu vá pra escola amanhã, vou ter que enfrentar a ira das meninas alguma hora..."

Ao ver que já estava anoitecendo, Luana pegou suas coisas, colocou suas tudo na mochila e começou a caminhar em direção à sua casa. Não pôde evitar sorrir enquanto caminhava e o sol se punha conforme chegava mais perto, achava engraçado a sensação de ser a única andando por aí sem horário exato para chegar onde queria.

Gostava de observar os pequenos detalhes de por onde andava como por exemplo o lixo na beira da rua ou a forma como as árvores se curvavam com o vento frio do fim da tarde ou como a garota que entrava no carro da esquina esfregava os braços para se aquecer... Luana às vezes sentia como se o mundo fosse uma imensa obra de arte e ela fosse a única capaz de ver toda a beleza que tinha nele apesar de seus problemas, apesar de todos acharem que ela fosse uma ignorante que não ligava para nada... Não, ela se considerava uma artista e como todo bom artista ela era incompreendida.

Ou pelo menos era nisso que queria acreditar. Ela conseguiria suportar a ideia de ser apenas mais uma pessoa comum? Sem nada que a destacasse? Provavelmente não. É por isso que ela tinha inventado a dose violenta de qualquer coisa. Em algum lugar por aí, tinha algo que iria transformá-lo para sempre e ela tinha que achar isso junto com as amigas pois ela sentia que Marina e Rafaela também viam a beleza do mundo. Talvez não com o alcance que ela via mas sabia que elas podiam enxergar e também sabia que elas podiam ser muito mais.

Uma dose violenta de qualquer coisaOnde histórias criam vida. Descubra agora