Capítulo VI - Sonhos despedaçados

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Silêncio.

Um cervo andava despreocupado procurando grama verde e ramos baixos para se alimentar. A brisa balançava levemente as folhas, espalhando o perfume das rosas pelo ar. Nada parecia indicar perigo iminente ou mortal.

Um cenário enganador.

Luxuriah não se atrevia a sair do lugar. Fios do seu cabelo negro se soltaram da trança e caíram sobre seus olhos, mas ela os ignorou. A flecha já estava preparada, o arco retesado. Precisava apenas do anglo ideal e abateria sua presa.

Apenas uma oportunidade. Teria apenas uma oportunidade.

De repente, o vento mudou de direção. A jovem caçadora xingou mentalmente. O cervo levantou a cabeça e farejou o ar. Com medo de perder a presa, atirou imprudentemente, rezando para que o anglo estivesse certo. A flecha saiu cortando o ar com um zumbido fraco, mas não encontrou a carne tenra da presa, e sim se meteu entre as pedras próximas ao animal. O cervo, sentindo agora a ameaça, saiu galopando na direção oposta a que Luxuriah estava.

Praguejando, ela tirou os cabelos dos olhos, saiu de seu esconderijo e pôs-se a perseguir a presa o mais rápido que pôde. Enquanto corria, atirava uma flecha atrás da outra, todavia o animal era veloz e foi ganhando distância. Naquele momento, o som de uma flecha zumbiu próximo ao seu ouvido, e cortou o ar até o cervo. A flecha acertou o animal em cheio, que cambaleou e caiu morto na mesma hora.

Um gemido de frustração saiu da boca da jovem elfa. Era o segundo animal que perdia naquele dia.

- Você precisa se concentrar mais. – ouviu uma voz grave falar.

Um elfo sangrento saiu de seu esconderijo entre as árvores. Trazia um imenso arco na mão e vinha sendo seguido de perto por um tigre tão branco quanto a neve. Seus passos eram tão leves que não se ouvia nada mesmo quando ele caminhou sobre o chão coberto de folhas secas. Seus cabelos eram negros e longos e voavam soltos ao redor de seu rosto. Luxuriah fez uma careta quando ele seaproximou.

- Eu estava quase o pegando. – disse levantando o queixo, desafiadora – Você me atrapalhou.

O elfo a olhou intrigado. Ele era imenso, muito mais alto que Luxuriah e a analisou por um momento antes de cair na gargalhada.

- Você é uma péssima mentirosa Lulu! - e foi em direção à presa morta.

- Já falei para não me chamar de Lulu!- disse ela revoltada, seguindo-o – Eu não sou mais um bebê, pai!

- O quê? Você falou alguma coisa Lulu? – perguntou ele singelamente enquanto se ajoelhava ao lado do cervo e arrancava a flecha – Acho que os guardas do portão da cidade não ouviram seu grito.

Enquanto ela praguejava, ele ria. Por fim, Luxuriah desatou a rir também. Não adiantava reclamar com seu pai, só faria com que ele a provocasse ainda mais. Por fim, se dando por vencida, se ajoelhou ao lado dele, enquanto ele analisava o animal abatido.

- Sem traços de peste. – disse seu pai aliviado – Acho que vamos jantar bem esses dias. – brincou passando rapidamente o dedo sujo de sangue no nariz da filha.

- Eca pai! – gritou Luxuriah limpando rapidamente o sangue – Ainda deixo de caçar com você!

- Duvido, você me ama! – e disparou a rir – Você é igual a sua mãe, ela vive dizendo que vai me deixar se eu não parar de deixar as flechas espalhadas no chão da casa...

Ambos se olharam e riram. Luxuriah sempre se sentia a pessoa mais feliz do mundo quando estava ao lado de seu pai. Mesmo em tempos difíceis como aqueles em que viviam, ele nunca deixara de ser confiante e bem humorado. A resposta disso estava ali, no cervo abatido. Muitos já tinham deixado de caçar na Floresta do Canto Eterno, desde que o flagelo corrompera aquelas terras. Porém, seu pai dizia que não deviam desistir nunca de procurar um animal saudável, que isso era como desistir de seu lar. A jovem olhou o animal morto aos seus pés. Adorava quando o pai provava que estava certo.

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