Linhas Paralelas

Aries

"Somos castigados por nossas renúncias. Cada impulso que tentamos aniquilar germina em nossa mente e nos envenena.
O único meio de livrar-se de uma tentação é ceder a ela. Se lhe resistirmos, as nossas almas ficarão doentes, desejando coisas que se proibiram a si mesmas, e, além disso, sentirão desejo por aquilo que umas leis monstruosas fizeram monstruoso e proibido. "

(Oscar Wilde)

Kylo Ren e Rey dividiam agora uma imperial shuttle e isso necessariamente significava que não possuíam armas, estavam em uma nave de transporte e não de guerra. Exatamente por isso, Kylo estava muito focado em pilotar para evitar tanto as investidas da Primeira Ordem quanto dos Rebeldes, por enquanto essa estratégia estava se mostrando eficiente, não é tão difícil desertar ainda que ao se afastarem da batalha sentiam, ambos, uma mistura de calmaria e culpa. Ambos traíram aquilo que defendiam e deixaram tudo para trás em busca de respostas que talvez não existissem.

"Você não é nada para eles, mas é para mim"

Isso era tudo que Rey conseguia pensar enquanto se afastavam da batalha e adentravam uma zona segura, tal frase dita por Ben Solo se misturava também com todas as outras coisas que havia ouvido e reconhecia como verdade "vendida como escrava em troca de bebida" . Kylo Ren podia sentir que a conexão com Rey ainda estava ativa, a morte de Snoke havia enfraquecido o elo, porém não quebrado; a persistência da conexão fazia o Cavaleiro captar os pensamentos mais persistentes de Rey; agora que estavam tão perto o esforço já não era tão grande.

-Precisamos pousar, não temos muito combustível e se entrarmos na velocidade da luz agora talvez possam nos detectar - Garantiu Rey vendo os controles.

-Vamos o quão longe conseguirmos, pousamos, trocamos a nave por outra segura e seguimos para outro local - Confirmou Kylo Ren.

Rey sentiu um frio na espinha no momento em que ele falou. A garota nunca se acostumava com a voz sombria e com os gestos introspectivos dos Cavaleiros de Ren, ambos permaneciam como nos momentos em que se conectavam através da força e viam um ao outro: distantes ainda que próximos. A garota foi até o vestiário da nave, pegou uma capa de cor azul marinho e a colocou como uma forma de se ocultar já que suas roupas estavam parcialmente rasgadas e podia sentir que sangrava. O conflito na sala de Snoke havia deixado marcas, porém Rey suspeitava que essas eram ainda maiores em Kylo Ren.

O tempo decorreu rapidamente, todos presos em seus próprios conflitos, dores e dúvidas, demorou horas até que Kylo Ren anunciasse que deveriam pousar.

-Jakku é o planeta mais próximo que atende nossas necessidades - Declarou Kylo manipulando o mapa holográfico - Não podemos avançar mais.

-Não posso retornar para Jakku - Disse Rey se sentando na cadeira ao lado o Cavaleiro com os olhos arregalados - Eu fui vendida como escrava por bebida, não há nada naquele planeta que não seja controlado por aqueles que me comparam.

Kylo Ren conhecia muito parcialmente a memórias recentes de Rey e sobre as antigas apenas tinha posse daquelas que revelavam o terrível destino que os pais a condenaram ainda na infância. Sobre os tempos de adulta em Jakku, Kylo sabia o básico: uma catadora de sucata que todos os dias recuperava peças, as limpava e as trocava por comida e roupas. Foi então que compreendeu com mais clareza que Rey parecia ser livre em uma imensidão desértica porque nenhum dos escravos tinha conhecimentos ou oportunidade de fugir, ou seja, eram livres para buscar sucata, para dormir onde queriam porém sempre tinham de voltar para seus donos para que conseguissem sobreviver conseguindo água, comida e roupas.

-Essa pode ser sua chance Rey - Disse Kylo hesitando brevemente para evitar dizer "sucateira". - Compre sua liberdade.

A garota sabia que a shuttle imperial continha moedas, dinheiro e créditos valiosos para toda a galáxia. Sabia que aquilo que havia na nave era mais do que o suficiente para se viver três vidas inteiras em completo luxo e talvez por isso Rey tenha abaixado os próprios olhos encarando as mãos feridas.