- É o máximo ser uma ideia que agrada à todos, a pergunta é: a que custo?Pouco o garoto cruza a porta e o Pierre já toma a frente da coisa, espreitando o JP com atrocidade, os olhos fumegantes e a fala carregada de uma obstinação incontrolável:
- O QUE DEU EM VOCÊ PRA SAIR FAZENDO AQUELAS MERDAS CARA?! FICOU MALUCO?
- Pierre... – tento novamente, mas ele interrompe, me mantendo distante:
- NÃO! FICA NA SUA AI! AGORA ELE VAI FALAR TUDO! – esbraveja.
JP não parece nem um pouco confortável na posição em que se encontra. De um lado, a parede, do outro, o punho cerrado do Pierre, que insistentemente requer sua resposta, ele engole em seco, perdido em meio as acusações:
- Olha aqui... – Pierre prossegue, irredutível e ameaçador, porém, atenuando o som da sua voz para soar mais sensato. – Eu juro que minha vontade agora é de quebrar a tua cara. Mas eu não vou fazer isso, e não é por você não, é pelo Ben, da última vez em que brigamos ele entrou em pânico e passou mal, então, se você quiser que as coisas se resolvam com o pouquinho de calma que ainda me resta, acho bom começar a falar tudinho, desde o começo!
- BELEZA! – Ele dá o braço a torcer, insatisfeito. – Mas a reunião tá incompleta, quer dizer, se você acha mesmo que eu sou o único responsável por isso, tá muito enganado.
- JÁ SABEMOS DO RESTO, O QUARTETO DA REPROVAÇÃO! – Disparo, atraindo suas atenções para mim. – EM PENSAR QUE VOCÊ ESTAVA ALI O TEMPO TODO! NAS AULAS, NOS CORREDORES, ME OLHANDO COM DEBOCHE, RINDO DA MINHA DESGRAÇA E SE DIVERTINDO DELA, SEU MONSTRO ARDILOSO E PODRE!
Quando termino, mal consigo acreditar que botei tudo pra fora, regurgitei todos os sentimentos ácidos e viscerais que mantive guardado todo esse tempo, sinto uma espécie de alívio imediato nisso, mas é incomum experimentar esse Pedro, um Pedro enraivecido, descontente, inflamável e pronto para fazer justiça, os olhos ardendo em brasa:
- EU TE AJUDEI! TEM SORTE DE EU TER ESTADO LÁ. – Vocifera. – ALIÁS, É UMA PENA TERMOS CHEGADO TÃO CEDO, UM POUQUINHO MAIS E SABERÍAMOS QUEM AQUI ANDA "AMAMENTANDO" OS VEADINHOS DO COLÉGIO, SE É QUE ME ENTENDE.
Sua fala é carregada de ironia e deboche, como se, mesmo sendo a vítima das acusações, ainda fosse capaz de apontar em cada um de nós nossos aspectos mais nefastos e profanos, tudo para aliviar o peso da culpa em si:
- POR QUÊ VOCÊ FEZ ISSO!? POR QUÊ TÁ AGINDO ASSIM? – Pierre indaga, tá na cara que tudo para ele é tão novo e inesperado o quanto é para mim, esse é um aspecto da personalidade do JP que nenhum de nós conhecíamos até o dado momento.
Ele ri, infame:
- FALA SÉRIO, QUER DIZER QUE SÓ VOCÊ QUEM PODE SAIR POR AI PEGADO OS SEGREDOS PODRES DOS OUTROS CARAS E TIRANDO UMA GRANA ENCIMA DISSO? PÕE AS COISAS NA BALANÇA CARA, TEM CULPA O SUFICIENTE PARA DISTRIBUIR PRA TODO MUNDO AQUI.
- É DIFERENTE! – Pierre retruca, relutando em controlar seus impulsos de briga. – VOCÊ SABE QUE NÃO SÃO TODOS, MEUS ALVOS SÃO SEMPRE OS PANACAS METIDOS A BESTA, QUE SE ACHAM OS DONOS DISSO AQUI.
- CLARO... – resmunga. – E VOCÊ SERIA O VERDADEIRO DEUS? DECIDINDO QUEM MEREÇE OU NÃO SER PENALIZADO? DEIXA EU TE DIZER UMA COISA: FOI EXATAMENTE O QUE FIZEMOS, TODOS OS QUE FORAM EXPOSTOS LÁ TEM CULPA NO CARTÓRIO, OU SERÁ QUE EU ESTOU ERRADO?
Nojo, é só o que consigo sentir diante das suas afirmações tóxicas, Pierre parece perdido, como se tivesse caído em sua grande teia de palavras ilusórias e falsas pretensões:
- Tá invertendo as coisas! – rosno. – Para fazer com que nos sintamos culpados.
Ele se volta a mim, zangado:
- AGRADEÇA POR EU NÃO TER ACHADO NENHUMA FITA SUA SEU VIADINHO DE MERDA, OU VOCÊ ESTARIA LÁ NO MURO HÁ MUITO TEMPO, EU PENSEI EM EXPOR VOCÊ LÁ, MAS SABE PORQUE NÃO FIZ? VOCÊ JÁ É GAY! TODOS AQUI SABEM SOBRE VOCÊ! EU PRECISAVA DE MAIS, PRECISAVA DE UMA FITA SUA SE ENVOLVENDO COM UM DOS CARAS, ENTÃO PODEMOS DIZER QUE VOCÊ É UM GAYZINHO DE SORTE.
Nesse momento o Pierre explode, incapaz de controlar os nervos mais um segundo sequer, ele toma o JP pelo colarinho e logo em seguida o atira ao chão com brutalidade, lançando as palavras furiosamente:
- VOCÊ TEM ATÉ HOJE A NOITE PARA RESOLVER ISSO POR CONTA PRÓPRIA, SE NÃO FIZER, EU MESMO IREI NA SALA DO DIRETOR, E POUCO ME IMPORTA SE SEREI EXPULSO PELO TÚNEL OU PELAS GRAVAÇÕES, COM TANTO QUE EU TE LEVE JUNTO, SAIO DAQUI SATISFEITO, SEU DESGRAÇADO. EU REALMENTE NÃO SEI COMO ACREDITAMOS QUE VOCÊ FAZ PARTE DA NOSSA IRMANDADE, LÁ VOCÊS TÊM ATÉ TÍTULO, ENTÃO SE É ISSO QUE QUER, CONTINUAR REPROVANDO JUNTO COM ELES, PODE PEGAR SUAS COISAS E VAZAR DAQUI HOJE MESMO.
Ele ouve atentamente, e agora posso ver que está meio amedrontado, não pela postura dura do Pierre, tampouco pela autoria parte dos atos maléficos, mas pela eminente possibilidade de uma saída, de se desfazer do seu grupo, não sei se as coisas teriam sido diferentes se eles estivessem chegado antes, mas embora eu não tenha conhecido o JP, sei que ele chegou um ano antes, mas que reprovou junto aos outros componentes do bando, o que lhes deu o famigerado apelido de "quarteto da reprovação".
JP se ergue e deixa o dormitório sem sequer nos lançar um último olhar, ele segue impassível, e nenhum de nós sabe ao certo o que fará daqui em diante, é tudo uma incógnita. Quando bate a porta estrondosamente, nos deixando á sós, deslizo até o sofá, surpreso e com mais uma dúvida martelando em minha mente, algo que não posso deixar passar:
- Pierre... – reflito. - Tem uma coisa nisso tudo que chamou minha atenção.
- Diz.
- O JP, ele disse que foi sorte minha não ter achado nenhuma fita com gravações comprometedoras, mas eu sei que existe, você mesmo me mostrou a gravação daquela noite, quando eu reconheci o Tómas.
- Não existe mais.
- O que você fez?
- Eu destruí. É como eu disse, eu posso ser o maior pilantra, mas jamais faria algo para prejudicar um inocente, e embora o Tómas seja um puta de um mané, você é gente boa. Algum dia desses eu bolo algum plano que só dê ruim para ele.
Respiro fundo, sem saber ao certo se tudo isso é bom ou ruim, então brinco com uma hipótese impossível:
- Um dia vocês ainda serão amigos e irão dividir a mesma mesa no refeitório...
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O Capítulo do Pedro (Spin-off Alojamento dos Héteros)
RomanceAntes do 211, da paradise e dos inúmeros eventos que procederam a chegada do Alexei ao São Vicente, existia o Pedro; recluso, antisocial e preso as amarras da timidez, ciente de que estaria fadado a não ter alguém durante toda sua existência, o garo...