Capítulo 22 | PARANÓIAS

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- Uma descoberta incrível é, com frequência, o prenúncio de uma desgraça...

Assim que o Tomás deixa o dormitório (se certificando de que não será visto) tenho vontade de gritar, estou exultante e sinto cada músculo meu se contorcer numa euforia contida, me lanço sobre o colchão, tirando a chave do bolso e apertando contra...

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Assim que o Tomás deixa o dormitório (se certificando de que não será visto) tenho vontade de gritar, estou exultante e sinto cada músculo meu se contorcer numa euforia contida, me lanço sobre o colchão, tirando a chave do bolso e apertando contra o peito, respiro fundo, aliviado, porque de uma hora para a outra, tudo parece estar voltando aos eixos. Mas, embora as coisas estejam indo bem, ainda me intriga o fato de o Tómas abrir o jogo para o Boca sem pensar na própria imagem, o que me leva a pensar se não há algo a mais, e é com essa pulga atrás da orelha que sigo para o segundo turno das aulas, empolgado e intrigado...

A aula de geografia seria o momento mais oportuno para fazer minha abordagem, mas, infelizmente, o Boca não está presente, dentre todos os hábitos que ele desenvolveu após integrar o grupo do Tómas, matar aulas é o mais frequente, não deixo de me preocupar, com ambos, pois sei o preço a se pagar por cada aula perdida, e assim como eu, tenho certeza absoluta que nenhum deles deseja permanecer aqui por mais tempo que o necessário.

Quando eu o encontro, as aulas do dia já terminaram e estou voltando ao 107, ele está acompanhado dos outros capachos do Tómas, mas, como o mesmo não se encontra presente, não vejo problemas em abordá-lo, me aproximo, e todos os olhares do grupo se voltam á mim, como se eu fosse um corpo estranho ali, uma bactéria que deseja se instalar num organismo e trazer desgraças para o hospedeiro:

- Preciso falar com você. - Vou direto ao ponto, tentando me manter alheio a todo o resto. Boca assente, dispensando o grupinho com um breve balançar de cabeça, eles saem, me lançando olhares pretenciosos e se encarregando de me intimidar com seus risinhos zombeteiros e as vozinhas afinadas propositalmente enquanto murmuram gracejos:

- Não podia esperar que eu chegasse no dormitório? - indaga, descontente. - Já é ruim ter de aturá-los soltando gracinhas porquê eu divido o quarto com você...

Reviro os olhos, já era de se imaginar:

- De um modo estranho, isso não me surpreende... - afirmo. - Mais surpresos ficariam eles ao saber que eu tenho um caso com o líder do bando.

Ele olha para os lados, receoso:

- Você não devia sair por ai falando essas coisas! - esbraveja. - Existe muito mais coisas em jogo aqui do que o seu "caso" com o Tómas.

- É por isso que estou aqui. - Declaro. - Preciso saber do acordo que fez com o Tómas, e porquê ele não parece se preocupar nem um pouco com o fato de você saber o que ele faz comigo.

Ele ri, irônico e impaciente:

- Pouco me importa se você chupa o pau dele quando ninguém tá vendo! Você deveria aceitar as coisas como estão ao invés de seguir essas paranoias.

- Está errado. - Contraponho. - Andar com o Tomás fez você subir alguns degraus na cadeia social do São-Vicente e lhe trouxe alguns privilégios, mas não pode ser só isso, eu vi e ouvi! Vocês brigaram feio e agora estão aí como se nada tivesse acontecido. Piedade não é o forte do Tómas, ele está sempre tentando retalhar quem quer que o contrarie.

Ele respira fundo, incapaz de se opor as minhas afirmações, soterrado pelas verdades incontestáveis que eu disse:

- Tá legal... - concorda. - Ele já deve ter lhe dado a chave reserva, o que é mais do que ele já fez por muita mina, e como deve ter sido bastante claro, nada de achar que pode entrar lá quando bem entender...

- Fui advertido, prossiga.

- A minha parte do acordo consiste em ficar de olho em você (acredite se quiser), e te falar isso coloca a minha cabeça no centro da forca.

- Mas porquê o Tómas faria isso?

- Ele acha que você se envolve com outros caras.

É inevitável não pensar no Pierre, ainda que ele sequer seja uma hipótese a se considerar, e saber que apesar de todo o meu amor por ele ainda existem tais suspeitas direcionadas a mim é um tanto entristecedor:

- M-mas e você? Porquê aceitou? Porquê está sempre acatando com as decisões do Tómas?

Outro riso irônico:

- Porquê você deu sorte, ele te considera a espécie de "mulherzinha" dele, isso te livra de muita coisa. O Tómas pensa duas vezes antes de bater em você, acha que ele tem piedade de nós? Ele cai matando! Eu sabia os riscos que iria correr, e até os aceito, desde que eu continue jogando no time, sentando na melhor mesa no refeitório e tendo a proteção dos outros caras.

- Não pode ser só isso. - Prossigo, ávido pela verdade que ele insiste em manter para si. - Tem de haver mais alguma coisa, algo que os faça, todos vocês, submissos ao Tómas, escravos da suas vontad...

- Chega! - Ele grita, me tomando pelo braço sem se preocupar com os meninos que no momento cruzam o corredor, suas mãos firmes pressionando o meu antebraço é apavorante, mas sou pego de surpresa ao ouvir a voz de um dos meninos atrás de nós, que coincidentemente é a mesma que eu ouvi quando sofri os ataques, era o único dentre os quatro que insistia para que os outros parassem com as agressões. Me desvencilho do Boca, virando bem a tempo de perceber que se trata de um dos garotos com quem o Pierre divide o quarto, nunca fizemos aula juntos, tampouco sei o seu nome, mas sem dúvida, o seu apelido é JP, um dos integrantes do quarteto da rep...

- QUARTETO DA REPROVAÇÃO! - exclamo, deixando o Boca completamente confuso. - É isso! "quarteto", "quatro", foram eles! Foram eles que fizeram aquilo comigo!

- Do que você tá fal...

- Depois nós terminamos! - asseguro, saindo às pressas. - eu preciso falar com o Pierre!

 - eu preciso falar com o Pierre!

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O Capítulo do Pedro (Spin-off Alojamento dos Héteros)Onde histórias criam vida. Descubra agora