As paredes do seu quarto testemunharam seu choro copioso severamente perturbador. Finalmente descobrira os motivos pela odiosidade de sua mãe e isso provocou uma dor profunda não apenas no seu corpo, ia para além da matéria. Algo necessitava ser feito, contudo Marine não sabia exatamente o quê. Um misto de inúmeras sensações percorria suas veias e atrofiava seu cérebro.
O dia amanhecera, era domingo e pôde ver os fracos raios de sol adentrando pelas frestas das cortinas pretas. Mantinha-se imóvel na cama, resignada a uma amargura praticamente infinda. Ouviu o barulho do carro disparar da garagem e percebeu que estava mais uma vez sozinha, como sempre esteve.
Apanhou o celular na mesa de cabeceira e havia várias mensagens de Susan, decidiu não visualizá-las, não desejava conversar com ninguém, necessitava apenas desaparecer. Seu corpo clamava por água, então precisou levantar.
Desceu devagar as escadas e viu a mesa do jantar, atravessou a cozinha e apanhou um copo quando percebeu que a fraca iluminação solar se transformou em escuridão. Girou para ir até o interruptor quando avistou ao centro da cozinha um homem branco de cabelos escuros até o ombro, vestes surradas e antigas, encarando-a com um olhar perturbadoramente escuro.
A jovem não conseguiu se mover, apenas o copo caiu de seus dedos hesitantes.
Venha para mim — disse ele sem mover os lábios.
Tudo à sua volta transformou-se bruscamente, como se estivesse transportada para outra realidade, outro tempo. Até mesmo o oxigênio era mais denso. Viu-se em meio a grandes paredes rochosas com seis portas ao longo do grande círculo. Havia grama surgindo dessas muralhas e estavam sendo banhadas por um lago silencioso.
O estranho homem surgiu de uma das portas caminhando vagarosamente até a margem. O olhar gélido lhe rompia ao meio, em uma mistura de pavor e hipnose. A expressão facial era indescritível. Assustadoramente, percebeu que seus pés tocavam a água ao centro do lago, o que a levou ao desespero, era como se estivesse pisando em solo firme, não afundava.
— Quem é você? — bradou desesperada.
— Eu sou você — respondeu ele com aquela voz gélida e grave, avançando rapidamente sobre as águas em sua direção.
Marine tentou se mover, em vão. Antes dele tocá-la, fora tragada para o fundo do lago. À medida que afundava, inúmeras imagens de seu pai ensinando-lhe magia quando criança insurgiram, afundava cada vez mais até chegar ao fundo turvo. Engoliu bastante água, precisava respirar, desesperou-se ainda mais quando viu uma jovem moça loira de semblante triste lhe observando. Em seguida, desfragmentou-se, e as águas se tornaram vermelhas.
Tudo girou ao passo que Marine caiu violentamente de costas ao chão da cozinha, completamente molhada, assim como em volta e até mesmo os móveis. Respirou ofegante e com medo, olhando ao redor. Avistou na janela os fortes raios de sol.
Não houve tempo para mais nada além de subir as escadas, apanhar seu aparelho celular, a foto de seu pai que havia encontrado no dia anterior e disparar em seu carro para a casa de Susan, a qual abriu a porta ainda sonolenta e bastante assustada.
Marine adentrou a casa da amiga hesitante e manteve-se paralisada com aquela voz ressoando em seu cérebro congelado. Assim que Susan trouxe as toalhas e se enxugou, sentou-se em uma cadeira na cozinha, perdida entre o real e o impalpável.
Repousou seu olhar difuso na amiga e resumiu a conversa que teve com a mãe na noite anterior, priorizando o que acabara de ocorrer.
— Aquelas paredes, cheias de portas... Aquele homem olhando para mim, vindo na minha direção enquanto eu flutuava naquela água que se tornou sangue. Era como se eu estivesse dentro de um grande labirinto — despejou sobre a amiga, ainda ofegante. — E fui tragada para o fundo.
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ELEMENTAIS vol.1 - Labirinto de Fogo.
Fantasy"A mentira lhe salvou a vida, enquanto a verdade lhe condenará a morte." Após uma evocação quase fatal aos deuses da Magia, os dons de Marine Talbott foram misteriosamente despertados e com isso um passado obscuro trilhado por farsas começará a emer...