Pow.
Meu corpo reage num espasmo inédito. É como se eu recebesse uma carga de energia eloquente, momentânea, capaz de me fazer ver a sombra. Observo aquela maldita sombra outra vez, ela está atrás da mesa com os objetos e eu não consigo abster o medo. Sinto coisas inimagináveis, coisas que não me permitem raciocinar, coisas amargas, quentes e oriundas. Não. Isso não é possível... Quero acreditar que não. Quero acreditar que pode ser a outra chance. Minhas pernas estão formigando, e ao notar isso, me afasto imediatamente dela. Movimento a cabeça em negação, e então abro meus olhos lacrimejados. Quando eu falo "não" com desdém, ela também fala, mas com conformismo.
Um som estrógeno e abafado soou do lado de fora. O grito do Senhor Frederico foi sofredor.
Ouvimos juntos, calados, uma voz. Uma única voz. Um pouco distante, mas suficientemente alta para entendermos que Miguel havia chegado. Ele atirou, em seguida disse: "Não me dirá mais nada. Eu sei que eles estão aqui, eu sei!"
Sara respira consternada. Dirá o que eu não quero ouvir.
- Precisa permanecer aqui com ele. Eu tenho essa brecha.
Continuo negativando com a cabeça e emitindo sons descordando habilmente. - Sabe o que pode acontecer. Podemos encontrar outra solução. - e continuo, continuo, continuo...
- Para. Para. - ela pega minha mão.
- Eu vou. Me deixa ir no seu lugar.
Sara morde os lábios. Olha para os cantos. Ela não quer estar mais aqui.
Quando me preparo para reafirmar o que havia dito, ela empurra meus ombros e eu caio sentado na cama. Rapidamente a sigo em direção à janela. - Sara, não! - Ela abre, com força, puxando as hastes, dispõe as pernas para fora e cai sobre a grama. Seguro seu pulso; ela se assusta. Ofegante, abre bem os olhos. Então, num suplicante sussurro, digo:
- Queremos sair daqui com você.
Nada responde.
Pelo menos, nada do que eu esperava que respondesse.
- Vá com Thomas para qualquer lugar dessa floresta. Se não ouvir nada atrás de vocês, corra para o vilarejo. - Me faz soltar seu braço. A vejo andar agachada pela parede lateral da casa na direção do cercado.
De imediato, meu senso de urgência começa a despertar. O que eu achei que ela fosse responder? Miguel pode estar na casa neste exato momento, empunhando um revólver. Aquele revólver. Ainda olhando para suas costas, ajusto o enfaixamento que suspende meu braço. Depois, olho para frente. Há resquícios da neblina ainda não dissipada, mas consigo ver o lago e as árvores mais nítidos sem tanta dificuldade. Atraio para si o mártir que revoa. Acaba sendo inevitável quase ir ao chão.
Também sou afetado por um inerente mesclar de satisfação e euforia, medo e desespero; fervem meus raciocínios lógicos. Penso em possibilidades. Ainda que possam ser confusas, me movem para algumas direções, pois reluz dentre as árvores ao quase final da vista que tenho, três feixes de lanternas curiosas. Parecem estarem indo de encontro à margem do lago.
São eles. Tem que ser eles.
Os possíveis policiais estão tão longe que podem demorar minutos, e nós não temos minutos. Quando olho para onde Sara estava caminhando, bem, ela não está mais. O que eu faço agora? Poderia ir com Thomas, até nos depararmos com as luzes dessas lanternas que buscas por garotos desaparecidos. Poderia esperar para que Sara desviasse as intenções do pai. Não. Não! Isso é loucura. Não posso ir sem ela. Não posso me esconder na floresta.
- Pai! - é a voz dela. - Para com isso.
Sara não deveria estar ali. Por que quis tanto ir?
- O que tu fez... Nunca vou esquecer.
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Até o Limite por Você
Mystery / ThrillerE se conseguíssemos perceber no ápice duma exaustão contínua que para salvar a vida de quem amamos, precisamos tomar decisões arriscadas que se fazem necessárias para reconhecer o cerne deste sentimento para ambos conseguirem sobreviver? Daniel é um...