Capítulo 41

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Tita tremia nervosa enquanto dirigíamos para encontrar a assistente social que estava cuidando da adoção do Pedro. A mulher nos ligou esta manhã e pediu uma reunião com urgência. Isso deixou a Tita completamente em pânico e mesmo tentando acalmá-la não obtive resultado. Estava me sentindo um inútil, incapaz de proporcionar a felicidade da minha mulher. Essa semana tinha sido muito confusa entre nós, principalmente depois de descobrir sobre... sobre a gravidez. Queria compartilhar sua alegria mas o meu lado racional, prático e minucioso, enxergava apenas os problemas que poderiam acarretar um aborto. Tita não suportaria passar por um outro aborto.
— Não deve ser nada demais — segurei sua mão e ela suspirou. Tita quase não almoçou direito ansiosa e agora estou preocupado por sua saúde.
— Será que desistiram de nos entregar o Pedro? Podem achar que não dou conta e que vou negligenciá-lo ou que perdi o interesse ou...
— Não comece a especular. — ajudei ela descer do carro e a fiz parar antes de entrarmos no prédio. — Estou com medo! — murmurou
— Não fique! Estou aqui e vou garantir que tudo acabe bem, acredite em mim. — ela respirou fundo e concordou. — essa é minha garota! — sorriu tocando a barriga. Tita sempre a tocava, como se quisesse ter certeza que o bebê estava lá.
— Que bom que puderam vir. Sente-se! — a assistente social parecia nervosa e isso me deixou apreensível.
— Maria, aconteceu alguma coisa com o nosso processo? — Tita perguntou assim que sentou.
— Quero que fiquem tranquilos, não tem nada a ver com o Pedro, quer dizer, tem mas não é nada que vá atrasar a adoção.
— Então porque nos chamou aqui com tanta urgência? — tentei conter a minha irritabilidade. Não queria estragar tudo parecendo instável.
— Como sabem, Pedro tem um irmão mais velho.
— Sim... E não pretendemos manter os irmãos afastados. Quero que o Pedro tenha vínculos com sua família biológica. — Tita apressou-se em dizer.
— Isso é bom... — a mulher mexeu em alguns papéis e arrumou os óculos que deslizavam para a ponta do nariz — A questão aqui é mais difícil do que imagina. Há alguns dias, descobrimos através de denúncias de um vizinho, que o Fábio, irmão do Pedro, tinha sido espancado até desmaiar, pelo seu tio biológico. — olhei para Tita que estava pálida. Mantive meu controle no lugar e segurei sua mão gelada. — Depois que foi levado para o hospital, descobrimos que a violência não foi apenas física, o garoto sofreu abuso sexual... — Tudo parou em minha volta. O ar estava pesado e a voz da mulher havia sumido. Meus ouvidos estavam zunindo, como se tivesse um besouro dentro deles. Lembranças infernais quiseram tomar conta da minha mente e foi preciso lutar para expulsá-las. Dor... a dor era devastadora e solitária.
— Jamie... Amor... — Tita me chamou e o medo se tornou raiva. O ódio correu por minhas veias e foi necessário muita força para me conter.
— Eu estou bem! — limpei suas lágrimas e me perdi em sua dor. Tita sofria pelo menino e sofria por mim. Ela mais que ninguém sabe das minhas limitações e sofrimentos.
— Sei que é terrível essa história e por essa razão chamei vocês aqui — a mulher parecia estar acostumada a situações como essa. Limpou a garganta e recomeçou a mexer os papéis. — Fábio está com doze anos e como também sabem, a possibilidade dele ser adotado é quase zero e depois do que aconteceu... Ninguém quer um filho que carrega tantos traumas e complicações. O futuro dele é incerto. Sei que estão esperando um bebê e com a chegado do Pedro, já é muito para ter nas mãos e não estou aqui para pressioná-los, mas sempre tentamos manter os irmãos juntos e é nosso dever propor a adoção dos dois ao mesmo casal. Também quero deixar claro que, caso não aceitem, nada mudará sobre o Pedro. Tudo está indo bem e não tem motivos para que ele não esteje logo integrado a família.

Tita

Chorei todas as minhas angustias e medos. Chorei até minha garganta fechar e meu peito doer. Chorei até meu rosto inchar e meus olhos fecharem. Quanto sofrimento mais esse menino passaria? Porque existiam pessoas tão cruéis? Pensei no Jamie e nas marcas que trazia na alma. Sabia que com todos os nossos problemas seria pedir muito agregar mais um. Ter o Fábio aqui traria a tona seu passado. Nunca o colocaria nessa posição. Depois que limpei meu rosto, desci para encontrá-lo no jardim. Ele segurava uma carteira de cigarro fechada, como se testasse seu controle sobre o vício.
— Ei, estava se escondendo de mim?
— Um pouco. — foi sincero. Encarou o canteiro de rosas antes de baixar a cabeça e passar a mão pelos cabelos. — Não podemos ficar com ele. — murmurou entre os dentes e me sentei ao seu lado. Tirei o cigarro de suas mãos e deixei de lado.
— Eu sei!
— Não saberia o que fazer com ele.
— Não posso imaginar a vida miserável que essa criança vai levar. Passar por tudo isso e não ter ninguém para amparar suas dores...
— Abandonado duas vezes por quem tinha a obrigação de protegê-lo. — concordei.
— E agora vai ser afastado do irmão, que provavelmente é sua única família.
— Vamos ajudá-lo de outras formas. Talvez apadrinha-lo.
— Sim! Vamos fazer.

LOUCA OBSESSÃO Livro 2 Onde histórias criam vida. Descubra agora