"Vai ser um bom dia, vai ser um grande dia".
Era meu mantra no momento em que acordei sozinha na cama.
Soltei um longo suspiro, eram apenas mais alguns dias e então nunca mais nos veríamos de novo. Eu poderia fazer isso funcionar. E o mais importante, pegar a grana no fim do programa e pagar minhas dívidas.
— Vai dar tudo certo - Disse sozinha enquanto procurava algo para vestir naquela manhã chuvosa e um pouco mais fresca que o comum.
Min Jun não estava na sala, muito menos na cozinha, mas havia deixado seus rastros de louça suja de sua vitamina verde esquisita.
Não havia nada para mim, o que era uma ótima oportunidade para preparar meus ovos mexidos com bacon. No entanto ainda não havia percebido o quanto comer sozinha poderia ser solitário. Eu estava mal acostumada com a constante companhia dele. Logo comer sozinha seria apenas mais uma das milhares de coisas normais na minha vida.
Havíamos voltado à estaca zero.
Mas não era mais como no começo. Dessa vez não se tratava de dois meros desconhecidos habitando sob o mesmo teto. Eu e Min Jun já havíamos sido "nós" e nós tínhamos uma história juntos.
Uma parte de mim desejava que aqueles dias se passassem num piscar de olhos para sair logo daquela casa. Outra parte almejava que aqueles dias durasse anos para que eu pudesse passar o maior tempo possível ao lado de Min Jun.
— Talvez eu tenha preparado comida demais - Murmurei me deparando com uma frigideira ainda tão cheia quanto meu estômago — Talvez ele queira um pouco... - Mordi o lábio.
Coloquei o restante dos ovos num prato e o observei sobre a bancada.
— Porque eu tô fazendo isso? Eu posso apenas jogar fora... - Peguei o prato e me aproximei da lixeira - Mas seria muito desperdício... Eu posso comer... Não, não consigo comer mais - Fiz uma careta - Ai Lisa, porque é tão complicado levar a droga de um prato pra ele? - Eu me indagava - E se ele pensar que estou preocupada com ele é criar uma ideia errada sobre nós? São apenas sobras de ovos mexidos Lisa, você consegue fazer isso. Nós nem somos mais namorados e já deixei isso claro pra ele. Respira Lisa, você consegue - Me motivei.
Com cuidado caminhei rumo a pequena academia. Certamente Min Jun estaria correndo numas esteira ou socando um saco de areia.
Meus olhos avistaram Min Jun exatamente da forma que eu esperava, socando um saco de areia. Permaneci parada diante da porta com o prato em uma das mãos e o coração na outra.
Senti o bolso da calça cinza de moletom vibrar. Brie havia me enviado uma imagem idiota, mas idiota o bastante para me arrancar algumas risadas. Decidi responder seu recado idiota rindo e sorrindo involuntariamente de suas respostas tão idiotas quanto.
Ouvi um grito aflito e me assustei com a cena de Min Jun caindo depois de ser atingido pelo saco de areia. Seu nariz sangrava e com a queda parecia ter cortado os lábios.
— Aí meu Deus!
Larguei o prato e o celular no chão e me ajoelhei ao seu lado enquanto ele resmungava com as mãos no rosto.
— Se-seu rosto... - Gaguejei aterrorizada - Me espera aqui, eu vou procurar algo pra parar esse sangramento.
Voltei com um maço de papel higiênico e alguns band-aids, sem a mínima noção do que realmente estava fazendo.
Min Jun se encontrava sentado no chão, com a boca inchada e a cabeça erguida para conter o sangue.
— Eu... Eu trouxe alguns curativos... Eu acho... – Ajoelhei diante dele – Toma isso, deve ajudar com o nariz – O entreguei o bolo de papel higiênico – O que exatamente aconteceu aqui? Imaginava que passando tanto tempo aqui quanto você passa, soubesse o que estava fazendo.
— Eu fei – Resmungou com a boca estranha.
— Não é o que parece. Você apanhou de um saco de pancadas Min Jun Hyun.
— Eu me disfraí. Afontece...
— E com o que se distraiu exatamente?
Ele pegou um pedaço limpo de papel e tapou o nariz outra vez.
— Com fofê.
— Comigo?
— Focê esfafa... Fofê sabe ... Esfafa toda feliz em feu tefefone – Murmurou fanho – E for um momento eu fensei que esfifesse fafando com algum cara. Eu nem fei forfê penfei isso.
— Me deixe entender, já que está bem difícil. Estava com ciúmes de mim?
— Talfez...
— Eu falava com a Brie. Você conhece ela. A minha melhor amiga "barra" empresária – Expliquei irritada.
— Finfo muito Lifa.
— Você não tem esse direito Min Jun. Não tem o direito de sentir ciúmes de mim. É mesmo que eu estivesse em meio a uma acalorada conversa com algum cara, você ainda não teria esse direito. Deixou de ter quando eu descobri sobre sua noiva te esperando em seu país.
— É nafural eu fentir iffo quando ainda fenho fenfimentos for fofê...
— Eu te dei uma escolha e você fez a sua, decidiu seguir seu pai. Então não, eu não permito que sinta ciúmes de mim. Você não pode, acho que estamos entendidos, não estamos?
Relutante ele balançou a cabeça num "sim" descontente.
— Você pode colocar esses curativos sozinho. Eu não sou boa com isso. Vi apenas dois episódios de "Grey's Anatomy", não é meu tipo de série, então acho melhor tentar sozinho. Ah é esses ovos são para você – Indiquei o prato no chão – Achei melhor que jogar no lixo.
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Um banho relaxante. Sim. Isso era tudo o que eu precisava naquela tarde para aliviar um pouco do estresse dos últimos dias. Uma banheira cheia de água morna e os sais de banho que eu normalmente ignorava por preguiça. Mas aquele era o meu momento. Sozinha, longe de todas as centenas de câmeras, dos olhares atentos de Genna e sua equipe e principalmente longe de Min Jun.
Eu podia cantarolar qualquer música idiota sem me preocupar com a afinação e com que os telespectadores pensariam de mim.
Me acomodei na banheira. Uma perna, outra perna e mergulhei meu corpo até o pescoço, fechando os olhos e inalando o delicioso cheiro das velas aromáticas acesas sobre o balcão da pia.
Aquilo era o paraíso. Tranquilidade e harmonia.
— Vamos pensar apenas em coisas boas Lisa, você merece depois de tudo o que passou - Repito a mim mesma como um mantra sagrado.
— "Oh, oh, oh Rich... My sister is a bitch..." - Eu cantarolava desafinada - "She says I love you, but you know how I feel about you... You're so dumb, she's lying your stupid boy... You are just one of the seventeen boyfriends that she has... Oh oh oh..."
— Essa música é definitivamente uma droga. Mas quem se importa?
Mesmo com a música mais estúpida do mundo em minha mente, meus pensamentos ainda voltavam à Min Jun e sua ridícula cena de ciúmes mais cedo.
Ele havia apanhado de um saco de pancadas por acreditar que eu falava com um homem.
E mesmo que eu falasse com um, isso já não era mais problema dele. Eu estava livre, sem qualquer compromisso. Não haveria nada de errado.
— Droga, eu não consigo relaxar - Bati na água, a espirrando para fora da banheira - Eu preciso sair dessa casa o mais rápido possível, ou vou morrer de estresse agudo, e eu nem sei se isso existe. Quer saber, chega de banho... Essa droga não tem nada de relaxante.
Inconformada levantei e saí da banheira à procura de uma toalha de banho, deixando um rastro molhado pelo chão.
Então como num dejavu o trinco da porta girou e senti o pior prestes a acontecer. Min Jun abriu a porta e seus olhos se arregalaram quando notou minha presença.
— Aí merda de novo não – Resmunguei e senti seus olhos fixos sobre mim – Eu ainda estou pelada né?
— É está sim – Respondeu com naturalidade.
— E o que você tá olhando? – inquiri sem jeito – Vire pra lá – Apontei para o lado de fora do banheiro e me enrolei na toalha de banho.
—Por que, eu faria isso? Eu já vi tudo o que tinha pra ser visto... Várias vezes. Não tem nada de novo aí tem? – Sorriu maldoso e ergueu as sobrancelhas.
— Eu realmente sinto falta da sua versão virginal e tímida.
— Mentira.
— De qualquer forma nós terminamos, então significa que nunca mais você verá tudo isso na sua vida – Apontei para mim mesma subindo e descendo as mãos – Porque entrou no assim no banheiro? Tínhamos um acordo...
— Tínhamos, mas quando começamos a namorar excluímos a parte de trancar a porta durante os banhos pra você sabe o que – Desviou o olhar – Deve estar acostumada e não trancou a porta.
— Eu me distraí...
— Ou está acostumada a tomar banhos comigo.
— Eu não quero falar sobre isso... Precisa usar o banheiro? Dor de barriga?
— Também preciso de um banho, tenho um teste para um papel importante em algumas horas.
— E vai com essa cara? – Me aproximei dele observando sua boca inchada e o nariz machucado.
— Está tão ruim assim?
Meus dedos tocaram seu rosto com delicadeza. Toquei seus lábios agora volumosos e Min Jun engoliu em seco. Tenso. Talvez a proximidade exagerada entre ele e eu apenas de toalha o deixasse dessa forma.
Olhei dentro de seus olhos e então...Explodi numa gargalhada capaz de ser ouvida em Marte.
— Tá brincando comigo? – Ele me observava assustado – Sua boca está tão grande que você poderia ser substituído pela Kylie Jenner e ninguém nem notaria a diferença. Me desculpe, mas parece que foi picado por um enxame de abelhas só na boca – Eu me curvava rindo e sacudia os braços em busca de ar.
— Isso não é engraçado – Protestou chateado.
— Mas claro que tem, é hilário.
— Diz isso porque não é com você... – Colocou a mão na boca tentando escondê-la.
— Eu nunca levaria uma surra de um saco de areia por ciúmes da minha ex – Sorri prepotente e ele sacudia a cabeça Inconformado.
— Certo, o que eu faço agora? – Parecia indagar a si mesmo.
— Posso dar uma sugestão? Se perguntarem, diga que acabou de sair de uma sessão de preenchimento labial – Voltei a gargalhar descontrolada – Me perdoe, mas a sua cara está muito ridícula.
Min Jun se olhou no espelho por alguns instantes e então me fitou irritado.
— Não é tão ruim quanto faz parecer. Está fazendo isso de propósito porque te flagrei pelada outra vez?
— Também... Senhorita Jenner.
— Você consegue ser insuportável quando quer.
— Pensei que já soubesse disso – Coloquei as mãos na cintura.
— Eu sempre soube, mas sempre relevei.
— É você é chato Hyun Min Jun, estupidamente chato – Me aproximei novamente e o fitei desafiadora – Mas eu sempre relevei – Apontei o dedo o batendo contra seu peito.
— Eu juro que te beijo se chegar mais perto – Alertou sem qualquer hesitação e recuei.
— Não será necessário – Respondi desconcertada – Pode tomar seu banho, vou apenas soltar a água da banheira e não se aproxime – Sorri sem graça.
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E lá estava eu sozinha, numa sala de estar escura, iluminada apenas pela claridade do televisor, acompanhada por um balde de pipoca e jogada preguiçosamente sobre o sofá.
Talvez isso fosse mais relaxante que o banho desastroso mais cedo.
— Não vai por aí sua idiota, é claro que o assassino vai te matar.
O vilão do filme fez justamente o que eu temia.
— Eu disse sua garota estúpida!
Esbravejei com a personagem que me dava nos nervos e abocanhei um punhado de pipoca, permanecendo concentradas nas seguidas atitudes estúpidas de cada personagem ainda vivo.
Ouvi a porta da frente se abrir. Min Jun havia chegado de seu teste.
Um lado de mim torcia por seu sucesso, o outro desejava seu fracasso apenas por vingança.
— Eu posso me sentar? – Ele não parecia animado.
Num ato de caridade fiz o impensável. Me sentei dando lugar a ele. Eu sou realmente uma alma caridosa.
— Claro nós ainda somos um casal afinal de contas.
— Hum? – Soou perdido.
— Para o programa, nós ainda somos um casal.
— Ah sim, claro – Respirou aliviado.
Min Jun se acomodou ao meu lado e um silêncio mortal se instalou em nosso meio. Pigarreei tentando puxar assunto.
— É então como foi seu teste? – Tentei não soar tão curiosa quanto realmente estava.
— O teste...
— Sabe, com a cara desse jeito pode ficar meio difícil.
— Eu... Eu não consegui – Abaixou a cabeça e pegou um punhado de pipoca.
— Oh. Não está falando sério né? – Me senti estupidamente comovida.
— Estou sim – Respondeu sem desviar os olhos da tela à nossa frente.
— Não pensei que esse tipo de coisa acontecesse com você.
— Que tipo de coisa? – Vi seu olhar sério.
— Você sabe. Fracassar, ser rejeitado. Parece que sempre consegue o que quer.
— Eu também posso ser rejeitado e nem sempre consigo o que eu quero, eu não tenho você.
Dei outro pigarro sem jeito.
— E era um papel importante?
— Passou a ser. Seria meu primeiro papel fora de um filme de ação.
— Pensei que não gostasse de papéis mais sérios.
— Pela primeira vez na minha carreira eu tentei algo mais dramático. Eu acreditava que não me importaria, mas eu me peguei realmente desejando isso, ser respeitado por ser um bom ator e não por ser um rosto bonito – Sua voz soava entristecida.
— Foi a sua boca?
— Não. Na verdade o problema é que sou asiático demais pro papel.
— Eu não entendo...
— Eu sirvo apenas para filmes de ação, porque precisam do asiático que conhece artes marciais e chuta a bunda dos vilões. Mas nunca serei bom o bastante pra qualquer outro papel.
— Eu sinto muito Min Jun. Você está bem?
— Vou ficar.
— Realmente sinto muito.
— Lisa?
— Sim?
— Me desculpe por mais cedo – Eu observável seu rosto iluminado apenas de um lado – Não devia ter entrado no banheiro daquela forma, deveria ter batido na porta e me desculpe por ter feito aquela cena ridícula na academia. Como você mesma disse, não tenho mais o direito de sentir ciúmes de você. Você pode e deve sair com quem quiser, é o seu direito e não tenho nada a ver com isso.
— Obrigada Min Jun. É bom ouvir isso vindo de você.
— A propósito está linda hoje – Comentou com uma naturalidade assustadora e encheu a boca de pipoca.
— O que, eu? – Indaguei incrédula.
— Uhum.
— Eu nem fiz nada de especial, só tomei banho... Olha eu nem penteei o cabelo, tá parecendo um ninho.
— Você é linda. Só isso.
— Mesmo com um ninho na cabeça e de moletom velho?
— Sim. Porque mesmo assim ainda é a Lisa e a Lisa é linda. Sempre te achei bonita e pensei que já que estamos abrindo nossos corações nesse momento seria legal te dizer o que penso de você.
— Pode parar com isso?
— Estou incomodando?
— Não, mas é fofo e eu preciso te esquecer, não me sentir tentada a te beijar – Protestei
— Estaria por acaso se sentindo tentada?
— O que acha? Você me diz que sou linda até sem pentear o cabelo, apanha de um objeto inanimado e depois me pede perdão pela cena. Isso me deixa um pouco balançada sim.
— Ainda gosta de mim.
— Você sabe que sim e você ainda gosta de mim, estamos quites.
— Pensei que me odiasse.
— Não é algo tão simples – Cruzei os braços contra o peito – Acho que preciso de outro banho.
— Estou atrapalhando alguma coisa?
Meu coração saltou do peito e senti que morreria a qualquer momento.
— Mas que porra você tá fazendo aqui à essa hora Genna? – Ralhei prestes a sofrer um ataque cardíaco.
— Eu precisava dar um recado pessoalmente.
— Há quanto tempo estava aqui?
— Uns dez minutos – Deu de ombros – Mas eu posso fingir que não ouvi nada.
— Você é doente – Assinalei abismada.
— E não podia esperar até amanhã? – Min Jun havia saltado do sofá e empunhava o controle remoto.
— Você ia mesmo nos defender de um invasor com o controle remoto Min Jun? Eu acabo de retirar o que disse sobre me sentir tentada – Fiz um muxoxo Inconformada.
— Ela tem razão garotão – Desconcertado Min Jun largou o controle – Mas prosseguindo, não, não poderia deixar pra amanhã, pois se trata de algo urgente. Eu atrapalhei alguma coisa, não foi?
— Sim, a nossa sanidade mental – Resmunguei.
— Dane-se. O que tenho a dizer é importante e não pode esperar.
— Apenas diga! – Ordenou Min Jun rabugento.
Genna abriu um grande sorriso e eu sabia que era um mau sinal. A felicidade de Genna era nossa infelicidade.
— Vocês irão para Rogersville amanhã – Anunciou como se não fosse nada.
— Mas que merda você tá falando Genna?
— Para o casamento da sua irmã, oras.
— Eu não sabia que ela se casaria amanhã!
— É não se casaria, mas eu movi uns pauzinhos e algumas centenas de dólares pra convencê-la a adiantar a cerimônia para que fosse transmitida nos últimos episódios de "Recém Casados ". Imaginem, um casamento real nesse programa elevará o nível das coisas, deixando tudo mais verdadeiro e intenso, uma chuva de emoções. As donas de casa irão a loucura com esse episódio.
— Você não fez isso...
— Ah eu fiz, sua irmã adorou a ideia Lisa, agora ela terá a festa dos sonhos com todo o dinheiro que demos a ela.
— Eu te odeio muito.
— Não dou a mínima. Irão passar dois dias lá e voltarão no último dia de gravações para finalizarem o que falta é então haverão algumas entrevistas na televisão e as coisas finalmente acabarão entre nós. Estou tão animada com esse casamento. Devo ir agora. Podem continuar o que estavam fazendo, os caras da produção adoram essa novelinha de vocês, eles fazem até apostas. Eu entrei em uma, mas acabei perdendo, achei que se beijariam na noite passada, mas o cara da edição disse que não porque a Lisa é bem mais difícil que Min Jun.
— Estou realmente assustada.
— Está num reality show. Ah e arrumem as malas, saímos amanhã cedo.
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Recém Casados [Reta Final]
Literatura FemininaLisa Scott é uma ex-famosa. Aos 26 anos vê sua carreira de cantora indo para o fundo do poço depois de alguns escândalos que destruíram sua imagem e para recuperar seu status resolve participar do reality show mais assistido dos EUA, o Recém-Casados...