Histórias compartilhadas

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                                                                                   POV: Megan

Mirou-me envergonhado enquanto eu fitava alarmada sua camisa rasgada e a mancha avermelhada em seu rosto.

— Eu caí. — Justificou antes que eu perguntasse e sem mais detalhes, caminhou em direção ao táxi que nos esperava justo no portão da escola.

Marcela havia surtado e embora eu temesse terrivelmente o dia em que ela me trancaria em um quarto escuro ate que eu finalmente contasse a verdade, ela parecia estar colocando agora todos os esforços em tirar o maior proveito possível da situação, o que significava que eu tinha mais tempo para inventar uma historia plausível e que também tinha uma agenda lotada de entrevistas para revistas que pareciam querer fazer de mim e Collin o casal do ano.

O apartamento estava vazio. Collin havia saído para um ensaio com a Lyrics e havia dito que iria demorar. Eu sabia o que ele estava fazendo e respeitava seu tempo para digerir tudo o que havia acontecido.

— Vou tomar um banho.

Fitei-o afastar-se com os ombros baixos. Uma solidão quase palpável o acompanhava sob sua áurea que apenas faiscava agora. Escutei a porta do seu quarto ao fechar-se levemente e me apressei em abrir a geladeira e remexer em tudo o que havia dentro. Queria assegurar-me de encontrar algo que o fizesse voltar a sorrir. Algo que o fizesse animar novamente.

Coloquei uma pizza no forno e me sentei no balcão um tanto ansiosa. Escutei seus passos tímidos atras de mim minutos depois. Fitei o machucado em seu rosto e ponderei, buscando a maneira de começar aquela conversa sem afasta-lo.

— Acho que precisamos cuidar disso.

Sorri e seus olhos encontraram os meus. Tomei sua pequena mão entre a minha e o levei em direção ao banheiro onde tirei a caixa de remédios de cima do armário da pia. Não protestou enquanto eu passava a pomada sobre o machucado. Seus olhos estavam perdidos em algum lugar longe dali.

— Acha que ele vai se recuperar?

Fitei-o e seus olhos dourados encontraram os meus.

— Papai. — Continuou. — Acha que ele vai se recuperar?

Assenti enquanto colocava um Band-Aid em seu machucado.

— E se ele não se recuperar? Para onde vão me mandar?

Fitei-o sentindo o coração pesar no peito e forcei um sorriso, sabendo exatamente como Collin se sentia todas as vezes que tinha que fazer o mesmo.

— Você não estaria sozinho. — Assegurei enquanto tomava sua mão e o levava de volta para a cozinha.

— Ele me odeia.

— Ele me odiava também. — Pisquei pra ele e pela primeira vez desde que o havia deixado na escola aquela manha um sorriso se abriu em seus lábios. — Ele só não sabe o garoto especial que você eh ainda.

Assentiu e apertou um pouquinho a minha mão respirando fundo.


Comemos dois pedaços de pizza cada um e rimos de algumas piadas que eu havia aprendido na internet. O senso de humor dos seres humanos me intrigava e não posso dizer que eu era exatamente boa nisso. Mas ele estava sorrindo e isso bastava pra mim.

Nos sentamos no sofá enquanto a noite caia lá fora e vimos todos os filmes da Disney possíveis enquanto ele fazia o dever de casa. Adormecemos apertados um contra o outro. Já passavam as 11 quando um trovão me despertou. Fitei sua cabeça em meu ombro e seu pijama azul de dinossauro e afastei os cabelos dos seus olhos tomando-o em meus bracos. Coloquei-o na cama com cuidado, evitando a todo custo qualquer ruido enquanto a chuva caia lá fora e me esgueirei entre as sombras ate a porta. Tropecei em sua mochila e uma caixa de tamanho mediano pulou para fora dela.

Cortes de revista, jornais e matérias impressas da internet. Artigos sobre Collin em todas elas. Cartas em uma letra cursiva e infantil direcionadas a ele. Durante todo esse tempo Pedro havia torcido pelo irmão que nem sequer sabia que ele existia. O havia amado sem o conhecer.

Fechei a porta atras de mim e senti meus olhos queimarem enquanto caminhava pelo corredor e meus olhos encontravam os seus no fim dele. Collin fitou os livros apilhados cuidadosamente sobre a mesa de centro da sala e seus olhos voltaram a pousar sobre os meus cansados.

 —Sua mãe o deixou quando ele nasceu. — Disse fitando o quarto de onde eu havia acabado de sair enquanto jogava a mochila no sofá. — Simplesmente desapareceu sem deixar rastros, o abandonando com meu pai.

Parei a sua frente e pousei minha mão sobre a dele. Senti seu toque cálido enquanto ele apertava minha mão entre a sua e esperei que ele ordenasse a bagunça que tinha na cabeça.

— Ele esteve aqui todo esse tempo. Bem na frente do meu nariz. — Fitou-me com os olhos lagrimejados. — E ainda assim, nem uma vez... Nem sequer para tentar... Veio me ver.

Dei um último passo em sua direção e seus braços me apertaram de encontro a si. Apoiou a cabeça no meu ombro e senti seu peito tremer. O som do seu choro me rasgava por dentro. Pousei as mãos em suas costas enquanto ele me estreitava mais forte entre seus braços.

— Me perguntei por muito tempo o que eu tinha feito de errado... Por que todos decidiam partir... Por que ninguém queria ficar?

— Eu não vou a lugar nenhum. 

—Fitou-me com os olhos brilhando entre as lagrimas, uma expressão de paz tomando conta do seu rosto.

— Isso é uma promessa?

— Deixaria tudo o que conheço por você novamente se fosse preciso.

Sorriu e limpou o rosto com as mãos. Vê-lo sorrindo restaurou o que seu pranto havia quebrado dentro de mim e senti seus lábios nos meus com uma caricia suave enquanto suas mãos pousavam na minha nuca, puxando-me delicadamente em sua direção.

A tempestade parecia aumentar lá fora, como se o mundo estivesse caindo, mas nada disso nos importava.

Foi junto com um trovão que o escutamos gritar e Collin afastou-se. Soube que ele havia ouvido o pranto em sua voz da mesma maneira que eu e soube que ele havia sido jogado diretamente a anos trás, quando não havia ninguém por perto para afastar seu medo a tempestades.

Fitou-me e assentiu em silêncio caminhando em direção ao quarto de alguém que parecia compartilhar a sua antiga vida.

Tinham muitas histórias que compartilhar.



Antes que eu desapareçaOnde histórias criam vida. Descubra agora