Um integrante a menos

370 95 26
                                    

                                                      ⋅⋆⊱╌╍╌╍╌⋇❬✛❭⋇╌╍╌╍╌⊰⋆⋅

                                                                               POV: Collin

Ela se parecia muito a mim. Uma versão feminina e vinte anos mais velha, mas não pude deixar de notar a semelhança. Durante todo esse tempo, ignorei que tinha uma família paterna. Durante muito tempo somente aceitei que a relação dos meus pais havia terminado de maneira complicada antes mesmo de eu ter a oportunidade de entender o que estava acontecendo.

Pousou as mãos sobre o ombro de Pedro e me mirou nos olhos. Os seus eram verdes exatamente no mesmo tom que os meus.

— Ola Collin. — Sua voz era tranqüila , sua postura era serena. — Obrigada por me deixar passar um tempo com ele. — Seus olhos encontraram os do garoto e Pedro sorriu. — Sei que toda essa situação esta sendo muito difícil pra você, mas... — Ponderou por alguns segundos, mas decidiu continuar. — Seu pai achou melhor que vocês ficassem juntos por algum tempo. Alem disso, moro fora da cidade e faltam apenas dois meses para as aulas terminarem. No ano que vem transferirei Pedro para uma escola perto da minha casa e cuidarei dele. Sei que eh Pedro muito, mas espero que possa cuidar do seu irmão ate lá mais um pouco. 

Fitei o garoto que acomodava a mochila nos ombros com um sorriso que ameaçava desvanecer-se e assenti rapidamente enquanto sentia uma urgência desconhecida de negar o que ela havia dito. Eu não o sentia como uma carga. Havia entendido que ele era exatamente igual a mim.

— Eu hum... — Continuou. Sua voz vacilando pela primeira vez desde que havia chegado. — Sinto muito... Sei que você deve ter um monte de perguntas e sei que tem algumas respostas, mas que não consegue completar o quebra cabeça. Sua mãe e seu pai se amaram muito e logo depois se odiaram na mesma proporção. As coisas ficaram muito difíceis e sua mãe ficou muito machucada com a forma como tudo terminou. Ela não nos queria perto de você e suponho que estivemos errados de somente aceitar isso. — Passou a mão nos cabelos escuros e empurrou Pedro gentilmente na minha direção. — Se não se importa, gostaria de vir no próximo mês para passar algumas horas com ele.

Senti a mão de Pedro sobre a minha enquanto ele parava ao meu lado.

— Mais uma vez, obrigada.

— Você pode vir jantar um dia.  

Seus passos estancaram no meio do corredor e ela se virou para mim sorrindo. Os olhos brilhando enquanto assentia.

— Seria ótimo. — Concordou. — Seria realmente ótimo.  

                                              ⋅⋆⊱╌╍╌╍╌⋇❬✛❭⋇╌╍╌╍╌⊰⋆⋅  

O ar era morno e a brisa era reconfortante. Eram apenas onze da manha e eu sabia que logo esquentaria ate que fosse impossível permanecer do lado de fora sem se sentir sufocar. Caminhei entre as plantas bem cuidadas do jardim da produtora aliviado pelos trinta minutos de descanso antes do ensaio continuar. Escutei sua voz e as notas desafinadas do violão minutos depois.

Seus bracos estavam em volta dela enquanto suas mãos pousavam sobre as dela mostrando-lhe cada nota musical como um professor amador. Seu rosto acercou-se um pouco mais dos ombros dela e Megan afastou-se um pouco nervosa enquanto assentia e sussurrava que podia tentar sozinha.

Senti um gosto amargo na boca enquanto meu estômago revirava todo o café da manha.

— Você deve apertar mais aqui. — Pressionou os dedos dela sobre as cordas e sorriu, enquanto ela afastava-se um pouco mais. — Vamos, tente outra vez.

— O que esta tentando fazer Lucas? — Minha voz não pareceu preocupa-lo. Megan fitou-me assustada e largou o violão no banco onde estivera sentada. — Por que qualquer um podia mal interpretar. 

— Poderia? — Fitou-me com inocência fingida. — Eu só estava ensinado a Megan algumas notas. Ela parece boa nisso. Talvez com um pouco mais de prática...

— Pode deixar que eu me encarrego.

— Não sabia que era tão ciumento Collin. — Deu um passo na minha direção. A testa franzida como se realmente estivesse achando estranho o meu comportamento. — Mas não te culpo. — Deu de ombros e seu sorriso ampliou-se. — Ela é realmente um encanto.

Eu havia suportado. Havia guardado todas aqueles ridículos insultos nas entrelinhas até esquece-los. Mas algo eclodia dentro de mim e eu já não conseguia suportar mais.

Seu sorriso debochado nublou a minha vista e pela primeira vez finalmente decidi borrar aquela expressão cínica do seu rosto. 

Megan levou as mãos aos lábios, contendo um grito ao ver Lucas cair do seu lado e me fitou assustada.

— Finalmente! — Lucas sorriu, limpando o sangue dos lábios enquanto me fitava do chão. — Me perguntava até quando você conseguiria encenar?

— Qual é o seu problema?

— O meu problema? — Sorriu cínico. — Talvez o fato da nossa banda girar em torno de você? Talvez o fato de que nos tratam como coadjuvantes no nosso próprio espetáculo enquanto você não da a mínima para tudo isso? Enquanto você anda por ai com essa vontade quase palpável de simplesmente desaparecer? Não é injusto que uns tenham tudo o que outros dariam a vida para ter?

— É por isso? Por isso me odeia tanto?

— Eu não te odeio Collin. Eu só odeio que você tenha tudo o que eu sempre quis ter.

Deixei-me cair no banco enquanto negava com um sorriso que não me animava em absoluto. Senti os passos de Megan tímidos na minha direção e relaxei quando sua mão tocou a minha.

— O que esta acontecendo aqui? — A voz de Marcela era grave. Sua expressão deixava transparecer todo o choque que há havia invadido. — O que vocês estão pensando?!

Algumas pessoas começaram a juntar-se ao nosso redor, junto com o resto da Lyrics.

— Eu dormi com ela. — A voz de Lucas me distraiu e voltei a fita-lo enquanto ele se levantava do chão. Sua expressão havia mudado e já não havia sarcasmo ou burla em seu rosto. — Dormi com a Julia enquanto ela ainda estava com você.

Um silêncio quase gritante tomou conta de todos enquanto o sol esquentava acima de nossas cabeças e não pude entender se era o calor repentino ou o torpor que havia tomado conta de mim que me impedia respirar com facilidade.

— Eu to fora. — Escutei a mim mesmo dizer, como se naquele momento visse tudo desde uma perspectiva diferente do meu corpo.

Escutei os burburinhos enquanto caminhava em direção ao estacionamento ainda com a mão de Megan sobre a minha, mas não me detive.

Eu ia não queria estar ali. 

Antes que eu desapareçaOnde histórias criam vida. Descubra agora