11 - Canalha

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Saí do apartamento de Lucy me sentindo eletrizado. Como se a noite tivesse me dado energia, ao invés de me deixar exausto. Correria uma maratona naquele momento, se pudesse. Mas bastou entrar em meu apartamento para toda minha alegria se esvair ao ver meu terno em cima do sofá, com um bilhete.

"Amorzinho, passei para deixar seu terno e me desculpar pela torta, já pedi que o sabor seja limão com doce de leite, afinal, o melhor noivo do mundo merece! Amo você, sua Babi".

Foi como levar um soco no estômago. Eu era um canalha! Tinha acabado de ter uma noite incrível, enquanto minha noiva se preocupava com o sabor do bolo do nosso casamento. O quão babaca eu podia ser?

Sentei no sofá, ao lado do terno e peguei o celular, mandando uma mensagem para Bárbara e agradecendo pelo cuidado. Ela sempre havia sido assim, atenciosa. Então, por que eu não conseguia parar de pensar na prima dela? Por que mesmo diante da culpa, só queria voltar para bolha e fazer tudo de novo?

—Você é um filho da mãe, Derek! — murmurei, jogando o celular no sofá e indo para o quarto.

Troquei de roupa rápido e meu celular começou a tocar na sala, corri e peguei o aparelho, atendendo.

—Ei, cara! Esqueceu a reunião às 9h00? Cliente novo? — Era Tales.

—Não. Estou chegando em vinte minutos. Alguém já está aí?

—Só eu, seu melhor assistente! — falou.

—Claro e o mais modesto. Peça à Tina que prepare café e compre bolinhos na padaria da esquina — orientei. — Logo chego aí.

—Beleza! Vê se arrasta logo essa bunda branca pra cá que temos dinheiro pra ganhar hoje!

—Ok. Até daqui a pouco.

Peguei meu notebook, onde estava o plano para empresa que nos visitaria naquela manhã a fim de fechar um contrato. Depois fui até a cozinha, bebi um copo de suco, peguei as chaves e saí.

Sempre que tinha reunião com um cliente novo, eu me sentia eufórico. Era bom fechar novos contratos, ampliar o alcance do escritório, ganhar mais dinheiro, claro. Mas naquela manhã, sabia que minha euforia ia além da reunião. Era por ela.

Aquele rosto que havia ficado em meus pensamentos por anos, tinha se tornado mais real do que eu já havia pensado ser possível. Tão real que tinha cheiro, gosto e nome. Lucy.

O trajeto até o escritório foi de luta interna sobre a necessidade de vê-la de novo e a urgência de me afastar. Como ela mesma havia dito, não podíamos fugir da nossa vida, e o fato era que minha vida estava caminhando para se comprometer com outra mulher.

Afrouxei um pouco o nó da gravata, sentindo-me levemente sufocado pelos pensamentos e pela vontade que insistia em me perturbar.

Quando cheguei, Tales me aguardava com um copo térmico de café bem forte, como eu gostava.

—Obrigado — disse, pegando o café e caminhando para sala de reuniões com ele atrás.

—Eles ligaram — informou. — Pegaram um engarrafamento e devem chegar um pouco atrasados.

—Ok. Vou organizando as coisas por enquanto.

Comecei a trabalhar, torcendo para que minha cabeça fixasse as ideias naquele momento e não na cama da uma mulher que não era minha noiva.

XXXXX

Reunião concluída e mais um cliente fechado. Estava sozinho em minha sala, checando o resto da agenda do dia, quando Tales entrou.

—Parabéns, cara! Foi objetivo e sensacional como sempre! — elogiou e sentou na cadeira de frente pra mim.

—Obrigado.

—Que cara é essa?

Olhei para ele de lado e voltei a fitar a tela do notebook.

—Cara nenhuma.

—Parece meio irritado — disse.

—Não foi nada, já disse — resmunguei.

—Se você diz... — Ergueu os ombros. — Olha, peguei o telefone daquela priminha da sua noiva, acho que vou chamar pra sair no fim de semana.

A raiva pulsou em meu corpo e apertei a mão para não falar o que não devia.

—Acho que você devia ficar longe dela — murmurei.

—E posso saber o motivo? Ela é gostosa e me deu bola, aliás, você sabe que eu já peguei né?

Engoli em seco e o fitei com cara de poucos amigos.

—Não fale assim! — disse em tom mais alto do que o normal.

—Ahhh, Derek! Para de bobagem! Não vai entrar nessa de defender a prima da sua noiva como se fosse uma irmã mais nova, vai?

—Só não acho que você deveria falar assim de uma mulher.

Tales revirou os olhos.

—Beleza, mas não seria um problema, seria?

—Já disse o que penso. Lucy não é o tipo de mulher com a qual você está acostumado.

—Acontece que se ela me der condição, vou pegar de novo e com gosto — gabou-se, rindo. — Não se deixa uma delícia daquelas passar assim.

Levantei, cerrando o maxilar.

—Sai daqui, Tales! — vociferei. — Antes que eu te dê um soco!

Ele levantou com as mãos para o alto.

—Calminha aí, parceiro! — pediu. — É só jeito de falar, eu respeito muito a Lucy. Ela parece ser gente boa e quero mais que levar ela pra cama. Pensei em convidá-la pra ser meu par no seu casamento.

Respirei fundo, contando até mil mentalmente.

—Ela não vai aceitar — afirmei.

—Por que não? Ela tem namorado?

Engoli em seco, os batimentos já acelerados.

—Não.

—Então?

—Faça o que quiser! Agora me deixe trabalhar e saia daqui.

Tales, ainda me fitando sem entender, saiu da sala. Joguei-me na cadeira e soltei o ar. Que droga de reação ridícula foi aquela? Não era a primeira vez que Tales falava sobre uma mulher comigo, aliás, aquilo era até comum e antes da Bárbara, costumávamos sair juntos uma vez ou outra para farra. Mas eu não podia negar que ouvi-lo falar da Lucy, naqueles termos, me tirou completamente do sério. E o pior: fiquei apavorado pela possibilidade dela aceitar as cantadas baratas dele, de novo. Tentei não lembrar que os dois haviam ficado juntos na noite em que tínhamos nos encontrado por acaso e eu havia encurralado-a no banheiro.

Voltei os olhos para o notebook, incapaz de me concentrar um segundo sequer. Foi quando me rendi à ânsia e liguei para ela.

O estranho da bibliotecaOnde histórias criam vida. Descubra agora