Capítulo 24

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Henrique

Mais um segundo longe da minha família e meu coração poderia ser capaz de parar de bater. Eu precisava ir até o hospital, ver como meu filho estava e lhe implorar seu perdão, assim como também faria de joelhos no chão, diante da Melinda, que eu sentia falta mais do que tudo e amava de uma forma inexplicável.
Peguei minha carteira e as chaves do carro, hoje eu mesmo ia dirigir, coisa que não faço a anos, afinal a vida de um multi-milionário havia mesmo me subido a cabeça e me deixado um velhote meio soberbo. Enfim, meu motorista particular mais do que merecia umas férias e era exatamente o que ele iria ganhar.
Desci até meu escritório e pedi que meu tão fiel amigo e chefe de segurança, Erick, que já estava comigo a mais anos do que consigo me lembrar, chamasse por Cleiton e pedisse que viesse até meu escritório, pois eu tinha alguns assuntos importantes que gostaria de tratar com ele.
Ocupei meu lugar, atrás da grande mesa de madeira branca e rapidamente meus olhos pousaram sob o papel de parede de meu notebook, aberto bem na minha frente. Na imagem exposta, eu me via, completamente diferente de como sou hoje. Estava mais novo, com um amplo sorriso nos lábios e o olhar perdidamente apaixonado pousado em minha bela esposa ao meu lado, segurando nossa Maya no colo e com Pedro, ainda criança agarrado a minha cintura. Sem qualquer aviso prévio, uma lágrima dolorosa rolou face abaixo e pela primeira vez, permiti que ela continuasse escorrendo.
- Eu amo tanto vocês! - Sussurrei para a foto, enquanto gentilmente tocava a tela com a ponta dos dedos.
Uma leve batida na porta, tirou-me de meus pensamentos. Tratei de enxugar as lágrimas e me recompor.
- Pode entrar! - Disse com a voz mais autoritária que eu conseguia emitir após ter o coração jorrado tantas emoções.
Erick, entreabriu a porta e deu um passo para o lado, a fim de que Cleiton, pudesse adentrar a mesma.
- Me chamou sr. Bragança? - Ele estava um tanto quanto apreensivo e eu me segurei para não cair na risada e estragar a surpresa.
- Sim! Sente-se! - Ordenei apontando a cadeira na minha frente e depois lancei um olhar para Erick - Obrigado Erick! Dispensado!
Erick assentiu com a cabeça e fechou a porta, nos deixando a sós. Cleiton por sua vez, se aproximou inquieto e eu jurava poder ouvir as batidas frenéticas de seu coração amedrontado. Como ele se mantinha calado, notei que eu devia começar a falar, já que o coitado não conseguia encontrar motivos para ser chamado aqui e eu estar tão sério. Realmente não havia nada demais, eu que sou maldoso e gosto de pregar peças nos meus funcionários.
- Bom, Cleiton... Não tenho muito tempo, então irei logo ao ponto! - Cruzei meus dedos sob a mesa e o vi engolir em seco - Te chamei aqui para falar sobre você nos deixar e...
- Pelo amor de Deus senhor - Cleiton me interrompeu e numa velocidade absurda deu a volta na mesa e se ajoelhou próximo a mim, já com os olhos cheios d'água - Eu não sei o que fiz de errado, mais prometo que não irá se repetir! Só por favor, não me mande embora... Minha esposa está grávida e eu preciso desse emprego, para poder comprar tudo para o bebê! Eu te peço, não me demita!!
Aquela cena me comoveu e a graça pela pegadinha caiu por terra, logo o levantei pela mão e entreguei um lenço para que secasse suas lágrimas.
- Demitir? Quem falou em demitir? Se acalme homem - Falei indo até o frigobar e pegando uma garrafa de água gelada e entregando a ele que bebeu em longos goles.
- Pensei que fosse o que planejava fazer! - Cleiton ainda me olhava com medo de perder o emprego.
- Pensou errado! - Ao dizer isso vi claramente a respiração dele se acalmar e ele relaxar na cadeira a minha frente - Bom, como eu estava dizendo... Acredito que esteja mais do que na hora de você nos deixar e tirar umas longas férias! - Anunciei meu plano e o vi ficar boquiaberto e depois sorrir igual criança quando ganha doce - Vai descansar, faça uma segunda lua de mel. Tenho uma casa nas Ilhas Maldivas se quiser!
- Muito obrigado sr. Bragança! - Seu sorriso parecia que a qualquer momento rasgaria seu rosto.
- Ah, e quando voltar lhe darei um aumento! Sei bem como um bebê a caminho gera despesa! - Disse sorrindo.
- O senhor é o melhor! Muito obrigado mesmo, minha esposa ficará radiante! - Cleiton chorava de novo, mais dessa vez de felicidade.
- Então, vá fazer as malas e curta bem suas férias! - Me coloquei de pé, assim como ele e apertamos as mãos.
Logo ele deixou meu escritório e novamente eu me encontrava sozinho, caminhei até o frigobar e quando ia me servir de uma dose de whisky, uma batida na porta me impediu.
- Entre! - Disse e me virei, dando de cara com Erick, que entrava risonho.
- Com licença senhor, se me permite a pergunta... O que houve com Cleiton? - Pela maneira como ele sorria já devia imaginar que coisa ruim não era.
- Ainda estamos nessa de "se me permite"? Qual é Erick, somos amigos! - Servi o whisky em dois copos e entreguei um para ele que prontamente recusou. Ele realmente levava a sério seu posto de chefe de segurança e jamais bebeu em serviço, nem mesmo em minha companhia - Eu dei férias a ele e prometi aumento de salário, o cara vai ser pai!
- Que generosidade, sr. Bragança! - Erick sorriu e logo viu as chaves do carro sob minha mesa - O senhor vai sair? 
- Ah, sim! - Respondi - Irei visitar meu filho e consertar as coisas com a Melinda!
- Essa casa sente falta da sra. Bragança! - Erick disse com certa doçura.
- Ei, cuidado com esse atrevimento em cima da minha mulher hein - Falei e ambos caímos na risada.
- Agora que deu férias ao Cleiton, quem irá dirigir? - Erick me olhou com aquele olhar de seriedade.
- Eu! - Ergui o copo de whisky, no mesmo instante em que ele o tomou de minha mão e trocou por uma garrafa de água - Ei!
- Direção e bebida não combinam senhor! Só quero garantir que chegue sã a salvo ao seu destino!
- Um copo, não faz mal.. Mais ok! - Revirei os olhos e dei um gole mísero na água - Bom, tenho que ir! 
- Vou pedir que alguém me acompanhe na sua escolta! - Erick já falava se afastando.
- Não é necessário! Hoje quero sair pelas ruas como um homem comum, sem escolta, sem segurança, sem motorista particular! - Falei enfatizando a palavra segurança e o olhando.
- Mais senhor...
- Sem mais! Está decidido! - Passei por ele dando-lhe um leve tapinha nas costas e fui até meu carro.
Logo que adentrei o mesmo, apertei firme o volante e quando liguei o motor e senti aquele leve tremer do automóvel, me senti tão alegre quanto um garoto na casa dos 20 anos com seu primeiro carro. Eu quase havia me esquecido, o quão prazeroso é essa sensação de dirigir. Liguei o som e logo uma música começou a ecoar pelos falantes, abaixei um pouco o volume ou poderia ser detido por perturbação.
Segurei firme o volante e logo minha nave deslizava sob o asfalto da cidade.
Parei numa floricultura e comprei rosas azuis, as preferidas de Melinda e um buquê de margaridas, para entregar a Pedro. Eu estava animado, sentia dentro de mim que tudo daria certo e que a felicidade estava a alguns passos de mim novamente.
Tentava sem êxito algum, acompanhar a música que o cantor cantava a plenos pulmões. Eu jamais compreenderia de onde vinha tanto fôlego. Decidi então apenas apreciar a melodia viciante e estrondosa.
Parei no sinal vermelho e notei que havia uma mensagem em meu celular, o peguei nas mãos e era da minha princesa, Maya.

"Vou para um luau mais tarde com meus amigos, por favor não me espere acordado! Beijos, Maya!"

Essa garota um dia ia acabar com meu juízo. Ela costumava ser uma menina tão doce, carinhosa. Porém ultimamente, a sinto meio distante, sem contar que sempre está ocupada com algum compromisso que ela nunca revela qual é.
Bom, sinto em te informar querida, mais esperarei acordado e teremos uma boa conversa mocinha! Meu subconsciente bolou a mensagem que meus dedos começariam a digitar, mais uma buzina me tirou o foco e jogando o celular no banco do passageiro, acelerei com o carro, sem notar que o sinal ainda estava no vermelho.
Houve muito barulho e um impacto que fez meu carro capotar diversas vezes, o ar-baig inflou e o som continuava a tocar mesmo quando o carro parou de cabeça para baixo. Um tilintar na minha cabeça, deixou-me surdo e uma dor insuportável doía em todo meu corpo. Tudo ao meu redor era sangue, vidro e fumaça, e aos poucos eu fui perdendo a consciência, tendo um último vislumbre do parabrisas funcionando sob um vidro estilhaçado e manchado com meu sangue.

 Tudo ao meu redor era sangue, vidro e fumaça, e aos poucos eu fui perdendo a consciência, tendo um último vislumbre do parabrisas funcionando sob um vidro estilhaçado e manchado com meu sangue

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Um Anoitecer (Livro lll - TRILOGIA FASES DO DIA)Onde histórias criam vida. Descubra agora