Capítulo 28

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Joana

- O que aconteceu minha filha? - Meu pai perguntou assim que desceu de sua caminhonete e veio em minha direção, com o semblante preocupado. Entretanto o leve tremor de suas mãos, quando tocou meu rosto, entregou o quanto estava alterado e mesmo sem saber o que havia acontecido para me encontrar sentada na calçada aos prantos, meu pai já deixara a raiva tomar conta dele e estava pronto para fazer o culpado pagar.
- Pai! - Exclamei assim que o vi diante de mim, e me coloquei de pé, me jogando em seus braços para ser recebida por seu abraço acolhedor.
- Estou aqui, meu amor - Ele dizia enquanto acariciava meu cabelo - Venha! - E me puxou para me sentar num banco que havia ali próximo - Me conte o que houve? Por que está chorando?
- Pai, eu... - Comecei a dizer, mais fui interrompida por alguém que me chamava pelo nome. Me virei fazendo com que meus olhos focassem em Hugo, vindo até nós com a expressão entre aliviado e constrangido.
Me coloquei de pé, cruzando os braços sob o peito, e senti meu pai também ficar de pé e se aproximar de mim, segurando-me pela cintura, como uma forma de demonstrar proteção. Ele sempre se deu muito bem com Hugo, lembro-me das vezes em que eles assistiam aos jogos de futebol as quartas e depois perdiam a noção do tempo, conversando sobre a partida enquanto consertavam o velho carro do meu pai. Portanto, me asseguro em dizer que essa atitude dele agora, foi devido ao seu instinto paternal, que devo admitir, jamais falhou e eu me sinto a filha mais sortuda do mundo por tê-lo.
- Sr. Rodrigues! - Hugo o cumprimentou ao ficar frente a frente conosco, porém meu pai, não apertou sua mão que estava estendida e tão pouco respondeu seu cumprimento, exceto por um breve aceno de cabeça - Não esperava vê-lo, por aqui... - Hugo recolheu a mão ao notar que desta vez não receberia um caloroso aperto de mãos, e as enfiou nos bolsos de sua calça desbotada.
- O que você quer Hugo? - Me apressei em perguntar, antes que o clima por aqui ficasse ainda mais pesado.
- Eu... - O vi olhar para os seus pés, talvez envergonhado, e chutar uma pedrinha -...queria conversar com você!
Não sei se foi o modo como ele falou, ou então por eu ter ficado tensa, que meu pai pôde compreender que o estado em que ele me encontrou, tinha algo a ver com Hugo. Ele prontamente me puxou para trás dele e encarou o mesmo, com um olhar furioso.
- O que foi que você fez com a minha filha? - Mesmo o vendo pelas costas, podia claramente saber o quão sua expressão estava fechada e eu podia sentir emanar dele toda raiva.
- Pai, tá tudo bem! - Tentei acalmá-lo, mas era como se eu estivesse falando com uma pedra. Ele sequer se moveu, ainda esperando uma resposta.
- Eu... Eu não fiz nada senhor! - Hugo alternava o olhar do meu pai para mim, e depois de volta para o meu pai, como num pedido de socorro.
Mesmo que aquelas palavras me causavam desconforto, pois ele poderia sinceramente explicar que tudo não passou de um mal entendido e que ele havia errado, mais se arrependera.. Mas não, preferiu se fingir de desentendido e inocente! Mesmo assim, me coloquei na frente do meu pai, entre Hugo e ele, e depositei minhas mãos sob seu peito. Quando notei que ele ainda não desgrudava os olhos de seu alvo, segurei seu rosto e o forcei a olhar para mim.
- Pai, tudo bem! - Garanti e o vi suspirar e me olhar no fundo dos olhos, encontrando a verdade, que eu estava sendo sincera com ele - Depois te explico tudo, mas agora deixe-me falar com o Hugo... A sós! - Acrescentei quando ele apenas me observava em silêncio - Me espera no carro, tá bem? - E sabendo que somente minhas palavras não acalmariam a tempestade que acontecia em seu interior, eu me equilibrei na ponta dos pés e levemente depositei um beijo em seu rosto. Quando o olhei novamente meu pai, mantinha os olhos fixos em mim, mais seu semblante já aparecia bem mais tranquilo. Posso dizer, que quase vi um sorriso no canto de seus lábios, porém ele novamente endureceu o olhar e focou em Hugo, parado poucos passos de nós e nos olhava sem qualquer expressão.
- Nossa conversa não terminou! - Meu pai alertou, apontando o dedo para ele. Depois se virou para mim e me beijou o topo da cabeça, com doçura, não mais parecendo aquele leão pronto para o ataque de alguns segundos atrás - Estarei no carro, se precisar já sabe! - E lançando uma última olhada para Hugo, andou até o carro e adentrou o mesmo, batendo com força a porta.
Eu por minha vez, o observava enquanto minha mente tentava processar as palavras certas para dizer, entretanto lá no fundo eu sabia que estava tentando me esquivar de ter aquela conversa agora, não era pra tanto que havia pedido um tempo para ele. Pois os recentes acontecimentos ainda estavam muito frescos e vivos dentro de mim, o que me fazia incapaz de tomar qualquer decisão prontamente, já que eu jamais me deixaria levar pelo sentimento de tristeza ou até mesmo de mágoa.
Me virei de frente a Hugo, e ele me encarava um tanto amedrontado, respirei fundo e o vi se aproximar um passo a mais.
- Olha, eu sei que errei mais.... - Ele dizia enquanto passo a passo se colocava mais próximo de mim, até estar perto o suficiente para pegar em minhas mãos - Me perdoa!
Senti novas lágrimas começando a se formar e fechei os olhos, com a intenção de contê-las. Por ser uma seguidora de Cristo, Hugo tinha a certeza de que eu jamais seria capaz de lhe negar o perdão. E mesmo isso sendo completamente verdade, eu também tinha meu lado falho e humano, que gritava enlouquecidamente para me afastar o mais rápido possível dele. Por isso, eu havia lhe pedido um tempo sozinha. Dessa forma seria apenas eu e Deus, e tinha a convicção de que somente o Senhor, poderia me mostrar o melhor a fazer. Agora, aqui, diante de Hugo e com tantas emoções e pensamentos me rondando, eu poderia agir de uma maneira que me arrependeria posteriormente. Por isso, mais uma vez respirei fundo e abri meus olhos, o olhando decidida.
- Sabe que perdôo! Mais, Hugo.... - Falei olhando para nossas mãos entrelaçadas e me mantendo firme em minha decisão, o soltei, me afastando - Eu realmente preciso por a mente em ordem e acalmar o coração, aí sim poderemos sentar e conversar sobre...nós!
- Então, não é um adeus? - Ele perguntou com um sorriso querendo apontar em seus lábios e um brilho no olhar.
- Não! - Confirmei com a voz e com a cabeça - Vejamos como um até logo!
E sem aviso prévio, ele me abraçou e eu não pude negar o quão confortável eu me sentia em seus braços, então me permiti retribuir.
- Então, até logo Joana! - Ele me disse sorrindo, ao se afastar.
Eu apenas sorri em resposta, um sorriso que não chegava aos olhos.
Me virei e entrei na caminhonete, colocando meu cinto e soltando o ar que eu nem sabia que havia prendido.
- Tudo bem? - Meu pai me olhava cauteloso.
- Sim! Vou ficar bem! - O olhei sorrindo, mesmo tendo os olhos inundados pelas lágrimas e o vi, ainda não convencido, dar partida no carro e nos levar de volta para casa.
Fizemos o trajeto todo em silêncio, mais interiormente eu estava numa conversa particular com Deus. Mesmo tendo consciência de que Ele, sabia de tudo, eu me sentia mais leve em lhe contar como eu estava me sentindo em relação a tudo e sabiamente lhe pedia conselhos, pedia que Deus me mostrasse o que fazer.
Foi nesse momento que abri minha Bíblia, que estava dentro da minha bolsa, em meu colo. Deus me guiou até Mateus 4 ; 22.

"Pois nada há de oculto que não venha a ser revelado, e nada em segredo que não seja trazido à luz do dia."

Naquele instante não consegui compreender qual o plano de Deus, ao me fazer ler aquele versículo, mais de algo eu sei, Ele sempre tem um propósito para tudo e sentia em meu coração que logo entenderia o que aquela palavra rápida queria me passar.

Um Anoitecer (Livro lll - TRILOGIA FASES DO DIA)Onde histórias criam vida. Descubra agora