Trinta E Três

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Tomo um banho gelado e me agasalho inteira, o motivo era a merda da febre, meu sistema imunológico esta causando isto na luta contra o vírus. A febre só não pode ficar muito alta, caso contrário é hospital na certa.

Tomo os malditos remédios antirretrovirais e me deito.

- Lua? - Ouço alguém me chamar, abro meus olhos assustada e vejo Gustavo, parado de frente para mim.

Acho que ele também se assustou.

- Oi, eu dormi - Me sento na cama sentindo cada parte do meu corpo doer.

- Onde esta Mayara? Ela te deixou sozinha? - Pelo seu tom de voz ele não pareceu gostar.

- Foi a um chá com a Rose

- Ela não deveria ter lhe deixado sozinha. Sinceramente? Eu não entendo essa amizade, uma fala da outra por trás. - Diz, nervoso.

Acho que Rose o irrita mais do que a mim.

- Tudo bem, não sou uma criança. Sei me cuidar, Guto.

Ele se senta ao meu lado, notei uma enorme bolsa branca em cima da poltrona e a outra menor estava em sua mão.

- É para você, bom, na verdade todos são de certa forma - Ele se referiu aos demais presentes.

Era incrível como ele fazia absolutamente tudo para me agradar.

Quatro meses depois...

Mantive meus olhos fixos ao de Mayara que parecia mais nervosa que eu. Senti a agulha entrar e por pouco não me mexi. Após a pequena seção de agulhas em minha espinha, me deitaram rapidamente. Enquanto me colocavam a sonda senti minhas pernas pensarem como nunca.

Interromperam minha gravidez aos oito meses pelo bem do bebê, eu estava com três de dilatação e se esperassem mais, iriam vir as contratações o que faria o nível de sangue na placenta aumentar, correndo o risco da minha filha contrair a doença.

Gustavo quis entrar para assistir o parto mas Mayara seria a mãe, não é mesmo? Nada mais justo. Ela segurava minha mão a todo o tempo até que começou a chorar sem parar. A minha enorme vontade de dormir me atrapalhava. Fou então que vi o motivo dos soluços de Mayara, era moreninha, cabeluda, e chorona.

- Olha a sua princesa, mamãe - A doutora veio até a mim, me mostrando aquela coisinha linda.
Impossível não amar.

- Ela... Ela é a mãe - Me refiro a Mayara que chorava como nunca.

- Meu Deus - Mayara disse limpando seu rosto - Ela é linda.
- É a maior bebê do dia - Completou a doutora.

- Não parece com você, Lua.

Infelizmente ela disse aquilo, sem querer mas disse. Talvez ela tenha esquecido que o pai foi um monstro que me fez sofrer.

Não demorou para que eu fosse para um quarto isolado das outras mamães, essa é a triste realidade. No quarto onde eu estava havia mais uma mulher com Hiv. Optei por dormir assim qie chegamos ao quarto, eu já não aguentava mais segurar o sono.

- Cuidado, é assim - Ouço alguém dizer, bem de longe

Abro meus olhos e vejo Gustavo com o celular apontado para o pai que estava com a bebê no colo e Mayara ao lado.

A foto foi tirada e logo ela pega a bebê de seu colo. Como eu fui proibida de amamentar, facilitou para a nova mamãe da pequena dar a mamadeira a ela.

Se me perguntarem se eu me arrependo de ter dado minha filha, a resposta sempre será não. Há um sentimento, óbvio ela veio de mim mas foi impossível olhar para a criança e não lembrar de tudo o que passei. Infelizmente eu não terei condições psicológicas para criar essa bebê, e também eu jamais seria capaz de acabar com a alegria desses dois que me abrigaram tão bem. Após Gustavo brigar com Mayara por ela ter me deixado sozinha a alguns meses atrás, ela deu ordens para que Rose não fosse até sua casa, enquanto eu estivesse ali.

- Dorminhoca - Gustavo veio até a mim. Seu sorriso era simplesmente o mais bonito que já vi.

- Minha mãe, vem? - A saudade da minha rainha era maior que tudo.

- Amanhã, Carol e ela virão. Parabéns, amor ela é linda

Agradeço com um breve sorriso.

Os homens tiveram que sair do quarto porque a enfermeira veio analisar outra mãe e a mim. Peko jeito que a mulher andava o parto foi normal

O bebê dela estava infectado.

Foi uma luta para ir tomar banho, quem me ajudou foi Mayara que lavou até meus cabelos. A cesariana é algo muito difícil, na hora não se sente nada mas o pós parto é o pior, sem dúvidas.

Me sento na cama enquanto Mayara pentea meus cabelos. Observo aquela bebê dormindo, parecia tanto com aquele homem desprezível. Minha parte eu já fiz, não me tornei uma assassina, eu lutei, carreguei o fruto de um estupro dentro do meu útero mas agora ninguém pode me obrigar a criar.

- Você me acha uma pessoa ruim? - Pergunto atraindo a atenção de Mayara.

- Claro que não, lua. Olha que você esta fazendo por mim - Diz com a voz carregada de emoção.

- Eu não iria conseguir criar ela.
- Luara - Ela se põe de frente para mim - Você poderá ver nossa filha sempre que quiser, se preferir é claro.

- Obrigada. Por me ajudar tanto, não sei como retribuir.

Ela pensa por alguns segundos e ri.

- Mas eu sei como.

- Hãm? - Pergunto sem entender.

- Tire meu Guto dessa agonia, ele gosta muito de você Luara. Permita-se viver novamente.

Olhei para a mamãe que dividia o quarto comigo, ela estava dormindo.

- Mas como eu vou ter um relacionamento se não consigo deixa ele me tocar? - Digo envergonhada.

- Isso é um detalhe, e pode ser reversível. Você só precisa se entregar e deixar ele te ajudar nas demais coisas.

Não digo nada, mas compreendo cada palavra que ela diz. Já esta na hora de viver um pouco mais. Tentar jogar fora essa bagagem de culpa e dor que esta dentro de mim.

Neurótico uma paixão obsessiva (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora