Capítulo DEZENOVE

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--Que musica é essa?

--Trust, The Cure.—Nicko respondeu. Acariciando o cabelo de Petra. Estavam deitados no sofá de seu quarto.

--Humm, gostei.—disse, deitada no peito dele.—Meu pai vai ficar bem?

--Não sei, mas eu sei que estou aqui pra cuidar de você.

--O que vou fazer sem ele, Nicko?

--Você tem 18 anos Petra, vai ter o mundo pra conquistar.—sussurrou. E de repente sentiu-se doente pelo que estava dizendo. Apertou-a contra si.

--O mundo? Não sei se quero o mundo, Nicko.

--Vai querer.

--Quero apenas que tudo acabe, e meu pai fique bem.

--Ás vezes, as pessoas que nós amamos tem que partir. Mas cabe aos que ficam preservarem a memória dele aqui.

--Eu o amo, não posso deixá-lo partir.

--Isso não está nas nossas mãos, Petra.

--Quero voltar, Nicko. Quero ir para o hospital.

--Eu te levo.

--Obrigada.

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--Como ele está?—Gremory perguntou.

--O sr. Door não viverá muito.—Nicko disse.

--Será melhor assim.

--Melhor para nós.—Nicko rosnou—E para ela?!

--Nicolai, ela precisa estar livre de tudo que a prende aqui na Terra.

--Mas matá-lo?!

--Não vai sujar suas mãos dessa vez.—Gremory o lembrou. Nicko abaixou a cabeça pesaroso. Perdas e sacrifícios nunca lhe importaram tanto quanto agora. Fechou as mãos em punho.

--Não, Gremor. Eu faço.

--Tem certeza?

--Ele sofrerá menos se for eu a fazê-lo.

--Que seja.

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Assim que o Dr. Grey entrou na sala de espera, e a fitou com pesar, algo nela afundou. Sentiu seu coração falhar batimentos incontáveis e uma tontura a atingir com força de um furacão. De repente, já não ouvia mas as vozes que pareciam lhe chamar. Sentiu algo em seu braço, e tentou focalizar no rosto a sua frente. Em vão. Não sentia nada, a não ser o vazio da notícia que já sabia qual era.

--Fizemos o possível.—ouviu dizer—Mas quando chegamos, ele já havia partido.

Seu pai, Bob Door partiu.

--Sinto muito pela sua perda, Petra.—a vizinha de Petra transmitiu seus pêsames. Quantas vezes ela já havia escutado aquela frase hoje? Se perguntou.

O velório ficou aos cuidados de Willie, que resolveu tudo rápido. Ele permaneceu ao seu lado em todo momento. Já no final, Nicko apareceu acompanhado por Gremory.

--Olá, Petra.—Gremory falou, pousando a mão em seu ombro lhe dando um olhar de compreensão. Petra sorriu, debilmente. Aliviada por não escutar a mesma frase que vinha escutando.

Nicko permaneceu em seu lugar atrás de Gremory, e apenas a olhou de modo terno. Petra estranhou a distância mas logo outra pessoa veio até ela e a distraiu.

Ao final da cerimônia, todos foram se dispersando. Mas Petra permaneceu em frente ao túmulo de seu pai. Ajoelhou-se no chão úmido, e tocou a lápide.

--Por que você me deixou papai?—perguntou, lágrimas rolando por seu rosto—O que faço agora? Não tínhamos planejado minha vida sem você.—soluçou, limpando o rosto—Isso tudo é uma droga.

Alguém tocou seu ombro.

--Petra, é melhor irmos pra casa.—Willie falou. Petra o olhou. Aquela frase estava errada. A casa de Willie não era a mesma que a dela.—Está ficando tarde e o tempo mais frio.

--Não, obrigada, Willie. Vou ficar com meu pai.

--Escute Petra, eu sei que é difícil. Já tive minha cota de perdas, sei o quanto doí. 

--Ele se foi, Willie. Ele sabia que ia morrer.—Petra murmurou—E eu não fiz nada.

--Não poderia. Ninguém poderia.

--Pode ir.

--Não vou sem você. Prometi ao seu pai que cuidaria de você.

--Não vou pra sua casa.—ela disse, e sentiu-se mal por aquilo.—Desculpe, fui grossa.

--Tudo bem.—ele deu de ombros.—Vamos fazer o seguinte, eu te levo pra comer algo e te deixo em casa. Sua casa.

Petra ponderou. Não estava com fome. Mas não queria ser grosseira com Willie. Ele não tinha culpa. Recordou que há apenas pouco tempo, ele havia perdido a esposa num acidente. Levantou e deixou que ele a levasse embora.

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Já havia se passado duas semanas desde que Bob havia falecido. E exatos 14 dias que Petra não tinha notícias de Nicko.

A primeira semana tinha sido difícil. Passava horas chorando, e nos intervalos adormecia sem forças. Não comia muito. Mas Izzy ou Willie apareciam regularmente lhe trazendo comida e apoio. Mas não queria ser um estorvo, então pediu que a deixassem em paz. Willie havia lhe oferecido algumas semanas de folga. Até que estivesse pronta para voltar a trabalhar.

Desceu as escadas de sua casa, seus passos soando sobre o velho piso. Lembrou-se das noites que chamara por Nicko e ele não apareceu. Encheu um copo com água, e encostou na pia. Desde que seu pai havia morrido, notara que ele estava diferente. Distante.

Talvez Nicko não lida-se bem com perdas. Ou talvez queria lhe dar um tempo. Fechou os olhos, sentindo-se trêmula. Queria ele. Queria ele ao seu lado agora, independente de qualquer "talvez".

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--Quanto tempo mais vai ficar se martirizando?

Nicko fitou Gremory por sob os cílios, e voltou a se concentrar no livro que lia. Apesar de não enxergar uma mínima palavra a sua frente.

Gremory suspirou, e tirou o livro das mãos de Nicko.

--Nicolai, vá para Petra.

--Não posso.

--Ora, ela está clamando por você há dias e você fica enterrado aqui se lamentando por algo que não deveria.

--Não deveria me sentir sujo por matar a pessoa que ela mais amou? Por matar o homem que confiava em mim?!—ele explodiu.—Eu deveria protegê-la, e o que fiz?

--O certo.

--Certo, Gremor?—ele repetiu—Há algum tempo me pergunto o que está certo ou não...

--Apenas obedeça e siga o que as revelações tem nos mostrado.

--Você acredita em tudo que ver e ouve?

--Tenho fé.

--Fé.—Nicko disse, caminhando até a extremidade do quarto, oposto a Gremory.

--Nithael temos pouco tempo agora.—ele revelou. Nicko sentiu-se enrijecer. Pois sabia do que Gremor estava falando.--Você precisa trazê-la pro nosso lado agora.

Nicko respirou fundo ciente do que aquilo significava.

Uma sentença.

--Eu o farei.

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