XIII. Da duração do processo e da prescrição

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     Quando o delito é constatado e as provas são certas, é justo conceder ao acusado o tempo e os meios de justificar-se, se lhe for possível; é preciso, porém, que esse tempo seja bastante curto para não retardar demais o castigo que deve seguir de perto o crime, se se quiser que o mesmo seja um freio útil contra os celerados.

     Um mal entendido amor da humanidade poderá condenar logo essa presteza, a qual, porém, será aprovada pelos que tiverem refletido sobre os perigos múltiplos que as extremas procrastinações da legislação fazem correr à inocência.

     Cabe exclusivamente às leis fixar o espaço de tempo que se deve empregar para a investigação das provas do delito, e o que se deve conceder ao acusado para sua defesa. Se o juiz tivesse esse direito, estaria exercendo as funções do legislador.

     Quando se trata desses crimes atrozes cuja memória subsiste por muito tempo entre os homens, se os mesmos forem provados, não deve haver nenhuma prescrição em favor do criminoso que se subtrai ao castigo pela fuga. Não é esse, todavia, o caso dos delitos ignorados e pouco consideráveis: é mister fixar um tempo após o qual o acusado, bastante punido pelo exílio voluntário, possa reaparecer sem recear novos castigos.

     Com efeito, a obscuridade que envolveu por muito tempo o delito diminui muito a necessidade do exemplo, e permite devolver ao cidadão sua condição e seus direitos com o poder de torná-lo melhor.

     Só posso indicar aqui princípios gerais. Para fazer sua aplicação precisa, é mister considerar a legislação existente, os usos do país, as circunstâncias. Limito-me a acrescentar que, para um povo que reconhecesse as vantagens das penas moderadas, se as leis abreviassem ou prolongassem a duração dos processos e o tempo da prescrição segundo a gravidade do delito, se a prisão provisória e o exílio voluntário fossem contados como uma parte da pena merecida pelo culpado, chegar-se-ia a estabelecer assim uma justa progressão de castigos suaves para um grande número de delitos.

     Mas, o tempo que se emprega na investigação das provas e o que fixa a prescrição não devem ser prolongados em razão da gravidade do crime que se persegue, porque, enquanto um crime não está provado, quanto mais atroz, menos verossímil é ele. Será preciso, pois, às vezes, reduzir o tempo dos processos e aumentar o que se exige para a prescrição.

     Esse princípio parece, à primeira vista, contraditório em relação ao que estabeleci mais acima, e segundo o qual podem aplicar-se penas iguais para crimes diferentes, considerando como partes do castigo o exílio voluntário ou a prisão que precedeu a sentença. Procurarei explicar-me com mais clareza.

     Podem distinguir-se duas espécies de delitos. A primeira é a dos crimes atrozes, que começa pelo homicídio e que compreende toda a progressão dos mais horríveis assassínios. Incluiremos na segunda espécie os delitos menos hediondos do que o homicídio.

     Essa distinção é tirada da natureza. A segurança das pessoas é um direito natural; a segurança dos bens é um direito da sociedade. Há bem poucos motivos capazes de levar o homem a abafar no coração o sentimento natural da compaixão que o desvia do assassínio. Mas, como cada um é ávido de buscar o seu bem-estar, como o direito de propriedade não está gravado nos corações, sendo simples obra das convenções sociais, há uma porção de motivos que induzem os homens a violar tais convenções.

     Se se quiser estabelecer regras de probabilidade para essas duas espécies de delitos, é preciso colocá-las sobre bases diferentes. Nos grandes crimes, pela razão mesma de que são mais raros, deve diminuir-se a duração da instrução e do processo, porque a inocência do acusado é mais provável do que o crime. Deve-se, porém, prolongar o tempo da prescrição.

     Por esse meio, que acelera a sentença definitiva, tira-se aos maus a esperança de uma impunidade tanto mais perigosa quanto maiores são os crimes.

     Ao contrário, nos delitos menos consideráveis e mais comuns, é preciso prolongar o tempo dos processos, porque a inocência do acusado é menos provável, e diminuir o tempo fixado para a prescrição, porque a impunidade é menos perigosa.

     É mister, igualmente, notar que, se não se atender a isso, essa diferença de processo entre as duas espécies de delitos pode dar ao criminoso a esperança da impunidade, esperança tanto mais fundada quanto o crime for mais hediondo e, portanto, mais verossímil.

     Observemos, porém, que um acusado solto por falta de provas não é nem absolvido nem condenado; que pode ser preso de novo pelo mesmo crime e submetido a novo exame, se se descobrirem novos indícios do seu delito antes de terminar o tempo fixado para a prescrição, segundo o crime cometido.

     Tal é, pelo menos ao meu ver, o critério que se poderia seguir para preservar ao mesmo tempo a segurança dos cidadãos e a sua liberdade, sem favorecer uma em detrimento da outra. Esses dois bens são igualmente patrimônio inalienável de todos os cidadãos; e ambos estão cercados de perigos quando a segurança individual é abandonada ao capricho de um déspota e quando a liberdade é protegida pela desordem tumultuosa.

     Cometem-se na sociedade certos crimes que são ao mesmo tempo comuns e difíceis de constatar. Desde então, pois é quase impossível provar tais crimes, a inocência é provável perante a lei. E, como a esperança da impunidade contribui pouco para multiplicar essas espécies de delitos, que têm todos causas diferentes, a impunidade raramente é perigosa.

     Nesse caso, podem, pois, diminuir-se igualmente o tempo dos processos e o da prescrição.

     Mas, segundo os princípios aceitos, é principalmente para os crimes difíceis de provar, como o adultério, a pederastia, que se admitem arbitrariamente as presunções, as conjecturas, as semiprovas, como se um homem pudesse ser semi-inocente ou semi-culpado, e merecer ser semi-absolvido ou semi-punido!

     É sobretudo nesse gênero de delitos que se exercem as crueldades da tortura sobre o acusado, sobre as testemunhas, sobre a família inteira do infeliz de quem se suspeita, segundo as odiosas lições de alguns criminalistas, que escreveram, com fria barbárie, compilações de iniqüidades que ousam apresentar como regras aos magistrados e como leis às nações.

     Quando se reflete sobre todas essas coisas, é-se forçado a reconhecer com amargura que a razão quase nunca tem sido consultada nas leis que se deram aos povos. Os crimes mais hediondos, os delitos mais obscuros e mais quiméricos, e portanto os mais inverossímeis, são precisamente os que se consideram constatados sobre simples conjecturas e indícios menos sólidos e mais equívocos. Dizer-se-ia que as leis e o magistrado só têm interesse em descobrir um crime, e não em procurar a verdade; e que o legislador não vê que se expõe constantemente ao risco de condenar um inocente, pronunciando-se sobre crimes inverossímeis ou mal provados.

     À maioria dos homens falta essa energia que produz igualmente as grandes ações e os grandes crimes, e que traz quase sempre juntas as virtudes magnânimas e os crimes monstruosos, nos Estados que só se mantêm pela atividade do governo, pelo orgulho nacional e pelo concurso das paixões pelo bem público.

     Quanto às nações cujo poderio é consolidado e constantemente sustentado por boas leis, as paixões enfraquecidas parecem mais capazes de manter a forma de governo estabelecida do que de melhorá-la. Daí resulta uma conseqüência importante: que os grandes crimes nem sempre são a prova da decadência de um povo.

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