O dia para já estava raiando quando eu me aproximei da muralha interna de Dakar, o tempo estava correndo e eu tinha menos de uma semana entrar naquele lugar, achar o que eu precisava e ir para o lago de cristal.
Comecei a fazer uma ronda pela cidade, precisava bolar algum plano para entrar no segundo muro e algo me dizia que não seria tão fácil como o primeiro.
As pessoas já começavam a acordar e a sair na rua, que aos poucos ia se enchendo, reparei que as pessoas dali se vestiam com trajes mais requintados do que as que moram do lado de fora da muralha.
Algumas casas perto do segundo muro eram verdadeiras mansões, deduzi que deveriam ser de pessoas que faziam parte da corte de Dakar. Ao passar por uma dessas casas, escutei o relinchar de cavalos vindo do jardim na lateral de uma delas.
Me aproximei da grade de ferro para olhar melhor e vi que um corcel malhado corria solto pelo terreno, ele era magnífico. Deveria ter fugido do estábulo, mas com o barulho que estava fazendo logo algum empregado iria ali busca-lo.
Olhei para os dois lados da rua e não vi ninguém passando, subi pelas grades para dentro da propriedade chique, onde a mansão tinha uma cor amarelo claro, seu jardim estava bem cortado e macieiras estavam espalhadas por ele.
Fui em direção ao animal magnífico e ao passar por uma das macieiras, arranquei duas maçãs do pé que estavam vermelhas. Me aproximei lentamente, o animal reparou na minha presença e começou a empinar.
Tirei meu capacete e levantei minhas mãos para o alto, tentando acalmar o bicho, não desviei meu olhar do seu em nenhum segundo. Quando ele parou de pular, me aproximei devagar com uma das mãos estendidas, baixei meu olhar para o chão e então parei a menos de um metro de distância.
O cavalo bufou e bateu com uma das patas no chão, não mexi um centímetro de onde eu estava, então senti o seu focinho tocar na palma da minha mão enluvada.
Acaricie a cabeça do bicho e me admirei como era um animal lindo, mas conforme olhei para seu flanco vi marcas de chicote. Uma revolta e raiva me consumiram, como alguém tinha coragem de maltratar um ser tão belo e indefeso.
Meus olhos se encheram de lágrimas com o pesar do que aquele animal sofreu, num ímpeto de loucura peguei meu capacete e bolsa no chão e o montei, sem cela ou rédeas, para minha surpresa ele não protestou.
Montada no cavalo comecei a procurar uma forma de sair dali com o animal, foi então que vi que do outro lado do jardim uma cerca viva separava a rua da propriedade.
- Muito bem amigo, eu tenho uma ideia para te tirar daqui, mas você terá que me ajudar.
Como se me entendesse ele bufou e balançou a cabeça, segurando em sua crina, o incitei a começar a correr em direção ao muro de plantas, o corcel voava pelo jardim, sentia seu coração disparado e quando chegou a hora da verdade, ele deu um salto magnífico e aterrissou do outro lado do muro.
Eu estava eufórica com a adrenalina que percorria o meu corpo, o coloquei num meio galope para sairmos daquele lugar, um animal como aquele o dono daria falta e rápido.
Conforme ia cavalgando pelas ruas uma ideia para entrar na muralha me ocorreu, mas eu precisava deixar o cavalo em algum lugar, não podia arriscar que algum dos soldados internos o vissem, pois caso o nobre fosse reclamar eles me denunciassem.
Me afastei do muro interno e percebi que quanto mais próximo do muro externo, mais simples as edificações iam ficando. Já era quase hora do almoço, estava complicado eu andar a cavalo naquela cidade com as ruas abarrotadas de gente.
Parei um menino que corria pela rua e perguntei onde eu poderia deixar meu animal, ele me encarou e só depois deu lhe dar duas moedas de cobre, ele me apontou as direções de um estábulo.
O estábulo era simples, deveria comportar no máximo oito animais, mas somente três baias estavam sendo usadas. Um homem por volta de quarenta anos, junto com sua filha que era criança vieram me receber.
A criança já veio em direção ao animal enfiando as mãos em seu focinho, um calafrio me percorreu pois não sabia dizer se ele morderia a pequena, mas o animal apenas baixou a cabeça para deixa-la o acariciar.
- Preciso deixa-lo aqui durante alguns dias, quanto o senhor me cobra?
- Mas que belo Paint Horse que o senhor tem!
- Obrigado.
- Bom, esta fêmea precisa ser cuidada como rainha.
Desmontei do animal e me inclinei para olhar entre suas pernas, para constatar que era uma égua e não um garanhão. Afaguei sua crina branca longa e lhe dei um beijo no pescoço.
- Ela merece o melhor, o antigo dono a maltratava.
- Bom meu caro capitão, lhe cobrarei uma moeda de ouro por cada dia que ela for passar aqui.
Arregalei os olhos, aquilo era extorsão, nenhum estábulo valeria aquele preço e as poucas moedas que eu ainda tinha estavam acabando.
- Mas isso é um absurdo, lhe dou três moedas de prata por dia.
- Cinco moedas.
- Quatro e não falamos mais nisso.
O homem me olhou e então depois de pensar um pouco, resolveu aceitar o preço de quatro moedas de prata. Uma moeda de ouro equivalia a dez moedas de prata e a vinte de bronze.
Deixei a bela égua aos cuidados do homem e sua filha que não desgrudava dela, e então quando estava quase na rua ele se vira e me grita.
- Capitão, qual o nome dela?
Eu me virei novamente para o homem e ao olhar para o animal que me encarava, dei um sorriso.
- Ela se chama Gale.
Ao escutar o nome a égua relinchou, como se concordasse com o nome que eu acabara de dar para ela. Gale significava "ventania" na língua antiga e era perfeito para ela, que voou por cima daquele muro.
Meu teatro começava agora, assim que pisei na rua comecei a correr que nem uma desesperada em direção ao muro interno. Meu coração estava disparado e já podia sentir o suor começar a escorrer pelo meu rosto.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Rosa Negra - A Ordem da Rosa
FantasiaHistórias de amor, guerras e ódio foram sendo esquecidas e mudadas ao longo dos anos, entretanto, um assassinato em um vilarejo pacato, vai mudar a vida de Lia para sempre, a forçando redescobrir o que foi esquecido, pois o assassino está atrás dela...