Capítulo 42 - Madeleine

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Madeleine 

    Por aqui, é muito diferente de uma grande metrópole. Tem muita tranquilidade, tanto que parece que o tempo passa mais devagar. E eu amo isso.

É véspera de Natal, e estou sozinha em casa, já que Zalika levou a Lou para passear. Estou conversando com Ethan por Skype pelo notebook que coloquei em cima da mesa, para conseguir conversar com ele e fazer a comida para hoje a noite.

— Fala pra ele. — Digo para Ethan. — Não pode ficar se escondendo para sempre.

— Eu sei, Leine. Mas como vou explicar que não estou preparado? Isso o deixará arrasado. — Ethan fez uma careta.

— Ele vai entender que essa fase vai ser difícil para você. — Vou até a geladeira e pego o bacon. — Ser cauteloso em um relacionamento é uma coisa perfeitamente normal. 

— Mas fica mais difícil quando é um relacionamento gay. E quando os pais são evangélicos. — Ethan encolheu os ombros. — Nem todo mundo tem uma mãe francesa e um pai cabeça aberta.

— Falando na sua mãe... — Parei enfrente ao notebook. — Ela esta ligando mais vezes?

— Ela parou. Já tem um mês. — Ethan parecia um pouco triste. — Ela vive dentro de uma bolha, é extremamente individualista, e para conseguir entrar nessa bolha, não é fácil. Minha vó Delphine praticamente esta criando o meu irmão.

Era difícil isso, e eu realmente não posso falar nada. Nunca conheci Justine pessoalmente, e nunca nem falei com ela. Nunca podemos julgar alguém sem conhecer. Eu também tive e tenho falhas quando estou sendo mãe, e as vezes até acho que a Zalika faz um trabalho melhor do que eu. Eu sei disso, muitas vezes Louise prefere a Zalika quando esta chorando e ela sabe que eu as vezes não tenho paciência com birras.

— Seu pai vai para São Paulo amanhã. — Falei. — Já conversei com ele.

— E quando você vem?

— Vou demorar um pouco.

Começo a fritar o bacon no azeite, depois junto a cebola, o pão, e as castanha.

— Você precisa conhecer o Luiz. — Ethan falou. — Só falta você e a Lou para ele conhecer. Ele fala bastante que quer conhecê-las, já que eu falo bastante de vocês. Promete que não vai demorar, Leine.

Foi estranho quando ele me chamou de Leine pela primeira vez. Senti uma pontada de saudade e depois lembrei-me do Rogério, ele adorava me chamar de Leine. Rogério e minha mãe eram os únicos que me chamavam assim, e depois do que aconteceu acabei deixando esse apelido esquecido para sempre, até que um dia Ethan reviveu isso, mas eu não sinto nada ao ouvir ele me chamar assim, é como se fosse só mais um apelido. Antes eu sentia um nojo e só me fazia lembrar de sofrimento.

— Eu vi ela. — Ethan falou como se fosse um segredo. — Ela estava na Avenida Paulista com um casal, que eu acho que é os pais dela.

Continuei virada para o fogão ainda mexendo na panela com bacon, pego um pouco de sal e jogo na panela. Depois acrescento os ovos batidos e a salsa, e começo a misturar.

— E como ela esta? — Perguntei sem olhar para a tela do notebook. Mordisco meus lábios como forma de alivia a tensão.

— Bem. Todo o grupo gosta dela, lá na aula de violino. — Ethan falou. — Ela é adorável e carismática. Ela tem piadas ruins e realmente não consegue disfarçar o que sente, e isso é engraçado. Ela se adaptou fácil na escola. Você realmente não vai perguntar mais nada?

Faz cinco meses que o Ethan começou a fazer aula de violino com o meu pai Heitor e logo conheceu uma menina. Ele ligou para mim no mesmo dia e contou que tinha encontrado uma garota parecida comigo. No mesmo dia liguei para Heitor e perguntei se era verdade, e ele confirmou.  Depois ela começou a estudar na escola do Ethan, e as vezes ele me dar informações sobre ela, mesmo eu não perguntando.

— Perguntar o que?

— Tipo, você não quer saber o nome dela? — Ethan falou.

— Claro que não.

— Ela ainda é a sua filha.

 Coloco a panela em cima da mesa e começo a preparar o frango na pia. Pego uma panela pequena, coloco no fogo, e jogo um pouco de manteiga para derreter com o colorau.

— Sobre o seu problema com o Luiz, vá até os meus pais. — Falei. — Sei que eles vão adorar te dar conselhos, principalmente o Ben.

— Amanhã vou ligar para falar com a Lou. — Ethan falou antes de desligar.

Passei a tarde toda cozinhando. Untei o frango e fiz varias coisas. Fiz salpicão cremoso pensando nos gostos de Zalika, fiz arroz de forno, farofa, pernil ao molho de laranja, rocambole de carne moída, e fiz algumas sobremesas como o tiramissú, mousse de limão e pavê de morango.
Agora que terminei, estou sentada no sofá, com uma taça de vinho na mão. Não consigo parar de olhar para as fotos em cima da mesinha. O maior retrato sou eu no natal de 1987 onde estou vestida de Mamãe Noel enquanto abro meus presentes, era uma época muita boa. Não sei realmente como meu pai deixou essas fotos aqui, são tantas lembranças.
 Me levantei e fui até o quadro virada perto da televisão, coloquei minhas mãos nele. Ele estava pendurado na parede quando cheguei aqui, mas virei ele, não sei bem o porquê fiz isso, talvez eu realmente tenho medo da garota que fui antes. Respiro fundo e finalmente viro o quadro, e nele esta eu com quinze anos tocando violino. Virei o quadro e sentei novamente no sofá.
Logo ouvir vozes lá fora e percebi que o Theo tinha vindo com Zalika. Lou foi a primeira a entrar na sala e estava com um ursinho na mão e veio mostrar para mim.

— Quem te deu? — Perguntei com um sorriso no rosto.

— Ele. — Lou apontou para Theo que estava em pé perto da porta.

Lou correu, e acredito que foi atrás de Zalika na cozinha.
Theo ficou me olhando e depois se sentou ao meu lado no sofá.

— Você esta me evitando. — Theo suspirou.

No dia que contei ao Theo sobre o Rogério acabei me arrependendo quando cheguei em casa, chorei a noite toda. Parecia que uma voz me dizia que ele não ia me querer mais ou que sentiria pena de mim para o resto da vida.

— Conversei com o Ethan. — Me levantei e fui até a janela para fechar a cortina. — Falei que você vai embora amanhã.

— E você vai embora quando? — Theo perguntou.

— Isso não é tão fácil. Estou indo lá para o casamento da Zalika e vai demorar um pouco.

— Você está fugindo.

— Não vamos falar disso aqui.

— Não vou ficar lembrando do que aconteceu, entende? Não precisa fugir de mim.

Vou até a garrafa de vinho e coloco mais na taça.

— Vem cá, senta aqui. — Theo fala. E eu vou até ele. — Eu amo você. — Ele segura em minha mão. — E não estou falando isso da boca pra fora. Você quer casar comigo?

Fiquei boquiaberta. Me afastei dele e comecei a sorrir, sem entender nada. E ele parecia querer realmente uma resposta.

— Não, Theo. — Balancei a mão para ele. — Dessa vez não vamos fazer correndo. Nem namorando não estamos mais, apenas estamos ficando.

— Então não estamos namorando? — Theo levantou uma sombrancelha. — É isso?

— É isso.

O resto da noite foi um pouco tenso. Zalika ficava olhando pra mim e depois para o Theo.
No final, a Zalika foi dormir com a Lou.

— Eu também amo você. — Falei para o Theo enquanto caminhavamos na areia molhada. — Mas dessa vez vamos ir muito devagar. Vamos compartilhar segredos. Para se conhecer melhor.

— Realmente tem vezes que eu não te entendo. — Theo falou e começou a andar para a trilha que o leva para a hospedagem.

E eu não fui atrás dele. Fiquei apenas em pé de braços cruzados e olhando ele se afastar.
Ele realmente não quis me entender.

No Ritmo da Nossa Música{Concluído}Onde histórias criam vida. Descubra agora