Delta Green - 2/3

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O oceano abriga segredos dos quais a população mundial desconhece. Um deles era Abe, o homem-peixe criado pelo governo americano. Ele jamais surgiu em público, na tentativa de manter o sobrenatural afastado da população. No entanto, após descobrir a existência de segredos jamais revelados, nada mais importava. Agora Abe estava livre na superfície.

Abe se esgueirava pelos becos, sob as sombras dos arranha-céus criadas pelas luzes neons dos outdoors. Suas propagandas nacionalistas também eram exibidas em zepelins sobrevoando a cidade. O dia chuvoso, deixando o ar úmido e as ruas repletas de poças refletindo as luzes da cidade, era perfeito para um ser como ele. Logo alcançou o bairro desejado.

Tudo estava diferente do que se lembrava. As casas baixas e humildes estavam escondidas atrás dos enormes prédios, torres do capitalismo; um exibicionismo do poder dos ricos. Haviam viadutos novos, estradas magnéticas e praças arborizadas artificialmente das quais ele não se lembrava. Mas não teve tempo para admirar a paisagem. Caminhou por entre as vielas das casas mais pobres até alcançar a casa onde morou décadas atrás. Mas até ela estava diferente.

A porta, antes de madeira, agora era metálica, com uma interface touch. Não adiantaria tentar entrar por ela. Foi aos fundos da casa. Encontrou as janelas com grades, antes inexistentes. As janelas do andar de cima estavam sem grade, mas estavam fechadas. As debaixo não. Seria mais barulhento quebrar o vidro do que entortar as barras de ferro.

Utilizando sua força sobre-humana, Abe forçou as barras da grade até que entortassem para as laterais, abrindo espaço para que o homem-peixe pudesse entrar. Vislumbrou um cenário familiar, porém diferente. Os cômodos eram os mesmos, mas as paredes possuíam outra cor. Os móveis eram brancos, ao contrário da cor de mogno que se lembrava. Os eletrodomésticos também eram bem diferentes, mais modernos e tecnológicos. Onde antes havia uma TV de tubo, agora havia uma tão fina quanto uma folha de papel.

Abe subiu as escadas, indo em direção aos quatros. Olhou um por um, os encontrando vazios. Ao olhar o último quarto, o principal, encontrou um velho deitado em uma cama, coberto com um edredom até o peito. De fora do edredom estavam seus braços segurando uma espingarda em mãos.

— Pai... — disse Abe, aproximando-se lentamente.

— Eu sabia que um dia você ia aparecer... — disse o homem, abaixando sua espingarda. — Assim como eu me enganei, achando que fosse um bandido, você também se enganou... não é, irmão?

— Irmão?

— Não me reconhece, Abe? — o velho tossiu forte antes de continuar. — Sou Howard Legrand, seu irmão.

— Onde está o Ralph? — Abe perguntou. — Onde está meu pai?

— Olha pra mim, peixão! Não vê como eu tô velho? Você não envelhece, você não morre. Mas nós sim.

— Não... — Abe cambaleou para trás.

— É, garoto... Isso faz muitos anos. Você largou seu pai pra seguir as ordens do governo. Meus parabéns. E então, o que veio fazer aqui? Uma visita amigável que não foi. Não iam te deixar vir à toa.

— Não deixaram... Eu escapei.

— Se rebelou, é? Quem diria, hein. Vão acabar me matando quando encontrarem você aqui comigo — tossiu novamente. — Não que eu me importe de morrer, já tô velho demais...

— Preciso que me responda umas perguntas.

— Hum... Veio aqui pro meu pai te contar onde foi que ele te encontrou, não é?

Contos De Um Futuro EternoOnde histórias criam vida. Descubra agora