2.1. A primeira carta

107 38 161
                                    

Mariana, Minas Gerais, 22 de abril de 1767. Ao Meu Amado irmão Joaquim José.

Querido Irmãozinho,

Nem a mais profunda das filosofias forneceria os instrumentos conceituais necessários para eu expressar, por meio de palavras, a saudade, o carinho e a emoção que sinto ao lembrar de você e de nossa família.

Quando fecho os olhos, vejo nosso rebanho unido na Fazenda do Pombal. O papai com seus livros e planos de mineração, mamãe e sua devoção infinita pela Trindade e pelo sagrado; Maria Vitória tentando aprender segredos com mamãe e com os escravos; e você com bichos, plantas, brincadeiras e tantos planos. Nossos irmãos mais novos ainda iriam descobrir as alegrias da fazenda e da vida reta que viveríamos em família...

Te rogo, querido irmão, que agradeça mais uma vez ao Bigode pelos contatos e procedimentos realizados para que eu e Antônio entrássemos no Seminário. Deu certo e agora estamos em treinamento para que em breve, como representantes da Igreja, possamos combater o mal que tem contaminado esta terra e que adiou para o infinito o sonho de unidade de nossa família.

Tenho lido tanto na biblioteca da Igreja Central! Obras proibidas aos leigos, proibidas aos santos, proibidas a mim... Uma transgressão da qual não me arrependo.

Papai me ensinou muito sobre as origens de nossa família, nossa luta em Portugal contra os vampiros...

Esse pesadelo começou há cerca de 900 anos. Um homem luso, poderoso e versado nos segredos da energia oculta, foi seduzido pela miragem da imortalidade. Ele criou um feitiço da vida eterna, que resultou nessa doença mortal, essa catástrofe lamentável dos vampiros. Eles... eles são mortos vivos. O mago, chamado de o Original, gerou sete monstros. Sete abominações, vampiros de primeira classe, que chamamos de regibus, ou reis. Querem ser os reis do mundo, e vivem do sangue que extraem do pescoço de pessoas puras. São falsos monarcas e, com a bênção do sagrado, serão destronados!

Estes sete Regibus possuíam o poder de multiplicar o exército do mal. Para piorar, não conseguimos detectá-los, pois possuem aparência humana, são resistentes ao sol e podem praticar fortes magias. Somente eles criam alguns tipos de vampiros mais fortes.

Nossos estudos mostraram que, há quatro séculos, esses sete vampiros mataram o Original. Isso foi uma ótima notícia, pois eles perderam o poder de se replicar. Apenas o Original podia gerar novos regibus.

Nessa nova situação, sem a liderança clara, os regibus se dividiram em duas facções que vinham batalhando por territórios europeus e controle das práticas e espaços físicos de domínio dos vampiros. Pela primeira vez há uma guerra vampírica.

Há poucas décadas, em Portugal, nosso avô conseguiu eliminar um dos monstros. Agora, desses sete vilões principais a ser enfrentados, só temos que matar mais seis para eliminar todo o mal.

Tive acesso a Tomos em latim que descrevem a primeira grande guerra vampírica, por volta do ano 1200, três anos após a morte do Original. A limitada cognição humana denominou este fenômeno como "Peste Negra". Milhões de humanos pereceram numa voraz disputa de territórios, conduzida por dois grandes grupos de vampiros com ideias diferentes! Eles batalhavam entre si, não só pelo território, mas por almas e pelo líquido que querem sugar do pescoço humano.

As duas facções vampíricas tinham se fortalecido criando mais vampiros – um exército de reserva – mas, ao fazê-lo, ficavam sem alimento. Até que nossos estudos indicam que as facções vampíricas novamente se uniram em uma família – a Base de Sangue. Que organiza grupos gigantes de vampiros. Já tivemos conhecimento de grupos sociais de mais de mil vampiros. Nosso Senhor nos proteja de tão monstruosa engenharia social.

Depois da morte de nossos pais, as pessoas comuns acreditaram em ilusões sobre onças e doenças terem causado o falecimento. Essas quimeras que povoam a imaginação das pessoas são importantes, pois os vampiros atacam comunidades que sabidamente disseminam o conhecimento sobre vampiros.

Tenho feito estudos diários, enquanto nosso irmão Antonio mostra muita fé e devoção pelas rezas e santos. Ele tem dito que fará voto de silêncio para aumentar o próprio poder.

Em breve estaremos juntos! Algumas de minhas descobertas eu só poderei partilhar pessoalmente.

Um grande beijo do seu irmão!

Seminarista Domingos Filho

Tiradentes Jovem contra os VampirosOnde histórias criam vida. Descubra agora