3.9. O padre enviado

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Enquanto caminhavam até os arredores de Cuieté, onde o mascate havia deixado seu cavalo, Joaquim perguntou a Ana quem era a pessoa que ela estava buscando.

- Foi uma menina... Minha prima.

Era possível sentir a amargura na voz dela.

- Você era muito próxima dela?

- Muito... Como uma irmã. Ela tinha a minha idade. Não a vejo há mais de uma década...

- Pode me contar como aconteceu e por que a levaram?

Ela ficou em silêncio por um longo período. Depois, falou, sem muita convicção:

- Ela... Cada pessoa.. Tem um potencial sagrado, o mana, a essência que corre em nosso sangue. É uma fração do espírito de Deus e está presente em cada criatura viva. Minha prima é... Ela era especial. Com oito anos de idade, ela conseguia executar magias poderosas. A organização do Bispo Silva a levou. E desde então não a vimos mais.

Joaquim baixou a cabeça e preferiu não insistir na conversa. Ela completou:

- Mas estou otimista que ela está aqui no Mosteiro, e vamos resgatá-la, junto com seus irmãos!

***

Após cavalgarem por cerca de duas horas, chegaram no acampamento na Vila dos Aymorés. Já havia anoitecido e Pedro estava sentado ao lado de uma grande fogueira. Joaquim notou que o escravo não estava sozinho... Havia um padre ao lado dele!

- Patrão, encontrei este padre que quer nos ajudar nas buscas ao seu irmão - disse Pedrinho, levantando-se.

O fogo iluminava a face aguda e angulada do sacerdote. Joaquim reconheceu o seu perseguidor da noite anterior!

Tenso, pegou sua pequena espada, a Luz do Pombal.

- Calma, Senhor Joaquim. Sou o Padre Rolim, deixe-me falar! Estou do seu lado. – Disse o Padre, mostrando as mãos espalmadas e desarmadas.

- O que esse lixo está fazendo aqui? – Disse Ana.

- Senhorita Ana Lopéz, você pode não concordar com todos os meus métodos, mas no fundo sabe que estamos do mesmo lado. Esse Bispo corrompeu o mosteiro. Aquilo não é a verdadeira igreja.

Ana parecia contrariada, mas aquiesceu.

Joaquim, trêmulo, resolveu guardar a espada na bainha. – Padre, você tem um minuto para se explicar.

- Estou aqui para investigar o Bispo Silva. Tem algo sinistro acontecendo no mosteiro. A verdadeira igreja não permite essas seitas, tatuagens... Desconfio que tenha algo a ver com vampiros. – o padre passou as mãos nos olhos, ainda vermelhos pela mistura de pólvora e areia que Joaquim arremessou nele na noite anterior.

Ele continuou:

- Ana, lembra-se que já combatemos vampiros juntos, nos arredores de Vila Rica? Você foi enviada pela Luz da Verdade, e ajudou muito naquela batalha. Vamos seguir juntos novamente e investigar a injustiça em Cuietés?

- Vocês já lutaram lado a lado? – perguntou Joaquim. Ana notou incômodo na voz dele. Seria ciúme?

- Sim. Rolim lutou bravamente, e me ajudou na batalha. Mas não é santo, ele tem os piores vícios dos padres hipócritas – ela disse.

- Minha cara, eu sou humano, peço perdão e me penitencio, mas não cabe a você me julgar. Perdoe-me e deixe-me tornar um instrumento a serviço de Joaquim, para que ele encontre seus irmãos.

O Tiradentes Joaquim José da Silva Xavier percebeu que não havia opção, a não ser confiar em Rolim. Afinal, se o padre quisesse matá-lo, não estaria sozinho no acampamento.

- Certo – disse Joaquim – vamos descansar então, e amanhã antes de o sol raiar sairemos para encerrar o diagnóstico e o planejamento desta operação de resgate dos meus irmãos. Vamos também em busca da prima da Senhorita Ana López. Espero que meu irmão Domingos Filho esteja nas masmorras. Depois de amanhã será o grande dia.

O insólito grupo preparou-se para dormir, mas as desconfianças mútuas não desapareceram até o sono chegar, quando as estrelas já iam altas no céu.

Tiradentes Jovem contra os VampirosOnde histórias criam vida. Descubra agora