3.11. Minastauro

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Bem antes de amanhecer, a insólita quadra – mascate, escravo, padre e maga – já estava na entrada original da antiga mina de ouro abandonada. Diversas tábuas bloqueavam o caminho.

- Vamos observar a região e aguardar o melhor momento de entrar – disse o mascate Joaquim José da Silva Xavier.

- Não faz diferença se é dia ou noite, nunca é o melhor momento de entrar em uma mina hostil com masmorras e, provavelmente, vampiros – respondeu Padre Rolim.

- Vamos então retirar as madeiras. – ordenou o tiradentes.

Joaquim e Rolim começaram o esforço para desbloquear a passagem. O padre focava em usar o princípio da alavanca, enquanto o leigo, já suando, usava força bruta para tentar arrancar cada pedaço.

- Afastem-se – disse Pedro.

- Pare! – Disse Joaquim.

Mas ele não parou, e a dupla teve que sair da frente. Com um forte movimento de quadril, Pedrinho golpeou a entrada com a maça. O impacto foi suficiente para abrir um caminho pelo qual podiam passar. Porém o impacto causou um estrondo, cujo eco reverberou por vários segundos na vastidão escura na qual iriam adentrar.

- Lá se vai o efeito surpresa – disse Joaquim.

- Bobagem. Eles já sabem de nossa chegada faz tempo. Chega de papo e vamos entrar. Acendam as tochas! – Ana afirmou, de forma decisiva, e foi a primeira a entrar no buraco.

O Tiradentes, ainda do lado de fora, acendeu quatro tochas, entregou a Rolim e Pedro e entrou.

- Eu não preciso de uma – disse ela - Fax Ardebat! –

Uma luz artificial brilhou nas mãos da jovem.

- Cada chama deve queimar por até uma hora – Joaquim disse ao grupo. - Vamos ser rápidos. Temos ainda equipamento para seis tochas. Ficar no escuro nesta mina é morte certa.

O grupo caminhou em silêncio por alguns instantes. O túnel era estreito e seguiram em fila.

Enquanto caminhavam, o mascate Joaquim José divagou por alguns instantes. Aquele era o local do famoso sal de ouro. Toneladas e toneladas foram extraídas pelos ingleses, e certamente ainda havia mais. Não fazia sentido a mina ter sido abandonada... Também havia, ele pensou, rumor da abundância, naquele local, de salitre e enxofre, materiais escassos em Minas Gerais e que eram necessários para fabricar pólvora.

Uma primeira bifurcação interrompeu o pensamento e ele voltou a focar na situação concreta.

Duas possibilidades se apresentaram. À esquerda, um túnel com trilho, por onde carros escoavam minérios e rejeitos. À direita, um túnel sólido e amplo, sem trilho, com chão de barro.

- Desde que entramos não vi qualquer sinal de movimento. O chão está intacto e não há pegadas ou rastros em nenhum dos túneis - Ana Lopéz falou.

- Tu és idiota? Vampiros viram morcegos e não precisam pisar no chão! – Padre Rolim, áspero, resmungou.

- Vampiros não viram morcegos, isso é falsa fama! Vocês padres gostam de espalhar a famosa mentira pura, lenda, boato...

- Calem-se, sem brigas! – Joaquim interveio – Vamos seguir pelo caminho com o trilho.

Ninguém contestou e eles seguiram pelo antigo caminho utilizado na mineração.

Um som abrupto alarmou o grupo. Joaquim tocou no cabo da Luz do Pombal, mas não a desembainhou.

- Um rato – disse Pedrinho. – Tá quente aqui, né, pessoal?

- Não há ventilação nesta parte – disse Ana. - Vamos prosseguir.

Desta vez, o caminho se dividiu em duas passagens. Eram estreitas e em ambas havia trilhos para carros de mineração. Eram descendentes, prosseguir significaria acessar áreas mais profundas da mina.

- Sugiro seguirmos pela esquerda – propôs a moça – pelos mapas que examinei, é a melhor chance de seguirmos para o subsolo do Mosteiro, onde estão as masmorras.

- Parece factível – disse Rolim – mas não confiamos em ti. Onde queres nos levar?

- A desconfiança é recíproca – ela disse. Já disse, queremos acessar as masmorras no subsolo do Mosteiro do Buraco Sagrado.

- Ainda vamos todos morrer se vocês continuarem a briga – disse Joaquim. Na ausência de elementos adicionais, vamos seguir a proposta da Ana.

Optaram pelo caminho da esquerda.

- Já me sinto perdido – disse Pedrinho. - Se precisarmos fugir vocês lembrarão o caminho?

Prosseguiram na caminhada enquanto Joaquim respondeu:

- Pedro, já ouviu falar do Minotauro? Esse monstro foi trancado em um labirinto na ilha de Creta, na Grécia. Atenas pagava um imposto: pessoas enviadas ao labirinto para serem devoradas pela criatura. Semelhante ao imposto dos quintos, que Portugal nos arranca.

- Nunca ouvi falar, patrão.

- Teseu foi o herói que derrotou Minotauro. Um dos truques de Teseu foi usar um novelo de lã para encontrar a saída do labirinto. Quem ajudou Teseu foi Ariadne. Ela lhe entregou um novelo que lã, que ajudou a encontrar a saída. Ana López é a nossa Ariadne, ela deixou estas folhas de ervas sarracenas comigo. Tenho jogado folhas pelo caminho. Veja.

Eles pararam e tentaram focalizar a visão na imensidão escura. Era possível ver pequenos brilhos azuis pelo chão. Também escutavam barulhos de gotas d'água escorrendo por estalactites e caindo em poças.

- Minotauro? Tamos mais pra Minastauro, chefe – disse o escravo.

Joaquim sentiu um calor ao pensar que Ariadne e Teseu estavam apaixonados, mas preferiu não abordar essa parte da história.

De repente, um enorme barulho de explosão e pedras rolando assustou o grupo.

- Protejam-se! – Gritou o mascate, agachando-se e levando os braços ao rosto.

Os quatro se agruparam e assumiram posição defensiva.

O forte som continou até cessar completamente. Joaquim levantou-se e examinou a passagem que já haviam percorrido. Estava completamente bloqueada. Não era possível ver nenhum movimento.

- Não vai dar para voltar, só nos resta prosseguir.

- O que Teseu faria nessa situação? – perguntou Pedrinho.

Ninguém respondeu.

Tiradentes Jovem contra os VampirosOnde histórias criam vida. Descubra agora