15 | Insanidade

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  O assunto da semana entre Selly e Daya era o "casal" que havia brigado. Claro que esta segunda não lembrava o que havia acontecido, afinal, um ataque de esquizofrenia não costuma deixar lembranças... bem, pelo menos não no esquizofrênico.

  Era sábado e o clima estava gostoso: quende, mas com uma brisa agradável soprando ininterruptamente. Nathan, dando uma volta pela cidade, caminhava solitário por uma estradinha de terra nos fundos da escola. Diziam que, por ali, havia uma nova cafeteria, e que esta era ótima. Ele adorava café, e uma parte dele desejava que pudesse tomar outro Mocha com Lis.

  Por algum motivo, Nathan sentia-se observado e seguido a cada passo.

  Ouvindo barulhos ao dobrar uma esquina, o garoto apressou o passo. Escutou, então, os passos aumentarem seus ritmos atrás dele, e pôs-se a correr, temendo olhar para trás.

  Entra rua, sai rua, às pressas e suando; entrou em um galpão aparentemente abandonado e empurrou a enorme porta do lugar, para que ficasse fechado. Parecia funcionar como um enorme depósito, iluminado precariamente por grandes combombós nas paredes altas e cinzas. Nathan não tinha permissão para entrar ali, mas estava fugindo de algo perigoso... mesmo sem saber o que era.

  Encostou-se no portão, assustado, pensando estar seguro ali. Ao levantar a cabeça para a frente, pôde ver uma silhueta alta, aparentemente feminina, de cabelos longos; vindo em sua direção com algo na mão. Ao ouvir o estalo de lâmina de canivete sendo colocada para fora, o garoto entrou em desespero. Sabia que, pelo peso dos portões, não poderia abrí-los e fugir.

  Descontrolado, Nathan começou a correr pelo depósito, escondendo-se da criatura atrás das enormes caixas de não se sabe o quê. A silhueta era rápida e, certamente, mais esperta que ele. Este tentava despistá-la, mas era sempre facilmente encontrado.

  O garoto virava para um lado, virava para o outro, corria, fugia, tentava descansar, mas a possível garota era resistente e não o deixava em paz de maneira alguma. O suor já corria frio pelo corpo do menino. Seu coração estava a mil, e sua respiração, ofegante e exausta. Mas, se não resistisse, poderia perder sua vida.

  Houve um momento em que, ao virar à esquerda atrás de uma das pilhas do armazém, Nathan escorrega e desliza no chão sujo e liso, até bater contra uma montanha de caixas vazias, que caem em cima dele.

  A menina retira as caixas do caminho e encurrala o garoto, apontando o canivete para seu pescoço. De perto, Nathan a pôde enxergar melhor: usava um moletom azul-escuro, com o capuz levantado; um short jeans um pouco curto; e uma bota marrom cujo cano chegava ao joelho. Os cabelos negros e lisos ficavam de fora do capuz, realçando os brilhantes olhos escuros. O garoto reconheceu aquelas características de anjo da noite.

– Hahah! -- aquela risada assombrosa ecoou pelas imensas paredes -- Não me reconheceu? Sou eu, Nathan! Sua "amiga não verdadeira"... – disse Selly, sorrindo.

– Selly... por quê? – ele estava ofegante.

– Ora, não é isso o que você esperava de mim!? Haaha! – ela apertou seu pescoço um pouco, fazendo-o tossir.

– Eu sei que eu falei merda, me desculpa, mas... – ele segurou suavemente os pulsos dela.

– Mas o quê? "Sean é muito importante pra mim"? Corta essa, Nathan!

– Selly... – Nathan tocou seu rosto e olhou no fundo dos seus olhos – você está me julgando por um erro...

– Um erro que poderia estragar uma amizade! – Selly quase gritou.

– É isso o que você chama de amizade? Julgar alguém por causa dos seus erros? Isso é soberba! – Nathan a encarou, quase chorando.

  A expressão de Selly mudou completamente de assassina sorridente para orfã assustada. Sem saber como responder ou reagir, a garota deu um grito furioso e saiu correndo dali, desaparecendo da vista de Nathan rapidamente.

  O canivete caiu ao chão, sujo de sangue. Logo, a camisa do garoto estava rasgada e manchada de vermelho-vibrante. Um corte em seu peitoral, em uma quase horizontal; ardia e doía, sangrando. Não era profundo, mas a dor na alma era imensa. Ela realmente havia ferido ele...

  Com dificuldade, Nathan tentou estancar o sangue com seu casaco — que estava amarrado em sua cintura — e levantou-se. Suas mãos abraçavam o pingente, mesmo estando este por dentro da roupa. Andou com dificuldade até a porta do galpão, que Selly deixara aberta. Ao ver-se de frente e próximo à porta, enxergou uma figura feminina, desta vez, menor que ele. A silhueta, de braços abertos, o recebera em um abraço caloroso, deixando que ele repousasse em seu corpo, enquanto acariciava-lhe a nuca. O choro vinha incontrolavelmente, assim como a sensação de adrenalina.

– Me ajuda... – pediu Nathan, chorando – Eu preciso de você... – ele a abraçava ternamente.

  "Não se preocupe, pequeno... eu estou aqui... sempre estarei aqui... sempre vou estar do seu lado..." — pensava Lis, ainda no abraço, consolando Nathan. De alguma forma, os dois conseguiam comunicar-se por uma certa telepatia.

  Novamente, os pingentes brilhavam juntos no peito de cada um.

  A blusa de Lis fora manchada pelo sangue de Nathan, e molhada pelas lágrimas dele, mas ela não se importava. Queria cuidar dele. Para Lis, era quase uma obrigação.

Yin & Yang | A Sintonia de Dois OpostosOnde histórias criam vida. Descubra agora