O Idiota

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Conforme o tempo passava, o Rei Magno e Charlote tentavam restabelecer o Reino, acalmando os ânimos do povo que temia morrer queimado.
Bianca seguia usando sua magia para resfriar o castelo que andava cada vez mais quente, e a própria parecia cada vez mais irritada por ver seu amado cada vez menos.
Gottan voltou às masmorras para encontrar Beatriz e suas conversas com ela se estendiam algumas vezes, mas em outros momentos, quando ela se irritava ele voltava a sair correndo.
Muitos céus se passaram, e em um determinado céu, Maise, a rata gigante, recebeu em sua casa o convite Real do casamento de Bianca e Gottan.

- Como eles podem casar a filha em um momento como esse? - Maise lia o convite com incredulidade.

- De fato. - Um gato listrado com cores cinza e azul surgiu flutuando no ar na frente dela e também lia um convite. - Maise, minha velha, o que devemos vestir para esse evento? Algo à prova de chamas, devo supor.

- Chershire. - Maise falou o nome dele à contra gosto, foi até uma árvore próxima, sentou em um banco e suspirou. - Você não deveria estar lambendo as botas da realeza em troca de um prato de comida?

- Já comi o bastante. - Ele respondeu e deu uma risada sombria. - Agora estou mais interessado no que uma rata vestirá para o Casamento Real.

- Vestirei um esfarrapado cachecol feito com a sua pele peluda e estranha. - Maise respondeu e revirou os olhos para ele, detestando o gato que apenas ria. - Suma da minha frente, Chershire. Estou esperando Aragon.

- Estou aqui. - Aragon, uma lagarta azul que vinha lentamente pelo galho da árvore, se acomodou próximo deles e comentou. - Desculpe o atraso, Maise, a Lebre estava me contando uma história sobre as Sereias Selenas da Lua.

- Uma grande história! - A Lebre surgiu num pulo por detrás do banco de Maise e disse animada. - As Sereias Selenas da Lua acabam de eleger Ouromiia como Rainha do lago, a sereia dos cabelos loiros que não deixa ninguém além delas nadar ali.

- Ora essa. - Maise agitou o convite para todos. - Isso aqui é muito mais importante do que aquelas sereias chatas! Onde já se viu fazer festa quando uma das filhas está colocando fogo em si mesma?!

- Ah, você não sabe? - Chershire falou despreocupadamente. - O homem com asas, aquele que chamam de Gottan, está ajudando a princesa Beatriz a se controlar. Está certo que às vezes ele sai com as orelhas queimando, mas há boatos de que houve melhoras.

- Ora vejam só. - A lagarta Aragon se animou e acendeu um cigarro de tabaco. - O noivo da irmã está ajudando a princesa Beatriz. Que boa notícia. Tudo indica que teremos paz, afinal.

- Esperem aí. - A Lebre deu pulinhos e ergueu uma pata, parecendo muito atenta agora. - Ouvi boatos de que a princesa Beatriz começou a queimar quando viu sua irmã e esse homem juntos, o que significa que ela odeia essa união e que, na verdade, o ama. Vocês acham mesmo que eu não queimaria se meu amado preferisse a minha irmã?

- Sua maluca. - Maise pegou a Lebre pela orelha e a sacudiu. - Não fale como se fosse a princesa. Você é bem estranha!

- Meu amado não me ama, vou lançar-lhe as minhas chamas! - A Lebre exclamou e escapuliu do aperto de Maise, repetiu aquelas palavras e riu em seguida. - Meu amado não me ama, vou lançar-lhe as minhas chamas!

- Deixe ela. - Aragon falou. - Todos sabemos que a Lebre é maluca. Só nos resta ir a esse casamento e ver de perto o que está acontecendo.

Enquanto todos estavam atarefados no castelo, a voz rouca de Gottan era ouvida pelos guardas nas masmorras e eles se surpreenderam quando ouviram o homem rir lá dentro.

- Não há um único céu que eu venha aqui e você deixe de me chamar de idiota. - Gottan observou Beatriz encolhida próximo à parede e envolta em um manto vermelho. - Está tudo bem, Beatriz, eu não vou me irritar se você continuar jogando sua raiva contra mim.

Beatriz deu de ombros e seu olhar se perdeu em um ponto qualquer no chão. Quando falou, sua voz saiu baixa e mais calma que antes.

- Como ele está, digo, o meu irmão? O Chapeleiro tem medo de mim?

- Não. - Gottan sentou no chão na frente dela, coisa que já estava acostumado a fazer. - Ele é muito pequeno ainda, mas é muito inteligente. Na última vez em que o vi ele me disse que estava fazendo um chapéu que não queima e o daria para sua amada “irmã esquentadinha”.

A menção de um sorriso passou pelo rosto de Beatriz e Gottan ergueu as sobrancelhas quando notou aquele gesto inédito depois de tanto tempo.

- Ele sente saudades. - Gottan aproveitou que ela estava mais tranqüila que o normal.

- Também sinto a falta dele. - Beatriz encarou Gottan. - Diga isso à ele.

- Eu direi. - Ele garantiu. - Você não quer saber dos seus pais e de sua irmã?

Beatriz voltou a desviar o olhar para o chão, franziu o cenho e sentiu o calor das chamas se aproximarem.

- Como está Lolita, a minha criada?

- Ah, bem… - Receoso, Gottan engoliu em seco e respondeu. - Ela se foi. Eu sinto muito, mas Lolita não compreende certas coisas.

- Claro. - Beatriz estava inexpressiva diante daquelas palavras. - Não há mesmo como compreender o que eu sou. Estou melhor sozinha.

- Você não está sozinha. - Ele respondeu e Beatriz voltou a encará-lo. Os olhos vermelhos fixos nos olhos dourados.

- Por que você ainda está aqui, Gottan? - Ela questionou e tombou a cabeça de lado. - Você não se pergunta sobre o que eu farei quando sair dessa masmorra? Você acha mesmo que eu não posso queimar esse castelo inteiro mesmo estando nesse buraco onde me jogaram? Será que você não percebe o porquê de eu não queimar toda essa bosta de lugar desde que o meu poder iniciou?

Temeroso com as rápidas mudanças de personalidade de Beatriz, Gottan lutou para não desviar o olhar do dela, tendo agora a certeza de que, independente do tempo, ela sempre seria uma ameaça.

- Eu não tenho resposta para nenhuma das suas perguntas. - Ele admitiu receoso e Beatriz ergueu o queixo, demonstrando imponência.

- É claro que você não tem respostas, Gottan. Não é à toa que eu sempre lhe chamo de idiota.

The Queens (Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora