O Aprendizado de Beatriz

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Beatriz buscava ignorar toda a atenção que Gottan dava a Bianca. Obviamente, apenas ela notou as atitudes dele, pois era extremamente observadora e tinha grande prática ao se esconder em lugares bons para a sua vantagem de escuta e visão.
Ainda que ficasse magoada por Gottan não olhar para si, Beatriz se via cada vez mais apaixonada quando encarava aqueles olhos dourados e misteriosos.
Logo, Beatriz decidiu que trabalharia para parecer mais inteligente e madura diante de Gottan, se convencendo de que ele acabaria por reconhecer que ela era a esposa ideal.
Beatriz lia todos os livros que podia e o mais rápido possível, sendo várias vezes servida com chás, bolo e doces e não saindo dali para mais nada.
Batidas na porta desviaram sua atenção do grande livro que lia, em seguida a porta se abriu e um menino de cabelos ruivos e olhos verdes entrou sorridente, arrumou sua cartola roxa e sentou na cadeira em frente à mesa dela, que sorriu para ele.

- Chapeleiro. - Beatriz colocou uma fatia de bolo na frente dele. - Eu pensei que não lhe veria antes de você terminar aquele chapéu. Vamos, coma um pedaço de bolo de Uva Rosa.

- Ah, que maravilha! - A suave e doce voz dele fez com que Beatriz se sentisse feliz de imediato, coisa que somente o pequeno Chapeleiro poderia causar em alguém. - Eu senti saudades da minha irmã querida. Enquanto finalizava aquele chapéu, pensei: Oh, sinto que preciso ver o lindo sorriso da minha irmã Beatriz hoje, pois somente isso me deixará com as idéias certas na cabeça. Sabe, eu tenho ficado cada vez mais maluco estando tão sozinho.

De repente, ao ouvir tudo aquilo e saber que o irmão tinha uma tristeza frequente no olhar, Beatriz segurou o queixo dele, que tinha cobertura de bolo nos lábios.

- Também senti sua falta, irmão.

Beatriz sorriu com sinceridade quando o Chapeleiro sorriu e ela aproveitou aquele momento para oferecer um lenço à ele, que pegou e se limpou, mas voltou a comer o bolo e se sujar.

- Ah, Beatriz. - Ele disse. - O que está fazendo?

- Estou estudando. - Ela respondeu e mostrou a capa do livro para ele, que tinha os olhos verdes sobressaltados e a boca cheia de bolo. - “Técnicas de Batalha com Dragões.” Estou estudando muito para que Gottan me ache inteligente.

- Que estranho. - Ele voltou a comer e Beatriz o olhou com curiosidade, esperando a sua continuação que não demorou chegar - Você estuda somente para parecer inteligente diante de alguém. Essa não é a atitude óbvia de um burro?

Beatriz engoliu em seco e se inclinou para frente, aprendendo desde muito pequena a nunca se irritar com o irmão, e sim a ouvir atentamente o que ele dizia.

- Como assim? Está me dizendo que não devo estudar se eu quiser impressionar o meu pretendente, que devo me preocupar com outras coisas?

- Ah não. - O pequeno Chapeleiro tomou um gole de chá e voltou a admirar sua fatia de bolo. - Estou dizendo para você estudar muito, para fazer o melhor que puder, mas não faça isso para que os outros lhe aprovem, faça isso para que você aprove a pessoa que se tornou quando não houver mais nada para estudar. Estude para sua própria satisfação, para se admirar e se orgulhar. Os outros vêm depois, sempre depois.

Diante da sabedoria do irmão, Beatriz sentiu uma enorme vontade de chorar, pois nunca teve ninguém da família que era tão bom para ela como o Chapeleiro era. Por fim, Beatriz terminou por sorrir e assentir, também se servindo de bolo.

- Você sempre será o meu ponto fraco, Chapeleiro, porque você é aquele à quem eu mais amo nesse mundo.

No escritório do Rei Magno, Charlote andava de um lado ao outro, irritada com o marido diante da janela.

- Ele simplesmente saiu do quarto e está andando por aí dizendo sandices, falando com as paredes e esperando que elas respondam! Pense no que está fazendo, Magno, tome uma providência em relação à esse bastardo!

- Não fale assim dele. - Magno saiu da janela e encarou Charlote. - O meu filho pode andar por onde quiser no meu castelo. Ele só está sendo feliz e não há nada de incômodo nisso.

- Eu não gosto de vê-lo fazendo aquelas coisas. - Charlote esfregou a testa. - Os rumores pelo País das Maravilhas não são poucos, somos mencionados como os pais de um maluco. Isso é ridículo!

- Ridículo é o seu modo de pensar! Ridículas são as coisas que você faz com o menino! - Magno exclamou contra ela, que o viu se agitar irritado. - Todos amam o meu filho, ele é adorável e sorridente! Quem o chama de maluco é muito infeliz, e os infelizes nunca entenderão a forma como ele pensa.

- Como se atreve?! - A raiva de Charlote era óbvia em seu rosto, mas ela respirou fundo e forçou calma. - Ah, eu sei que sempre acabamos por discutir quando falamos desse menino, então nós iremos mudar de assunto.

- É o melhor a fazer. - Ele foi até a mesa e sentou em sua cadeira. - Diga o que lhe trouxe até aqui.

- Beatriz está agindo rudemente com Bianca outra vez. - Ela sentou de frente para ele e demonstrou sua preocupação. - Temo que o futuro delas seja repleto de desavenças terríveis. Está certo que ambas terão castelos muito distintos, um branco e frio como a neve, o outro vermelho e quente como o fogo, mas nada disso significa que elas precisam ser inimigas. O certo é que ambas trabalhem juntas para que o País das Maravilhas mantenha esse ciclo de paz.

- A culpa é de Beatriz. - Magno foi direto sobre o caso. - Não sei para quem aquela menina puxou.

- Como não sabe? - Charlote ergueu as mãos, incrédula e exausta. - Beatriz é igualzinha a você, Magno. Ela só faz o que quer e se revolta quando lhe dizem não.

- Bem… - Ele não pôde negar que suas atitudes eram bem semelhantes. - Certo, mas diferente de mim, ela é apenas uma menina ainda e nós precisamos ensiná-la a respeitar a irmã. Bianca é um doce e não merece ser tão mal tratada.

- De acordo. - Charlote tratou de pensar em formas que pudessem unir as irmãs, em seguida elas foram colocadas em prática.

Bianca e Beatriz foram chamadas para uma aula de pintura, mas Beatriz deixou cair tinta na irmã, tinta essa que congelou assim que tocou seu corpo gelado, gerando o fim das aulas. Em seguida elas fizeram aula de dança juntas, mas Beatriz caiu quando acidentalmente deslizou por uma fina camada de gelo que se formou por onde Bianca havia passado antes. Mais uma vez cancelaram a aula porque a mais nova tentou dar uma rasteira na mais velha depois daquilo. Logo, lá estavam as irmãs tendo aula com as espadas, mas Charlote mandou que parassem antes mesmo de começarem, pois viu o sorriso maldoso que Beatriz dava para a inocente Bianca. Por fim, quando a Escuridão se aproximava no céu as duas foram dispensadas, Charlote entrou exausta no escritório do marido.

- Não podemos controlar Beatriz.

Magno levou a mão à testa e resmungou.

- De alguma forma eu imaginei que não poderíamos mesmo.

The Queens (Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora