Lide Com Suas Frustrações

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O clima agradável voltou a imperar sob o País das Maravilhas, a àgua corria normalmente pelos rios e lagos, o animais voltavam a cuidar de suas casas e vidas e a floresta ganhou um novo sopro de cores. Até mesmo as flores cantavam alegremente, em homenagem ao recomeço.

O castelo de Beatriz foi reestabelecido, e seu trono de Rainha Vermelha ganhou pedras preciosas, presente de seus súditos. E ela, por sua vez, dava festas e lhes oferecia comida, gostava de ver seu salão, agora bem iluminado e limpo, cheio de carinhas felizes.
Quem visse Beatriz diria que estava satisfeita com seu destino, sorria e conversava, mas não levantava de seu trono se não fosse para encerrar a festa. Entretanto, quando entrava em seu quarto e era recebida pelo gato Chershire, seu semblante se contorcia em dor, porque ainda não esquecia de seu amor impossível, embora ele estivesse muito longe de si. Passava muito tempo escrevendo, buscando meios de quebrar a Ordem que lançou em si mesma no passado, mas o que sobrava eram papéis e penas na mesa negra de seu quarto vermelho. Sempre acabava por se jogar na cama e se lamentar pelo fato de estar sofrendo de outro mal: Estava perdendo a sensibilidade.

A comida não tinha gosto, mesmo que tentasse variar o cardápio; a água não matava sua sede, apenas o sangue dos julgados e condenados lhe satisfazia. E seu irmão Chapeleiro, seu amado menino que havia implorado para que ficassem juntos, não era mais do que um vislumbre fantasioso na mente dela. Beatriz sentia que deveria vê-lo para recuperar alguma coisa, mas seu corpo relutava contra qualquer tipo de afeto.

Se perguntava como conseguia dominar tantas coisas e o povo, mas não tinha controle pelo próprio corpo e mente.

Logo, caiu no sono e mergulhou num mar negro, pois nem sonhar Beatriz sabia mais.

No lago das Selenas Sereias da Lua, Ouromiia estava sentada em sua rocha preferida, tinha o olhar perdido, mas ficou em alerta quando ouviu um barulho num caminho quase fechado que levava a àgua para longe. A sereia caiu no lago depressa e nadou até lá, passando por raizes traiçoeiras e erguendo a cabeça quando chegou num lugar de galhos muito baixos e clima quente.
Seus olhos brilharam ao ver uma flor azul fechada de tamanho grande se abrir lentamente, e o choro de um bebê ecoou por toda a floresta.
Sorridente, Ouromiia se aproximou e pegou no colo a menina, que se acalmou em seus braços, e uma esperança inundou o coração da sereia.

- Sereia Selena da Lua, eu te nomeio Ruby.

No castelo de Magno e Charlote, o Chapeleiro se colocava em frente aos dois e tinha os braços cruzados nas costas, receoso ao se pronunciar.

- Pode falar, meu filho. Não tenha medo de nada. - Magno o acalmou.

- Ah, bem, na verdade eu tenho um pedido a fazer.

Charlote se empertigou na cadeira e o vestido bufante inflou mais uns centímetros.

- Outro de seus pedidos mirabolantes. O que você quer agora, rapaz? Já não tem o suficiente?!

Assustado, ele se encolheu e Magno repreendeu a esposa com um olhar endurecido, em seguida voltou a acalmar o filho.

- Você pode pedir o que quiser, Chapeleiro. Eu farei o que me pedir.

Batidas na porta se fizeram ouvir e Ariela veio apressada com os cachos loiros balançando para todos os lados.

- Desculpem pelo atraso, eu estava arrumando algumas coisas.

Conforme os céus se passaram, Ariela se tornou uma jovem muito bonita, e era a companheira fiel do Chapeleiro.

- Está tudo bem, Ari, eu ia fazer o pedido agora. Ah, papai, o pedido não é para mim, mas peço que o veja assim.

- Não estou entendendo. - Alisou a barba grisalha e franziu o cenho para os dois jovens na sua frente. - Por favor, falem de uma vez.

- Primeiro de tudo... - O rapaz começou. - ... Ariela e eu somos melhores amigos e, sei que o senhor quer que nos casemos, mas não nos amamos para tal coisa. Então, queremos pedir que o casamento seja cancelado.

- Amor? - Charlote acreditou estar ouvindo alguma piada, porque aquela conversa não fazia sentido algum para ela. - Você acha que nos importamos com isso, garoto? Precisamos do terceiro reino para colocar ordem nos outros dois, que ainda cairão em mais guerras. Quem se importa se vocês não se amam? Isso é ridículo!

- Vocês são perfeitos juntos. - Magno estava irritado, mas não demonstraria ao filho de modo algum. - Eu peço que façam um esforço. Vejam bem, o povo precisa disso, de um reino seguro. A Rainha Vermelha voltou e está exigindo cada vez mais terras para si, o território dela já é uma grande mancha vermelha no mapa, muito diferente do ponto pequeno que é a área de Bianca. Chapeleiro, por favor, eu não resistiria a mais uma viagem para aquele mundo, e não posso escolher alguém que cai aqui, porque não são dignos como Ariela.

- Mas, papai. - Foi Ariela quem argumentou, já estava acostumada a chamar Magno daquela forma. Seu olhar era suplicante. - Queremos nos casar por amor, concordamos com isso. O que há de mal em deixar as coisas como estão? Não vemos guerras, e sim a felicidade do povo.

- Não diga bobagens, minha menina. - Charlote brandou o tom de voz, afinal, adorava a garota. - A Rainha Vermelha nos intimida, Bianca pode se enfurecer de novo a qualquer momento, e não saberemos o que menino fará quando crescer, já que também gosta de queimar as coisas.
Francamente, Bianca teve muito azar ao ser perseguida pelo fogo até no próprio ventre.
O fato é que nunca teremos paz enquanto não dominarmos a situação desses dois castelos em uma guerra fria. Todos estamos fazendo sacrifícios, querida. Esperamos que você reconheça isso e compreenda.

Negado. O Chapeleiro e Ariela tiveram seu pedido de anulação de casamento negado e saíram de lá cabisbaixos.
Andavam de mãos dadas pelo corredor adornado por quadros antigos e vasos de flores cantantes.

- É claro que temos amor um pelo outro, mas eles não compreendem de qual amor estamos falando.

- Ariela, seu pai e sua mãe podem ter se amado como nós nos amamos, deve ser assim. Você pode ter se confundido.

- Estou certa, Chapeleiro. - Insistiu em seu argumento. - Meus pais tocavam os lábios e diziam palavras de carinho sempre. Certa vez, minha mãe me disse que o amor causa batidas malucas no peito, suadeira nas mãos e frio na barriga. Ela me disse também que a pessoa que ama quer ficar com a pessoa amada por mais tempo, cada vez mais perto, até se tornarem um. Bem, ela não me explicou como duas pessoas podem se tornar uma, mas acredito que isso é feito pela magia desse tipo de amor que eu não tenho por você, e que você não tem por mim.

- Ah, tudo bem. Acredito em você.

Entraram no quarto dele e Ariela se jogou na cama, encarou o teto, e ficou satisfeita que ele tenha deitado ao seu lado e encarado o teto também.

- Mas, e agora? O que vamos fazer para encontrar o amor diferente? Ariela, meu pai espera que nos casemos em breve.

- Não podemos deixar isso acontecer, Chapeleiro. - Juntou seu dedinho ao dele e os ergueu. - Deixe que eles lidem com suas frustrações, e vamos resolver as nossas.

The Queens (Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora