Capítulo 1

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Três anos depois.

Julie é uma mulher muito bonita, de trinta e três anos de idade. Com cabelos cor de mel, ondulados suavemente, a baterem-lhe pelo meio das costas e olhos azuis. Pele clara, maçãs do rosto com um tom rosado natural e lábios cheios, alta e gordinha, mas sempre com um sorriso nos lábios, mesmo que, por muitas vezes e ultimamente, fosse uma máscara para disfarçar a tristeza, a solidão da viuvez e, até poderia dizer-se, uma certa depressão.
A simpatia era um dos seus cartões de visita e toda a gente adorava ter aquela mulher por perto, pois cativava quem quer que fosse com a sua personalidade.

Passar pela morte do marido deixou uma cicatriz no seu coração.
Uma tatuagem feita com as agulhas mais afiadas, cujas infligiram a maior dor.
Muitas vezes, imagens do sucedido regressavam-lhe à mente, como um passar de slides antigos, sempre que fechava os olhos e, sem que pudesse evitar, uma lágrima acompanhava o passar dos slides.
Não deixou a sua profissão, bombeira, mesmo depois do que aconteceu com Michael. Ela não esquece, mas vai tentando fazer com que a dor seja menor.

Dizem que o tempo cura tudo.
Não é bem assim.
Isso é uma mentira que é dita para amenizar o momento da dor.
O tempo só nos faz habituar à ausência de quem já foi.
O tempo só nos faz habituar à ideia que, aquele de quem nós amamos, já não está fisicamente entre nós...
O tempo traz outra coisa, a saudade. No luto, tempo, dor e saudade, andam de mãos dadas.

Apesar de tudo, ela ama o que faz. Talvez...
Não, talvez não.
É por isso que ela continua a envergar aquela farda e a dar tudo para ajudar o próximo.

Por dias, recordou o que passou com o marido.
Num dia lembrava o dia em que se conheceram.
Noutro, vinham as lembranças das peripécias desastrosas, ou das peripécias hilariantes. Adorava as recordações dos momentos em família e todos os bocadinhos bons. Também recordou as batalhas que enfrentaram, as coisas mais duras com que se depararam naquele tempo que viveram juntos, sendo a mais dura o aborto, que quase os fez separar, e a dificuldade em conceber novamente.

E, agora, a morte de Michael.

Michael, era um homem de quarenta anos, com um sorriso lindo e cativante, moreno, alto e corpulento. Bastante amoroso e só não fazia por Julie o que não podia. Teimoso como uma mula e só Julie conseguia fazê-lo mudar de ideias.
Foram casados dez anos, depois de namorarem apenas nove meses.

Abanando a cabeça e regressando à realidade, escapando do devaneio, Julie tenta afastar, mais uma vez, a lembrança nostálgica da felicidade que as boas memórias lhe traziam, naquele dia, assim que entra em casa. Nem todos os dias vinham boas recordações, mas hoje era um bom dia.

- Merda... Tenho de ir às compras. - Reclama, batendo com a mão na testa, assim que abre o frigorífico para tirar a garrafa de água, depois de chegar de mais um dia exaustivo no trabalho. - Caráca, o frigorífico está vazio.

Primeiro toma um duche relaxante, para preparar-se psicologicamente para o martírio das compras. Em seguida veste uma t-shirt vermelha, com um desenho e uma frase quaisquer, jeans escuros e os seus preciosos ténis. O outfit confortável de sua preferência, sem dúvida! Pagava um ordenado só para se vestir assim, ou então pijama.

Hum... Pijama.

O dress code perfeito do seu fim-de-semana.
Quem é que não gosta de estar de pijama em casa?

PIJAMA!

Entra no seu modesto Opel Astra, azul metalizado, já com alguns anos, e dirige-se para a cidade mais próxima, para ir fazer as benditas compras.
A sério.
Ela deve ser a única mulher que detesta fazer compras.
Quando digo que detesta fazer compras, são compras em geral, tipo compras de tudo!

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