[POV Harry]
Um som repetitivo que ressoava pelo quarto de hotel estava a afastar-me do meu estado adormecido; os longos cabelos castanhos da Ana estavam pousados na minha cara, como sempre. Não sei o que fazíamos durante o nosso sono mas acabávamos sempre da mesma forma todas as tardes; os seus cabelos acabavam espalhados ao longo da minha face enquanto ela estava completamente deitada em cima de mim, as minhas mãos acabavam sempre na sua cintura agarrando-a firmemente e as nossas pernas encontravam-se entrelaçadas.
Abri os meus olhos reparando no quão estava escuro o quarto, o que me chamava atenção para o facto de que já devíamos estar a dormir pelo menos há umas quatro horas. Tentei ajustar os meus olhos ao brilho do ecrã do portátil, que agora mostrava uma chamada Skype da Joana.
Odiava acordar a Ana fosse porque motivo fosse. Ela amava dormir pois a sua mente era como um turbilhão de ideias e os seus pensamentos nunca paravam; num momento ela estava a pensar em rosas e no outro pensava em como se calhar não tinha fechado a porta de casa, seguidamente lembrava-se que gostava de lobos e que lobos às vezes atacam pessoas, isso fazia-a pensar naquele filme de terror que viu em algum momento da sua vida e ela sentia medo, depois tinha de tentar convencer-se que nada daquilo era real e dava por si a criar partes de uma nova melodia na sua cabeça, da melodia passava a um pequeno filme que inventava e do filme passava àquela árvore que ela sempre abraçava quando visitava o jardim, simplesmente porque “Esta árvore tem 100 anos e continua forte, ela merece o meu respeito e o meu carinho por ter visto tanta merda neste mundo de merda.”. Então, basicamente, esta era a única altura em que ela conseguia descansar a sério .
Mas a Joana sabia o fuso horário de N.Y. e nunca iria telefonar tão tarde, então eu sabia que tinha de ir contra os meus instintos e acordar a Ana. Ela abriu os olhos lentamente, enquanto aquele som irritante do portátil ecoava pelo quarto, e olhou-me ensonada. Limitei-me a apontar para o ecrã brilhante do portátil e ela começou a esfregar os olhos para conseguir adaptar-se à claridade. Quando finalmente perceber que era a Joana quem estava a telefonar ela olhou-me confusa, pois sabia tão bem como eu que ela nunca ligaria a horas tão tardias.
Ela esticou-se na direção do portátil e atendeu a chamada enquanto se sentava ao meu lado com o aparelho eletrónico sobre as pernas. A nossa imagem estava escura porque a única fonte de luz vinha do ecrã, que agora mostrava uma Joana obviamente agastada fazendo a Ana olhar-me preocupada antes de voltar a sua atenção para a chamada de vídeo.
Ana: Que se passa? – a Joana olhou a câmara com um ar culpado antes de suspirar.
Joana: Sabes como no filme Noivas em Guerra houve um problema com as datas? – a Ana acenou com a cabeça e agarrou a minha mão que já estava suada. – Bem, houve um problema com a tua data e eu tentei mudá-la para o próximo mês mas…
“Mas?” disse em conjunto com a Ana. Estava a começar a sentir-me desesperado. O que estaria depois daquele “mas”? Óbvio que não seria nada de bom, mas de 1 a 10 o quão mau seria?
Joana: Mas – continuou – o Ashton não concordou comigo, nem a Hope, portanto o casamento ficou marcado para o dia seguinte a chegares a Londres. – o meu queixo caiu automaticamente e a Ana gritou “O quê?!” ao meu lado. 10, isto era um 10. – Eu peço imensa desculpa! Eu tentei, juro que tentei! – a Ana abanou a mão devagar à frente da câmara fazendo sinal para a Joana se acalmar. Não havia qualquer motivo para ela ficar naquele estado, sabíamos que a culpa não era dela. Especialmente porque as pessoas nunca ouvem a adolescente de 15 anos, por mais brilhantes que sejam. É como um ritual, tornamo-nos adultos e esquecemo-nos de como é ser o adolescente que ninguém ouve, esquecemo-nos de como é ter uma opinião mas não ser capazes de expressá-la pois assim que abrimos a boca alguém nos manda calar...
Ana: Eu tenho de ir. Mas não te preocupes, eu sei que fizeste tudo o que podias. Devias ir sair com os teus amigos, não tens nada com que te preocupar. – ela piscou o olho à Joana e desligou rapidamente antes de pousar o portátil no chão e encarar-me.
Eu: O que vamos fazer?
Ana: Nada. – fiquei abismado com a sua resposta e ele entendeu isso pois sorriu e começou a acariciar a minha bochecha. – Vamos esperar que o plano da Gemma resulte e se não resultar eu vou dizer-lhe.
Eu: Espera, tu vais o quê?
Ana: Vou dizer-lhe. Eu não vou casar-me com o Ashton, não se eu o puder evitar. Recuso-me a viver uma mentira sabendo que podia ter uma vida contigo. – naquele momento percebi que ela realmente me amava tanto como eu a amava a ela. Dizer a verdade ao Ashton seria difícil, e difícil era o que a Ana nunca escolhia. Nada disto tinha sido fácil mas ela não fugiu. Sim, ela acobardou-se imensas vezes e já devia ter contado a verdade ao Ashton mas, pela primeira vez, ela não estava a escolher o caminho mais fácil. Ela estava a escolher-me a mim e a todas as complicações que iam vir e isso não seria fácil, mas ela sabia disso, sabia disso e mesmo assim continuava a querer-me a mim. Tanto como eu a queria a ela. – Sabes, até diria a verdade ao Ashton neste preciso momento mas acabar com alguém por uma chamada de vídeo seria demasiado mau. E suponho que a Gemma mereça uma chance.
Eu: Eu amo-te, sabias?
Ana: Também te amo. – suspirou batendo levemente com o seu nariz no meu. Queria-a. Mais que tudo. Não conseguia fartar-me dela por mais que tentasse e este momento era tudo o que precisava, era tudo o que precisava para pôr de lado as minhas inseguranças.
Eu: Sabes como ainda me deves uma por te ter deixado em paz por 30 minutos? – ela acenou com a cabeça enquanto passava as suas mãos pelo meu cabelo emaranhado. – Quero que amanhã vistas algo que gostes, de preferência um vestido porque raramente os usas e isto é uma ocasião especial, e que não saias de casa. O dia todo. – ela olhou-me confusa esperando uma explicação. – Não te vou contar nada, só tens de confiar em mim.
Ana: Está bem. – murmurou ainda a mexer no meu cabelo.
Eu: Podes tirar também esse anel? – perguntei referindo-me ao anel de noivado do Ashton.
Ana: Claro. Mais alguma coisa?
Eu: Aconselho-te a usares um casaco. E a alisares o teu cabelo, ambos sabemos que o arranjas mais depressa quando ele está dessa forma.
Ana: Então estás a insinuar que vai haver vento.
Eu: Não. Eu- eu nunca disse isso. – gaguejei.
Ana: Umh, às vezes esqueces-te que eu te conheço melhor que todos.
Eu: Acredita, nunca me esqueço. – ela sorriu antes de me puxar para mais perto e agarrar o meu cabelo com mais força. – Eu amo-te mesmo.
[POV Harry]