Gostaria de possuir um dom que me permitisse resumir essa obra em breves palavras, porém, não sou capaz. Seria de natureza impossível mostrar toda a profundidade psicológica do personagem principal, Daniel, nesse parágrafo; assim como é inviável dim...
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O som incessante dos sapatos de Daniel chocando-se contra o assoalho brunido do corredor principal da escola era tudo que se podia ouvir. A ausência de ruído, ocasionado pelo fim das aulas da semana, agrava a ansiedade que Daniel sentia.
Não havia muito a ser feito para maneirar a impaciência, visto que havia um certo tempo que estava sentado sozinho, esperando Aaron, Henry e Faraji aparecerem. Aaron, o causador de toda a humilhação que iriam passar ao aparecer no treino das líderes de torcida, deveria ser o primeiro a se fazer presente e cumprir o horário combinado, porém, era Daniel que esperava.
Decidiu, então, que estava farto de aguardar. Tirou o celular do bolso, espantando-se com a hora primeiramente, e enviou uma mensagem nada gentil ao melhor amigo:
Daniel: Onde estás, energúmeno?!
Aaron: Disse-te no início da semana que possuía um encontro marcado para o dia de hoje. Por quê?
Daniel: Porque deverias comparecer ao treino das líderes de torcida hoje.
Aaron: Merda! A memória me enganou. Poderia fazer-me a gentileza de ir sozinho? Por favorzinho, imploro-te que vá. Prometo que retribuirei o favor.
Daniel revirou os olhos ao ler a mensagem. Sentia-se um idiota por sempre sucumbir aos desejos do melhor amigo e acabar fazendo coisas que iam contra os seus princípios. Contudo, forçou seu corpo a deixar o banco em que estava sentado e fez o caminho até o campo de futebol. A ansiedade, que sentiu antes, foi substituída por desânimo e raiva.
O calor de fim de verão, o cheiro forte de grama e o barulho do treino de futebol catalisavam a raiva de Dan. Ele só queria ir embora. Porém, continuou a andar em direção às meninas na arquibancada, que não tiravam os olhos da partida de futebol, ou melhor, dos jogadores.
"Olá." Daniel tentou ser educado ao se aproximar, recebendo cumprimentos rápidos de volta. Assistiam tão atentamente ao jogo que não olharam para Dan ao cumprimentá-lo. Ele pensou consigo mesmo que elas não possuíam tanta diferença dos melhores amigos imbecis, que também estavam sempre admirando garotas esportistas.
Por fim, sentou-se ao lado das garotas e olhou para a única fonte de entretenimento: o jogo. Daniel não era um apreciador do esporte, aliás, não via sentido algum em rapazes correndo atrás de uma bola estúpida. Também possuía fortes opiniões sobre os jogadores, que costumavam objetificar suas amigas e proferir barbaridades. É pertinente acrescentar que ele tendia à generalização muitas vezes, como todo adolescente.
Não foi perdurado o tédio, visto que teve sua atenção roubada rapidamente por um jogador específico. Era difícil acompanhá-lo com os olhos, pois movia-se com uma rapidez e uma naturalidade atípica. A bola parecia que adorava seus pés, nunca deixando-os, nem mesmo para os dribles que fazia parecer uma espécie de dança. Porém, não foi o dom nato ao futebol que vidrou os olhos de Dan no menino, mas sua beleza.
Encantou-se pela pele dourada, contrastada pelo sol de fim de tarde, que o deixava com um ar de muso do verão; pela gargalhada descontraída que dava ao tirar a bola de outro jogador, deixando à mostra dentes dignos de comercial de dentista e covinhas perfeitamente encaixadas abaixo das lindas maçãs do rosto; e, claro, pelo físico musculoso que apresentava sob roupa fina e encharcada de suor. Bastava apenas um olhar para deixar qualquer um deslumbrado.
Assistiu o garoto desconhecido marcar ponto ao chutar a bola dentro dos limites do gol e comemorar aos pulos e abraços neandertais a conquista. Ver a vestimenta dele subindo contra a barriga, expondo a linha V que compõe o músculo oblíquo externo, era fascinante para Dan. Talvez futebol estivesse fazendo um pouco mais de sentido para ele agora.
"Observem o rapaz que fez o gol." A voz de Maryn tirou Daniel da espécie de transe em que se encontrava. Tinha medo de ser flagrado desejando o garoto em questão. "Ele é um deus." Pela primeira vez desde que se conheceram, Daniel concordou com o que a amiga finlandesa estava a dizer.
"Trata-se de um aluno recém-chegado. Émile o conheceu em uma aula que tiveram juntos e não para de falar do quão incrível é o novato brasileiro desde o ocorrido." Barbra, a ex-namorada de Aaron, providenciou a fofoca, que foi bem recebida nos ouvidos de Dan apesar da expressão facial neutra que apresentava.
"Ele está no último ano? Suspeito pelo fato de que não há meninos barbados aos montes na nossa série." Maryn deu continuidade ao assunto e logo estavam as duas em uma conversa engajada sobre o quão bonito ele era.
"A finalidade desse encontro não era jogar meninas para cima ou algo do tipo?" Daniel revirou os olhos, fingindo tédio.
"Temos que esperar a partida acabar para começarmos os testes para líder de torcida dessa temporada." Emily explicou e Dan assentiu. Gostava mais de Emily que das outras, porque sempre agia pela lógica e fornecia conselhos capazes de mudar vidas.
Em uma tentativa de desviar os olhos do garoto, Daniel procurou algo em sua volta para distraí-lo. Notou a presença de Anya, encolhida num canto e com a atenção voltada para o celular em suas mãos. Talvez em momentos como esse sentia-se excluída socialmente pelas próprias amigas, porque não tinha vontade de olhar jogadores suados. Daniel solidarizou-se com a muçulmana, já que passava pela mesma situação quando seus amigos admiravam garotas. Todavia, não conseguiu se aproximar dela e conversar sem que ela percebesse o real motivo. Assim sendo, voltou a olhar o brasileiro.
O jogo havia chegado ao fim e ele estava diante do banco de reservas, conversando com alguns rapazes. Era dono de uma alma leve e bem-humorada, perceptível até para quem o olhava do alto da arquibancada. Dan suspirou enquanto encarava-o de maneira nada sutil e viu o menino levantar o olhar para onde ele e as garotas estavam, dando uma piscadela logo em seguida ao perceber que estava sendo admirado.
Daniel claramente não sabia o que sentir. O coração estava alarmado, as bochechas ruborizadas e a respiração levemente descontrolada. Não sabia se a resposta corporal era devido a vergonha de ser pego ou por ter gostado do gesto descaradamente sensual.
"Céus, ele consegue ser ainda mais atraente direcionando essa piscada mal-intencionada para nós." Maryn soltou um leve suspiro após vocalizar essa oração. Daniel não era o único que havia se iludido com a ação do garoto.