Capítulo 23 - Harvey

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— Você não deveria estar aqui

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— Você não deveria estar aqui. — Insisti uma última vez para a figura alta na cozinha que, após prender seus cabelos escarlates em um coque, começou a desempacotar as coisas que havia trazido.

— Não tinha mais peru no mercado, obviamente, então eu comprei um salmão. Tudo bem para você? — O ruivo me ignorou por completo, tirando um grande peixe rosa da sacola de plástico.

— Viktor. — Suspirei, sabendo que ele não iria ouvir nenhum dos meus pedidos para que ele fosse embora.

Pelo que já conhecia dele, sabia muito bem que ele só fazia o que ele queria, e foda-se o resto, então aproximei-me do balcão da cozinha enquanto Viktor guardava os ingredientes na geladeira. Ele não demorou de me notar lá, olhando-me de canto enquanto preparava aquele espaço como se fosse seu.

— Você vai ficar aí?

— O que mais eu posso fazer?

— Primeiro, me ajudar a desempacotar as decorações. E, já que você tem mãos de pianista, montar essa árvore, porque eu nunca consigo fazer isso.

Sentindo-me completamente vencido por ele sem resistência alguma às suas ordens, peguei as sacolas do chão e comecei a abrir as decorações que ele havia trazido, e, em pouco tempo, a árvore já estava montada e enfeitada com as luzes de Natal.

— Onde eu deixo isso?

Viktor pareceu pensar por um tempo, analisando o espaço da sala antes de responder.

— Deixe do lado da lareira.

O obedeci prontamente, esquecendo-me por completo a lesão de minha perna. O ruivo me observou com as mãos em sua cintura, visivelmente satisfeito, o que me fez meio que sentir que era seu escravo ou algo do tipo.

— Agora você vai tomar um banho demorado, porque você está fedendo mais que um gambá e seu pijama está tão usado que tem pelo menos três manchas de origem desconhecida nele. — Disse, por fim, deixando-me até um tanto envergonhado por tê-lo recebido em minha casa daquela forma. Porém, em minha defesa, ele que havia me pressionado a deixá-lo entrar. — E vê se  coloca uma roupa bonita. Te ver assim é deprimente.

Como rapidamente notei, Viktor não conseguia ser sincero sem ser um cavalo com as pessoas. Bem, pelo menos eu sabia que ele sempre me falava a verdade.

Então, respondendo-lhe com um breve e desanimado "okay", subi as escadas para tomar o tal banho. Eu ainda não estava entendendo o que Viktor pretendia com tudo aquilo; seria mais uma forma de me torturar pelo passado? Caso fosse, eu não apresentaria resistência alguma para com tudo aquilo. Que ele me destruísse aos poucos. Eu meio que merecia.

Eu tive tempo suficiente para refletir sobre tudo o que eu havia lembrado, mas ainda não havia chegado a nenhuma conclusão. Era como se eu estivesse me conhecendo aos poucos, e a sensação de ainda ter lacunas a se preencher me deixava agoniado. E, bem, ter o motivo da minha agonia cozinhando uma ceia de Natal em minha casa não ajudava muito.

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