A voz de Heimdall se tornou distante quando a sensação desconfortável vinda do teletransporte invadiu meus sentidos, uma pressão incômoda puxava meu corpo para a ponte que ligava o reino dourado à Terra. Finalmente senti o chão aos meus pés, o ar preenche meus pulmões enquanto respirava fundo por ter me distanciado de Asgard. Reconheci o lugar como sendo o hospital onde deduzo que Amélie esteja internada.
As pessoas lançavam olhares estranhos direcionados à mim, talvez seja pelo vestido asgardiano ou o fato de que eu surgi dos céus.
Minha mente estava uma confusão, grande parte de meu subconsciente deseja virar as costas e voltar para meu apartamento fingindo que isso nunca aconteceu, parecia como uma vingança silenciosa do que poderia ser o destino pregando uma peça. No entanto, uma outra parte fez com que me direcionasse para dentro do hospital, sabia que aquela era a única conexão viva com minha mãe, gostando ou não, Marjorie iria querer que eu cuidasse de sua mãe.
Caminhei lentamente até a entrada do lugar, pensando em uma maneira de fazer com que aceitem minha presença já que estava sem documentos, pois todos haviam ficado na casa de Vittorio. Na recepção, todos me olhavam, enquanto somente conseguia enxergar Pierre Gachet, o advogado de Amélie e também seu "faz-tudo" pessoal.
— Ravenna? — a voz dele ecoou por meus ouvidos. — O que faz aqui?
— O que houve? — disse, ignorando sua pergunta. — E, por favor, sem mais enrolações.
— Estávamos em um reunião quando começaram as dores no peito, antes que pudéssemos reagir ela reclamava de dores pelo corpo, o médico disse que foram indícios de um ataque do coração. — o homem de cabelo branco respondeu. ㅡ Agora está fora de risco, e pelo que parece vai ser liberada amanhã.
Olhei para o homem confusa, afinal não era possível que ela tivesse passado por todos os tratamentos em um dia.
— Isso faz quanto tempo?
— Uma semana.
Tentei não ficar tão surpresa, porém não fazia sentido que Heimdall tivesse demorado tanto para me comunicar sobre a situação de Amélie.
— Talvez... — comecei, fazendo com que ele me olhasse. — Talvez eu devesse visitá-la.
— É, talvez. Eles não me deixaram entrar pois não sou um familiar. E alguém precisa ficar com ela.
Virei-me para a recepcionista, demorou mais que o esperado para que eu conseguisse entrar sem os devidos documentos, aparentemente a mulher esqueceu que foi minha família que construiu o prédio do hospital, logo estava caminhando até o quarto. A porta branca que me separava da minha avó parecia pesar uma tonelada, empurrei ela com a força que restava em mim.
A mulher estava deitada na cama com fios conectados ao seu corpo, o barulho insistente do aparelho que mostrava os batimentos de seu coração começavam a me irritar, entretanto estava mais preocupada em tentar chegar na poltrona ao seu lado.
— O que você quer aqui?
Sua voz estava fraca e baixa, ela quase não conseguia manter os olhos abertos, mas isso não a impediu de despejar seu veneno em mim. Não conseguia falar nada, foi a primeira vez que via Amélie nos últimos dois anos, ela estava horrível, pálida e com a expressão cansada, esperava que somente tivesse que vê-la quando seu advogado me intimasse para ter um acordo referente a herança de Marjorie. Neste momento, a visão degradante dela foi o suficiente para me deixar paralisada pelas inúmeras memórias horríveis relacionadas a ela.
— Gosta do que ver quando olha para mim? — continuou dizendo. — Apostaria tudo que está adorando ver como estou agora.
A voz dela soava por minha mente, o desespero por ter que vê-la criou um novo sentimento, a raiva em seu mais puro estado, quase em um conforto de saber que aquela mulher asquerosa sofria. Eu queria sorrir ao mesmo tempo chorava, não conseguia me reconhecer nesses pensamentos cruéis. Era incontrolável, uma mistura de satisfação com tristeza que dividia minha mente, tentando me controlar fechei novamente a porta deixando-a sozinha.
Memórias vividas que compartilhei com Amélie voltavam à mente, tantos anos de raiva retornaram, forçando meu corpo a se manter de pé, caminho para a recepção do hospital onde Pierre ainda permanecia parado.
O homem virou seu olhar para mim quando ouviu meus passos pelo corredor do hospital, ele viu minhas lágrimas e perguntou:
ㅡ Você está bem?
Continuei andando até o lado de fora, respirando fundo enquanto sentava na calçada na tentativa de fazer com que o ar entrasse em meus pulmões. As lágrimas marcaram meu rosto, enquanto a dor ocasionada pelo bracelete se tornou mais forte, todo meu corpo doía tanto que pensei que iria morrer, minha visão estava embaçada pelos efeitos que a pulseira causava em mim, sentindo a presença de alguém ao meu lado, abaixei a cabeça tentando ignorar Pierre.
ㅡ Quer que eu te leve para casa? ㅡ ele ofereceu, após minutos de silêncio. ㅡ Assim poderá trocar de roupa, comer alguma coisa e talvez dormir um pouco.
Aceitei sem muita resistência, não importava para onde ele me levasse contando que seja o mais longe possível. Em um pedido estranho, questionei se Pierre poderia ir comigo até a mansão Beaumont, alguma coisa me dizia que era o lugar onde deveria estar.
ㅡ Sinto muito, Ravenna. ㅡ estacionou na frente da mansão. ㅡ Deveria ter parado ela, sei que tinha que ter feito algo para impedir.
ㅡ Você é engraçado, Pierre. ㅡ respondi ressentida. ㅡ Há dez anos, presenciou toda a crueldade de Amélie, foi você que cuidou para que ninguém nunca soubesse de nada que ela fazia. E agora, quer que eu te perdoe por ser um covarde?
ㅡ Não quero seu perdão, pois sei que não vou conseguir. ㅡ falou cansado. ㅡ Porém, entenda que Amélie é uma das pessoas mais poderosas de Paris, se ela quisesse, minha carreira estaria arruinada no primeiro deslize. Eu tinha filhos para criar, e agora tenho netos, não é tão fácil sair da roda.
ㅡ É o que você diz para conseguir dormir a noite? Porque eu não consigo. ㅡ retruquei apática. ㅡ É quase engraçado que mesmo quando estava em outro continente, ainda tinha medo dela.
Saio do carro, deixando-o sozinho com seus pensamentos, antes que possa passar pela porta escutei a voz do velho homem.
ㅡ Tem algo que eu possa fazer por você?
ㅡ Preciso dos meus documentos, todos ficaram em Nova Iorque, além de um celular. ㅡ respondi de costas para ele. ㅡ Se você pudesse...
ㅡ Isso é fácil, porém terá que fazer algo por mim.
— O que você quer?
— Preciso que cuide Amélie, enquanto faço isso por você, ela será liberada do hospital amanhã e alguém precisa cuidar dela.
— Eu não tenho opções, não é? Dois dias é o tempo que vou cuidar dela, depois disso é seu problema.
Ele piscou para mim, saindo com o carro da minha vista, enquanto me virava para a porta branca que me separava da sala de estar abrindo-a e entrando no lugar antes que me arrependesse.

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Ravenna
Fanfic• Em processo de revisão • Ravenna Beaumont sente sua existência ser questionada quando perde o controle de seus supostos dons ainda tão desconhecidos, fazendo com que segredos antigos tenham que ser revelados para uma possível ajuda divina.