Dezesseis

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Hoje faz exatamente um mês desde que acordei. Contando com os dias que saímos da Central, são um mês e dez dias. Não que eu esteja contando, na verdade. É o que acontece hoje que faz com que eu pare, pense e conte.

Um dia normal, do qual eu levanto, me preparo para o dia com Dara e Clara, tomamos café juntas, conversamos e rimos com Lucy, a deixo na creche e parto para fazer qualquer coisa que seja útil. Hoje, em especial, vou visitar Judith, que tem cuidado da minha ferida de perto. Gerda tem mais trabalhos a fazer, como remendar cortes que os treinos com faca causam, colocar um osso no lugar por causa da luta ou até mesmo cuidar de uma concussão grave causada por um golpe. Não quero atrapalhá-la com meu mero machucado.

Saio do elevador e desço no andar que conheço. Ao caminhar por esse breve espaço, lembro da primeira vez que vim aqui. Assim que fui tirada do meu quarto pelos soldados, no meu primeiro dia consciente na Resistência.

Judith foi o primeiro rosto feminino e amigável que vi.

E hoje é esse mesmo rosto que vejo quando ela abre a porta.

— Olá, Lorely. Bom dia. – ela diz com seu tom caloroso e amável. – Vamos ver como está essa ferida hoje?

Sento na maca que ela preparou para mim e estendo o braço no suporte que me oferece. Afasto o olhar enquanto ouço as fitas sendo cortadas, e então, a atadura é tirada lentamente. Depois de tanto ser remendada e enfaixada e costurada, não sei como ainda fico nervosa ao refazer as ataduras. Talvez seja mais pela vontade de ter uma boa notícia, do que realmente ver a ferida.

Sinto que Judith já tirou tudo quando sinto o ar gelado bater na pele quente. Da última vez que tive coragem para ver, o buraco feito pela bala já estava quase todo tampado pela nova camada de pele que dava o seu melhor para cicatrizá-lo logo. Por sorte não fui atingida por uma arma de alto calibre, de modo que a bala não atravessou o braço, mas foi o suficiente para me causar uma parada cardíaca pela grande perda de sangue.

— Veja só! – ela diz, quase maravilhada. – Sua cicatrização está ótima, Lore.

— Quão bom é isso? – pergunto, sentindo o nervosismo tomar a boca do meu estômago.

— Bom o bastante para você poder retomar as atividades. Mas com moderação, entendido? Ainda não está 100%, mas isso quer dizer que você já pode dar adeus à sua tipóia.

Isso é mais que uma boa notícia, e me sinto feliz de verdade como não me sinto em muito tempo. Utilizar novamente esse braço é tão esperado como qualquer outra coisa.

Quero ser inteira novamente.

— Quando sair daqui, você pode procurar Hunter para fazer um pouco de fisioterapia. Ele já passou um tempo de sua vida tratando de ossos que saíram do lugar e estudou um pouco disso nos livros velhos de medicina. Posso te assegurar que é melhor fazendo isso do que eu. – ela dá um risinho enquanto termina de passar os medicamentos e volta a enfaixar o braço, dessa vez, com uma camada fina de atadura. – Sou boa mesmo abrindo pessoas e costurando feridas.

Coro um pouco, pois sei que Judith sabe sobre eu e Hunter, da mesma forma que Trade sabe. E se Trade sabe de alguma coisa, porque ela não saberá? E fico mais corada ainda ao notar que Judith é um tipo de mãe para Hunter, da mesma forma que eu sou para Lucy. Isso faz da gente... Sogra e nora?

LIGHTS - Livro IIOnde histórias criam vida. Descubra agora